23 de Novembro de 2024

Eleições nos EUA: como Miami foi de bastião democrata na Flórida a centro da onda conservadora latina


crédito: Getty Images

"Obrigado ao condado de Miami-Dade."

Esta foi uma das primeiras frases do discurso de vitória do governador do Estado americano da Flórida, Ron DeSantis, comemorando sua reeleição na noite de terça-feira (8/11). E não era para menos.

Miami votou massivamente nos candidatos republicanos nas eleições de meio de mandato de 2022, algo que não ocorria há 20 anos. A principal cidade da Flórida tornou-se também a principal cidade americana de maioria latina onde o Partido Republicano saiu vitorioso.

Cerca de 70% da população do condado de Miami-Dade são de origem latina. Destes, cerca de metade tem origem cubana.

E a metrópole atualmente é o sinal mais claro de um terremoto eleitoral que está transformando a política dos Estados Unidos: o realinhamento para a direita de uma parcela importante do eleitorado latino do país.

Esta vitória é particularmente reconfortante para os republicanos.

Há décadas se dava como certo que os eleitores americanos de origem latina inclinavam-se para o lado democrata. À medida que crescia a população latina do país, os democratas confiavam neste segmento do eleitorado como uma espécie de garantia de um futuro para o seu partido em nível nacional.

A comunidade cubana de Miami é tradicionalmente mais conservadora que os demais grupos latinos dos Estados Unidos. Mas, desde o começo do século, a juventude cubano-americana parecia estar se movendo para esquerda.

Aliada a outros grupos, como os afro-americanos e os brancos de tendência progressista, ela contribuiu para que Miami se tornasse o grande bastião democrata no Estado da Flórida, considerado o principal campo de batalha eleitoral do país.

Mas esta narrativa agora é posta em dúvida, após a derrota dos candidatos democratas em Miami nas eleições de 2022.

Miami-Dade é o coração da maior região metropolitana do Estado da Flórida. O condado votou majoritariamente na reeleição do governador DeSantis, contra seu oponente democrata Charlie Crist.

Os resultados parciais disponíveis na noite da eleição indicavam uma vantagem de 55% para DeSantis contra 43% de Crist — uma diferença já impossível de ser revertida.

O último candidato republicano ao governo da Flórida a vencer em Miami foi Jeb Bush, irmão do ex-presidente George W. Bush, na sua reeleição como governador em 2002.

E os outros resultados eleitorais em Miami no pleito de 8 de novembro foram igualmente decepcionantes para os democratas. O senador republicano Marco Rubio foi reeleito para representar o Estado da Flórida, vencendo a candidata afro-americana Val Demings, considerada uma das figuras em ascensão do Partido Democrata.

Já na disputa pela Câmara dos Representantes, a congressista conservadora de origem cubana Maria Elvira Salazar venceu a democrata Annette Taddeo, de origem colombiana.

Salazar comemorou sua vitória no emblemático restaurante La Carreta, no bairro da Pequena Havana, em Miami. Ela declarou à imprensa que "esta eleição comprova o que dizia [o ex-presidente americano] Ronald Reagan, que os latinos são republicanos, mas ainda não sabem disso".

A ampla vantagem obtida pelos republicanos em Miami nas eleições demonstra sua força entre os cubanos, mas também que eles parecem ser populares entre outros latinos, como os eleitores de origem colombiana e venezuelana.

Este fenômeno não surgiu da noite para o dia. Ele só foi possível porque os republicanos vêm ganhando força em Miami há mais de uma década.

Em 2012, cerca de 50% dos eleitores cubano-americanos haviam votado no democrata Barack Obama para presidente. Mas, em 2016, apenas 41% votaram em Hillary Clinton.

Esta tendência trouxe eleições cada vez mais disputadas em Miami. E, se ela se mantiver, é provável que o candidato presidencial republicano ganhe na cidade em 2024, o que praticamente garantirá que o Estado da Flórida — o terceiro maior do país — entre na lista dos Estados conservadores.

Se essa tendência observada em Miami continuar se espalhando para o restante do país, pode haver consequências eleitorais profundas. Afinal, os latinos são a minoria étnica mais numerosa do país e representam 19% do total da população americana.

A tendência conservadora crescente dos eleitores latinos está fortalecendo a posição republicana em outros Estados com grande população de origem latina, como o Texas e Nevada. E os motivos que explicam esse êxodo de votos democratas para o lado republicano ficam cada vez mais claros.

Muitos eleitores cubano-americanos ou descendentes de sul-americanos em Miami não têm a mesma preocupação com os temas migratórios, característica dos outros grupos latinos no restante do país. Por isso, eles não ficam tão assustados com o discurso contra os imigrantes ilegais, que se tornou tão importante para os republicanos desde a chegada de Donald Trump ao poder, em 2016.

Por outro lado, o discurso antissocialista dos republicanos encontra ressonância em muitos desses eleitores latinos, que abandonaram seus países escapando de governos de esquerda que os amedrontavam. E muitas pessoas de origem latina também mantêm posição conservadora em temas culturais e religiosos.

Além disso, muitos analistas defendem que os republicanos, há muitos anos, são mais eficientes e disciplinados na busca dos votos dos eleitores latinos em Miami e em outras regiões.

Enquanto isso, os democratas consideravam que os votos latinos eram automaticamente deles. E hoje se sabe que não é bem assim.

Em 2024, Joe Biden — ou outro candidato democrata que venha a disputar a presidência — precisará esforçar-se para evitar que os eleitores de origem latina, que supostamente eram a salvação do seu partido a longo prazo, não se tornem o grupo que entregará a Casa Branca aos republicanos.

- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/internacional-63568062

Fonte: correiobraziliense

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