Períodos de tensão com a Coreia do Norte vêm e vão, mas a situação na península coreana agora parece ser a mais volátil dos últimos cinco anos — e é provável que piore.
No mês passado, o país disparou um míssil sobre o Japão, forçando os moradores de algumas regiões a procurar abrigo, num ato que foi considerado hostil e provocativo. O governo norte-coreano também lançou vários outros mísseis balísticos, acionou aviões de guerra perto da fronteira com a Coreia do Sul e disparou centenas de projéteis de artilharia no mar, que caíram em uma zona militar mista, criada pelas duas nações em 2018 para assegurar a paz (os dois países seguem tecnicamente em guerra).
Na segunda-feira (24/10), um navio mercante norte-coreano cruzou a fronteira marítima dos países, fazendo com que ambos os lados disparassem tiros de advertência. A Coreia do Sul diz que a incursão foi intencional.
Mas o que Kim Jong-un está fazendo? Há três razões pelas quais a Coreia do Norte deseja testar e lançar mísseis. Primeiro, avaliar e aprimorar a tecnologia militar. Segundo, enviar uma mensagem política ao mundo (principalmente aos Estados Unidos). E, terceiro, impressionar a população local, de modo a reforçar a lealdade ao regime.
Pode ser difícil decifrar a qual desses fins as ações mais recentes servem, mas desta vez Jong-un foi explícito. A mídia estatal informou várias vezes que os últimos lançamentos balísticos e os exercícios militares são uma resposta aos treinamentos realizados por EUA, Coréia do Sul e Japão. O Norte culpou os inimigos pela escalada das tensões e disse que o aumento de atividades é um aviso claro de que eles devem parar.
Nos últimos dois meses, Washington, Seul e Tóquio vêm realizando exercícios militares de larga escala separadamente e em conjunto para mostrar que estão prontos para um ataque nuclear norte-coreano.
Há pouca dúvida de que isso serviu para antagonizar Jong-un, que sempre interpretou essas atividades como um indício de que os inimigos estão ensaiando um ataque ao país. A razão pela qual a Coreia do Norte começou a desenvolver armas nucleares no passado foi justamente a prevenção de uma possível invasão.
Mas há uma razão menos explícita para o líder estar aumentando a pressão agora. Alguns acreditam que ele pode estar preparando o terreno para um teste mais provocativo — como detonar uma arma nuclear pela primeira vez em cinco anos, ou até mesmo um ataque em pequena escala à Coreia do Sul.
Em 2021, ele apresentou um plano de cinco anos, em que detalhou todas as novas armas que planejava desenvolver. Isso incluía bombas nucleares menores, para serem usadas no campo de batalha, e mísseis de curto alcance. Os testes recentes são evidências de que Jong-un não está apenas trabalhando em cima dessa lista, como também realiza treinamento das tropas para usar as novas tecnologias. Alguns dos exercícios recentes, inclusive, foram oficialmente feitos para simular um ataque nuclear à Coreia do Sul.
Agora, o líder norte-coreano precisa de atenção. Ele necessita que o mundo perceba o progresso que fez. As duras sanções internacionais não impediram o país de desenvolver armas, apesar dos prejuízos à economia.
As negociações destinadas a reduzir essas sanções internacionais estão paralisadas há muito tempo e a Coreia do Norte perdeu espaço na agenda global. O mundo está muito mais preocupado com a guerra na Ucrânia e a ascensão de uma China autoritária.
A posição do presidente americano Joe Biden é a de que as sanções à Coreia do Norte só podem ser aliviadas quando o país concordar em desistir de desenvolver e possuir todas as armas nucleares.
Enquanto isso, Washington e Seul concordaram em fortalecer a defesa da Península, realizando os tais exercícios militares que Pyongyang tanto odeia e responde com demonstrações de força. Após a última rodada de lançamentos de mísseis e exercícios do Norte, a Coreia do Sul acionou aviões de guerra e disparou parte da própria artilharia.
Se Jong-un quer que os EUA negociem termos mais favoráveis, ele deve provar o quão perigosa a Coreia do Norte se tornou. No mês passado, o líder declarou que o país dele é um Estado com armas nucleares, uma posição que acredita ser irreversível.
Para Kim Jong-dae, ex-assessor do Ministério da Defesa da Coreia do Sul, devemos estar preocupados com o quão assertivo o país vizinho parece ter se tornado.
Ele apontou como, no passado, a Coreia do Norte sempre esperou que as forças dos EUA terminassem exercícios militares para retaliar. Agora, eles dispararam artilharia no mar enquanto as atividades do adversário ainda estavam em andamento.
"Nunca vimos essa audácia antes, é algo diferente. É o Norte agindo como um Estado nuclear", classificou.
Os governos dos EUA e da Coreia do Sul acreditam que os preparativos para o sétimo teste de armas nucleares da Coreia do Norte estão finalizados e o país só espera o momento político oportuno para agir. Uma janela atraente começa a se abrir agora, com a Conferência do Partido Comunista da China encerrada e a aproximação das eleições legislativas americanas se aproximando.
Enquanto isso, a Coreia do Sul se vê no meio de mais uma rodada dos jogos da guerra, com os EUA programados para participar. E isso pode fornecer a Kim Jong-un o pretexto que ele tanto espera.
- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/internacional-63398058
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Fonte: correiobraziliense
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