Apesar de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), Geraldo Alckmin (PSB), afirmarem em artigo recente que a indústria será "o fio condutor" de uma política econômica voltada para a geração de renda e de empregos, as medidas anunciadas na semana passada, com subsídios a "carros populares" de até R$ 120 mil, geraram desconfiança entre analistas.
Para eles, Lula tenta reeditar erros da ex-presidente Dilma Rousseff que resultaram em dois anos de queda do Produto Interno Bruto (PIB), na contramão do mundo que crescia. E, agora, com a economia global enfraquecida e desacelerando, especialistas destacam que, ao tentar criar incentivos sem sequer ter aprovado o novo arcabouço fiscal, o governo não terá outra saída a não ser aumento de impostos ou da dívida pública. Por isso, recomendam que, antes, é preciso fazer uma reavaliação criteriosa das despesas e se empenhar mais para avançar na reforma tributária, pois ela ajudaria a melhorar a produtividade e a competitividade da indústria nacional — algo fundamental para a recuperação do crescimento mais forte e duradouro do PIB.
O consenso entre os analistas é que esse subsídio deverá ter efeito pequeno na atividade e tende a piorar o quadro fiscal, podendo colocar em risco o cumprimento da meta deficit zero em 2024. Quando Alckmin anunciou o pacote, na quinta-feira, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, pediu 15 dias para apresentar números sobre o impacto das novas medidas nas contas públicas.
Interlocutores da equipe econômica revelam que faltam economistas capazes de fazer cálculos precisos — pois erraram em contas do novo arcabouço. Fazenda e Mdic não comentam o assunto. "O governo está repetindo os erros do passado, atendendo a lobbies setoriais. Essas medidas, no fundo, são muito caras e terão um benefício pequeno na atividade e, muitas vezes, questionável", alerta Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria.
Analistas informam que, ao tentar estimular o consumo de famílias que estão, atualmente, endividadas até o pescoço, o governo pode abrir espaço para uma disparada da inadimplência e para o retrocesso da melhora da percepção do mercado em relação ao arcabouço — cuja tramitação no Congresso tem ajudado a mudar as perspectivas de crescimento da dívida pública, reduzindo a curva de juros futuros.
O economista Luis Otávio Souza Leal, da G5 Partners, considera a medida de incentivo para carro popular "sem pé nem cabeça", podendo acabar em aumento de carga de impostos, em vez de redução, diante da perspectiva de queda na arrecadação por conta do PIB mais fraco neste ano em comparação ao de 2022. "Isso vai contra a política econômica e o discurso de economia verde do próprio governo. Como Haddad vai tapando os buracos abertos por Lula, devemos esperar alguma maldade na parte tributária nas próximas duas semanas."
Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), faz alerta para o risco de políticas mal desenhadas que acabam gerando recessão. "Falta fazer contas e olhar as evidências. Até parece que a cloroquina saiu da saúde e foi para a economia", lamenta. O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, engrossa o coro de críticas à proposta de subsídios do governo para carros com preços nada populares. "O efeito na economia será baixo. Automóveis não têm mais o mesmo impacto que tinha no passado na atividade econômica e, para piorar, nesse caso, há cheiro velho de uma tentativa de usar um instrumento que nunca funcionou direito."
Rodolfo Margato, economista da XP, compartilha essa preocupação sobre a falta de informações do pacote. "Esperamos medidas mais sustentáveis ao longo do tempo, que tragam benefícios horizontais para a economia", diz.
Fonte: correiobraziliense
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