22 de Novembro de 2024

Por que fim do acordo de grãos entre Rússia e Ucrânia afeta preço global de alimentos


O anúncio de que a Rússia não renovará sua participação em um acordo que permitia aos ucranianos exportarem grãos pelo Mar Negro pode ter um impacto nos preços globais dos alimentos.

Isso porque a Ucrânia é um dos maiores exportadores mundiais de girassol, milho, trigo e cevada. Os preços desses produtos já subiram nesta segunda-feira (17), após o anúncio do fim do acordo.

O pacto permitia que navios de carga ucranianos passassem pelo Mar Negro a partir dos portos de Odesa, Chornomorsk e Yuzhny/Pivdennyi. Graças ao arranjo, mais de 32 milhões de toneladas de alimentos ucranianos chegavam aos mercados mundiais.

A Ucrânia agora precisará encontrar rotas alternativas para suas exportações.

No início da guerra, em fevereiro de 2022, o bloqueio da Rússia fez com que cerca de 20 milhões de toneladas de grãos ficassem presos em portos do Mar Negro. A baixa oferta em meio à alta demanda fez os preços mundiais dos alimentos subirem - o que pode acontecer novamente.

Quando o acordo foi assinado e os embarques de grãos recomeçaram, os preços mundiais dos alimentos caíram cerca de 20%, de acordo com a agência da ONU para Agricultura e Alimentação (FAO).

Outro risco do fim do acordo é a possível escassez de alimentos em vários países africanos e do Oriente Médio, que dependem da importação de grãos ucranianos.

Na semana passada, Shashwat Saraf, diretor regional de emergência para a África Oriental no IRC, pediu, em um comunicado, que os envolvidos fizesssem uma extensão do acordo a longo prazo para criar "previsibilidade e estabilidade" para a região, que perdeu grandes quantidades de colheitas por causa da seca e das inundações.

"Com aproximadamente 80% dos grãos da África Oriental sendo exportados da Rússia e da Ucrânia, mais de 50 milhões de pessoas na África Oriental estão passando fome e os preços dos alimentos dispararam quase 40% este ano", disse Saraf.

O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, disse que o pacto chegou a um fim "de fato" nesta segunda-feira (17/07).

Mas Moscou disse que retornaria ao pacto se suas condições fossem atendidas.

O presidente russo, Vladimir Putin, diz que partes do acordo que permitem a exportação de alimentos e fertilizantes russos não foram honradas. Ele também afirma que os grãos ucranianos não foram fornecidos aos países mais pobres, o que era uma condição do pacto.

A Rússia também diz que as sanções ocidentais estão restringindo suas próprias exportações agrícolas. Putin já havia ameaçado diversas vezes se retirar do acordo.

O Ministério das Relações Exteriores do país reiterou na segunda-feira essas queixas, acusando o Ocidente de "sabotagem aberta" e de "egoisticamente" colocar os interesses comerciais do acordo à frente de seus objetivos humanitários.

Mas o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, disse a repórteres que acredita que Putin "quer continuar o acordo" e que eles discutirão a renovação do pacto quando se encontrarem pessoalmente no próximo mês.

A Turquia participou da negociação do acordo, assim como a ONU.

Quando a Rússia invadiu a Ucrânia em fevereiro de 2022, sua marinha bloqueou os portos do país no Mar Negro.

O acordo de grãos com a Ucrânia permitiu que navios de carga passassem com segurança ao longo de um corredor no Mar Negro de 310 milhas náuticas de comprimento e três milhas náuticas de largura. O corredor dava acesso aos portos ucranianos de Odesa, Chornomorsk e Yuzhny/Pivdennyi.

O pacto também permitiu que a marinha russa vasculhasse navios em busca de armas no Estreito de Bósforo, na entrada do Mar Negro.

O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, disse que seu país pretende continuar exportando grãos, destacando que o acordo foi composto por dois acordos que se espelham - um assinado pela Ucrânia e outro pela Rússia.

"Não temos medo", disse ele sobre a decisão da Rússia de se retirar do acordo.

"Fomos abordados por empresas que possuem navios e estão dispostas a continuar embarcando grãos se a Ucrânia concordar em deixá-los entrar e a Turquia em passá-los."

Nikolay Gorbachev, presidente da Associação Ucraniana de Grãos, disse à BBC que seus membros identificaram meios alternativos de exportação de grãos - inclusive por meio de seus portos no rio Danúbio.

Mas ele admitiu que os portos seriam menos eficientes, reduzindo a quantidade de grãos que a Ucrânia pode exportar e aumentando o custo de movimentação.

Os líderes ocidentais foram rápidos em condenar a decisão, com a presidente da Comissão da UE, Ursula von der Leyen, acusando a Rússia de uma "ação cínica", acrescentando que Bruxelas estava tentando "garantir a segurança alimentar para os vulneráveis do mundo".

A embaixadora dos Estados Unidos nas Nações Unidas, Linda Thomas-Greenfield, descreveu a medida como um "ato de crueldade".

O anúncio do Kremlin veio poucas horas depois que a Ucrânia assumiu a responsabilidade por um ataque a uma ponte na Crimeia que matou dois civis.

Peskov disse que a Rússia deixar o acordo expirar não tem relação com o ataque. "Antes deste ataque, a posição foi declarada pelo presidente Putin", disse ele a repórteres em Moscou.

*Com reportagem de Antoinette Radford

Quando a ONU negociou o acordo, a entidade disse à Rússia que o pacto ajudaria a aumentar suas exportações de grãos e fertilizantes.

Embora os países ocidentais não tenham imposto nenhuma sanção aos produtos agrícolas da Rússia, Moscou diz que as sanções ocidentais dissuadiram empresas de navegação, bancos internacionais e seguradoras de negociar com seus produtores.

A Rússia pediu que seu banco agrícola estatal, Rosselkhozbank, fosse reconectado ao sistema de pagamento rápido Swift (do qual todos os bancos russos foram barrados em junho de 2022).

A ONU sugeriu que a Rússia criasse uma subsidiária do banco, que teria permissão para usar o Swift - mas a Rússia recusou essa opção, dizendo que demoraria muito.

Outros esquemas sugeridos, como o processamento de pagamentos de alimentos e fertilizantes por meio do banco americano JPMorgan Chase, ou por meio do African Export-Import Bank, também fracassaram.

A União Europeia (UE) tem um plano para distribuir grãos ucranianos que não podem ser embarcados pelo Mar Negro.

O órgão diz que o alimento pode ser transportado através da fronteira da Ucrânia com a Polônia e levado para portos no Mar Báltico, ou por trem e barcaça até o porto romeno de Constanta.

Desde o início da guerra, a Ucrânia tem enviado cerca de 10% de suas exportações de grãos através de sua fronteira terrestre com a Polônia. No entanto, é provável que haja engarrafamentos se exportar mais grãos por essa rota.

As ferrovias da Ucrânia têm medidas diferentes das do resto da Europa, o que significa que cada trem carregado de grãos deve ser transferido de um conjunto de vagões para outro na fronteira.

Além disso, a rede ferroviária na Europa Oriental não tem capacidade para transportar para os portos do Báltico e Constanta, mesmo os volumes relativamente baixos de grãos que a Ucrânia tem exportado por terra até agora.

A maior parte desses grãos permaneceu em países do leste europeu, como Polônia, Hungria, Romênia, Bulgária e Eslováquia, em vez de ser transportado para mais longe. Essa quantidade satura os mercados locais e faz com que os preços dos alimentos caiam nesses países.

Para proteger a renda dos agricultores nesses países, a UE concordou em restringir as exportações de alimentos da Ucrânia até 15 de setembro.

A ONU diz que de todos os produtos alimentícios que a Ucrânia exportou sob o acordo de grãos no ano passado:

A ONU diz que, sob o acordo de grãos, a Ucrânia enviou 625.000 toneladas de alimentos como ajuda humanitária para o Afeganistão, Etiópia, Quênia, Somália, Sudão e Iêmen.

Em 2022, mais da metade dos grãos comprados pelo Programa Mundial de Alimentos da ONU veio da Ucrânia.

Fonte: correiobraziliense

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