A quinta visita do papa Francisco à África e a primeira à República Democrática do Congo (RDC), país em que os católicos são maioria (29,9% dos 108,4 milhões de habitantes), está marcada pela forte crítica ao "colonialismo econômico" e pelo chamado à paz. "É trágico que o continente africano padeça de várias formas de exploração. (...) Depois da exploração política, desencadeou-se um 'colonialismo econômico', igualmente escravizador. (...) Este país e este continente merecem ser respeitados e ouvidos, merecem espaço e atenção. Tirem as mãos da República Democrática do Congo, tirem as mãos da África! Chega de sufocar a África: ela não é uma mina para explorar, nem uma terra para saquear. Que a África seja protagonista do seu próprio destino!", clamou o pontífice, durante encontro com autoridades, membros da sociedade civil e o corpo diplomático, na capital Kinshasa.
Francisco ressaltou que, "bastante saqueada, a República Democrática do Congo não consegue se beneficiar suficientemente dos seus recursos imensos". Ele também lembrou que a nação sofre com conflitos e com migrações forçadas, além de "terríveis formas de exploração, indignas do homem e da criação". Fonte de cobre, ouro, cobalto, diamantes, estanho, urânio e coltan, a RDC tem um histórico marcado por colonialismo, escravidão e abusos. "O veneno da ganância tornou os seus diamantes ensanguentados. É um drama diante do qual, muitas vezes, o mundo economicamente mais desenvolvido fecha os olhos, os ouvidos e a boca", alertou Francisco.
Hoje, o papa celebra missa campal, a partir das 9h30 (5h30 em Brasília), no Aeroporto Ndolo. Às 16h30 (hora local), ele receberá vítimas do conflito que sufoca o leste do país. Duas horas depois, na sede da Nunciatura Apostólica, o papa terá um encontro com representantes de organizações de caridade. Francisco desembarcou, na tarde de ontem, em Kinshasa, em meio a um clima de euforia e comoção. Uma multidão se posicionou ao longo dos 25km que ligam o Aeroporto Internacional de N'djili ao centro de Kinshasa. Muitos congoleses levaram tambores, fanfarras e instrumentos musicais tradicionais para saudar o visitante com cânticos. O presidente Felix Tshisekedi foi o anfitrião do pontífice, no Palácio da Nação.
Morador de Kinshasa, o jornalista Kempes Kasanda Malu, 43 anos, acompanhou o desembarque do papa Francisco. "Em seu discurso, o pontífice desafiou a comunidade internacional a parar com a hipocrisia. Ele lembrou que o mundo, a África e a República Democrática do Congo precisam de paz. Também pregou o fim do sistemático saque das riquezas do continente africano", disse ao Correio, por meio do WhatsApp. "Francisco chamou os líderes congoleses a prestarem contas e recusou-se a abordar, de forma explícita, o papel de Ruanda nos distúrbios que ocorrem na região leste do meu país."
Para Kempes, ao rejeitar a comparação entre a África e uma grande mina, Francisco enviou uma mensagem de solidariedade com o sofrimento dos africanos e dos congoleses, e de condenação contra os predadores políticos e econômicos do continente. Por sua vez, o empresário Emmaus Nkosso, 25, também morador de Kinshasa e cristão, admitiu à reportagem ter ficado comovido com o pronunciamento do papa. "A presença e as palavras de Francisco são a única forma para despertar o interesse da comunidade internacional por tudo o que ocorre na República Democrática do Congo. Na condição de cristão, vejo essa visita como um ponto de virada na situação de meu país", desabafou.
Na sexta-feira, Francisco cumprirá o último compromisso de sua passagem pela África: ele visitará Juba, capital do Sudão do Sul, o país mais jovem do mundo e um dos mais pobres do planeta. No domingo, o pontífice retornará à Cidade do Vaticano.
"Na condição de congolês, vejo a visita do papa como grande símbolo pelo simples fato de ele vir até aqui. Meu país tem passado por tempos muito difíceis, com uma injusta guerra de agressão por parte de Ruanda. No leste da República Democrática do Congo, mulheres são estupradas, crianças, assassinadas. Há deslocamentos horríveis de cidadãos pacíficos. A vinda do papa é muito benéfica para o povo, por se tratar de uma autoridade espiritual que pode mudar as coisas."
"Vejo o discurso do papa como uma coisa muito boa. Meu país e a África têm sido reféns das potências ocidentais. A guerra no leste da República Democrática do Congo dura vários anos. Enquanto isso, o conflito na Ucrânia entra no primeiro aniversário e todo mundo busca uma solução. Em meu país ninguém fala sobre a nossa guerra. O papa abordou esse ponto durante o seu pronunciamento."
Fonte: correiobraziliense
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