Lisboa — Os brasileiros que sonham em obter a cidadania portuguesa podem se preparar. O governo de Portugal dará mais um passo para facilitar o acesso ao cobiçado trânsito livre para residir e trabalhar no país. Até o fim deste ano, permitirá que o pleito inicial ao benefício seja feito pela internet. A meta é agilizar os processos e, sobretudo, esvaziar os cartórios (conservatórias) portugueses, que têm registrado filas enormes e atrasos gigantescos nas respostas ao público — o normal seriam 30 meses para a decisão final, mas há quem espere, no mínimo, o dobro desse tempo pelo encerramento dos trâmites.
Mas que fique claro: parte da burocracia continuará e as exigências serão tão rígidas quanto agora. Haverá tratamento diferenciado entre aqueles que decidirem requerer a cidadania por conta própria e os que recorrerem a advogados especializados. Pelo que foi sinalizado pelo Ministério da Justiça português, quem optar por tocar o processo sozinho terá que fazer o pleito da cidadania on-line, enviando todos os documentos exigidos de forma digitalizada. Depois, precisará encaminhar, pelos Correios, os mesmos documentos impressos ao cartório indicado em Portugal, para que tudo possa ser conferido. A vantagem aí é que o tempo de análise já estará correndo. Hoje, o prazo só é contado a partir do recebimento dos documentos pelo cartório.
No caso dos processos tocados por meio de advogados, boa parte será feita eletronicamente. Como esses profissionais podem dar fé pública aos documentos, não será preciso entregar a papelada aos cartórios em vários processos. Os escritórios de advocacia terão, no entanto, que manter tudo arquivado por, no mínimo, 10 anos e apresentar, quando necessário, o que for requerido pelas autoridades.
Como é característica de toda burocracia, nos casos de pedidos de cidadania originária, quando o requerente é filho ou neto de portugueses, mas nasceu no exterior, os advogados serão obrigados a apresentar os documentos aos cartórios na segunda etapa. É uma forma de evitar fraudes nos processos, hoje muito comuns. Os advogados ficam desobrigados de apresentar os documentos impressos nos pedidos de naturalização, que podem ser feitos, por exemplo, por quem vive em Portugal por mais de cinco anos, por pais de filhos nascidos em Portugal e por judeus sefarditas.
Castelo em sintra cascais rodeado de verde sob o sol e um céu azul, em Portugal.
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Vista da ponte do Porto, em Portugal.
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Torre de Belém, em Lisboa, Portugal.
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Segundo Isabel Comte, jurista da Martins Castro, a digitalização de parte dos processos de pedidos de cidadania portuguesa é bem-vinda, mas seus efeitos só serão sentidos a médio prazo. Ela, que trabalhou por 16 anos no Instituto dos Registros e Notariado (IRN), que reúne todos os cartórios de Portugal, afirma que, além de definir as regras para o benefício de forma clara, o que deve ocorrer nos próximos meses, o governo português terá de preparar um sistema compatível às atuais demandas, o que não será simples. Também terá de treinar todo o pessoal que atua nos cartórios, para que se possa ter a devida segurança e o conhecimento para executar os trabalhos.
“Estava no IRN em 2009, quando houve um processo de digitalização de alguns serviços e, num primeiro momento, em vez de os processos serem agilizados, houve atrasos, pois foi necessário um período de aprendizagem. Não será diferente agora”, diz. É possível, inclusive, que todos os cartórios sejam interligados para que funcionários de um órgão possam auxiliar os de outros. “Tudo isso leva tempo. Então, não veremos decisões rápidas logo após a implantação dos pedidos de cidadania pela internet “, acrescenta.
Nos cálculos de Isabel, mesmo sem a digitalização, as concessões de cidadania portuguesa baterão recorde neste ano, superando os 150 mil. Isso decorre da combinação do interesse cada vez maior de cidadãos, especialmente brasileiros, e da necessidade de Portugal de atrair imigrantes para reforçar o mercado de trabalho e ampliar a taxa de natalidade do país, uma das mais baixas da Europa. “Há muitos casais portugueses que, para viver melhor, preferem não ter filhos”, explica.
Apenas no ano passado, o Estado português arrecadou mais de 800 milhões de euros (R$ 4,4 bilhões) em contribuições de trabalhadores estrangeiros para a Segurança Social, o INSS do país europeu. Esse dinheiro tem sido importante para bancar as aposentadorias de portugueses mais velhos. “Ou seja, quanto mais facilidades o governo oferecer para a obtenção de cidadania, maior será o número de trabalhadores e de jovens para a arrecadação de tributos que sustentam os programas sociais e para o aumento da taxa de natalidade “, destaca a jurista.
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