Uma tendência potencialmente perigosa ganhou destaque no TikTok recentemente. Diversas pessoas estão bebendo bórax misturado com água, em busca de supostos benefícios para a saúde.
Não é algo novo. As plataformas de redes sociais servem de palco para muitos "desafios" perigosos — e os usuários vêm fazendo uso de substâncias questionáveis há anos.
Não existem evidências que apoiem as recentes afirmações sobre o bórax. Mas qual o perigo dessa substância? E como podemos determinar a segurança de muitas outras substâncias que usamos no nosso dia a dia?
Bórax é o borato de sódio deca-hidratado, um sal produzido pela combinação de boro, sódio, oxigênio e hidrogênio. Ele se apresenta na forma de sólido cristalino incolor e pode ser facilmente dissolvido em água.
Bórax e o ácido bórico relacionado são normalmente utilizados em itens domésticos, incluindo produtos de limpeza, conservantes de madeira, fertilizantes, soluções para lentes de contato e formicidas.
Os cristais de bórax também são facilmente encontrados em supermercados, lojas de ferragens e de jardinagem. Estes produtos são tipicamente feitos de bórax puro, mas podem trazer outros aditivos.
Usuários do TikTok vêm postando vídeos de si próprios ingerindo soluções de bórax e água. Eles afirmam erroneamente que a substância pode ajudar a tratar inflamações, dores nas juntas, artrite, lúpus e diversas outras condições médicas.
Trata-se de mais um "remédio" ilusório em uma longa lista de falsas esperanças.
As terapias alternativas são frequentemente promovidas como sendo "naturais" e, portanto, supostamente não tóxicas.
O bórax é um produto natural, mas isso não é garantia de segurança. O arsênio, a ricina e a toxina responsável pelo botulismo também são 100% naturais, mas podem ser altamente tóxicos para os seres humanos.
E, embora o elemento boro, especificamente, seja considerado essencial para as plantas e para alguns animais, o seu papel no funcionamento do corpo humano não é tão claro. O boro pode ser encontrado em alguns dos alimentos que ingerimos, como uvas e batatas, mas não é classificado como nutriente essencial.
O nosso corpo pode precisar de uma quantidade muito pequena de boro, que pode ser obtida com segurança com uma alimentação rica em frutas e legumes.
A ingestão de bórax não é considerada segura.
Em toxicologia, a dose letal média, ou DL50, significa a dose aproximada necessária para causar a morte da metade dos animais em uma população objeto de estudo.
A DL50 de bórax em ratos é de cerca de 5 gramas por quilo de peso do corpo. É uma dose relativamente alta, o que significa que é improvável a morte de seres humanos por toxicidade aguda.
Mas, apenas porque a dose não irá matar uma pessoa, isso não significa que a substância seja inofensiva — e certamente não significa que ela seja boa para você.
O bórax foi largamente utilizado como conservante alimentar no início dos anos 1900, até que o químico americano Harvey Washington Wiley (1844-1930) e seu "esquadrão do veneno" descobriram uma série de efeitos colaterais causados pelo consumo da substância, incluindo dores de cabeça, náuseas, vômitos e desconforto gástrico, entre outros.
O bórax também é classificado como toxina reprodutiva, ou seja, ele "pode prejudicar a fertilidade" e "pode causar danos ao bebê antes de nascer". Ele é proibido como aditivo alimentar na Austrália, nos Estados Unidos e em diversos outros países.
Diversos desafios perigosos nas redes sociais viralizaram na última década. Um exemplo notável foi o "desafio das cápsulas de detergente" (Tide pod challenge, em inglês), que levou usuários a gravar vídeos comendo ou mordendo essas cápsulas.
O consumo das cápsulas já causou diversas mortes (não necessariamente relacionadas ao desafio). Entre 2013 e 2022, os centros de envenenamento dos Estados Unidos trataram cerca de 10 mil casos por ano envolvendo crianças com cinco anos de idade ou menos, que foram expostas a embalagens de detergente.
Certamente, não devemos beber soluções de bórax, nem comer cápsulas de detergente. Mas nem sempre podemos evitar essas substâncias. Por isso, a melhor proteção é entender os perigos associados a elas.
Além de lerem as advertências gerais de segurança de um produto, como "Cuidado" ou "Mantenha Fora do Alcance das Crianças", os consumidores podem se aprofundar um pouco mais ao utilizr recursos conhecidos como as fichas de informações de segurança (SDS, na sigla em inglês; ou FISPQ, em português — Ficha de Informações de Segurança de Produtos Químicos).
Legalmente, todo produto que contiver substâncias perigosas deve ter uma ficha de informações de segurança. Portanto, se você usar um xampu, higienizador das mãos, vinagre ou bórax, quase certamente haverá uma FISPQ/SDS disponível.
Você pode procurar a FISPQ/SDS de um produto na internet, pesquisando o nome do produto e a sigla "SDS" ou "FISPQ" no Google. São documentos com formato padronizado, que fornecem detalhes dos riscos associados ao produto.
As fichas também incluem pictogramas de risco padronizados, que representam os riscos físicos, ambientais e à saúde associados ao produto. Você provavelmente já viu esses símbolos antes, como o sinal de "inflamável" em um desodorante ou de "corrosivo" em um produto de limpeza doméstico.
Em relação ao bórax, o principal produto exibido nos vídeos do TikTok, o SDS da substância inclui os pictogramas da silhueta humana e do ponto de exclamação. Eles correspondem aos riscos relacionados de irritação da pele, séria irritação dos olhos e possível prejuízo à fertilidade ou ao feto durante a gestação.
Seguem-se diversas recomendações de segurança, com instruções sobre o equipamento apropriado de proteção pessoal e a forma correta de armazenar e descartar o produto.
Outros detalhes vão além das informações típicas para o consumidor e incluem sua composição, informações sobre primeiros socorros, dados toxicológicos e métodos de combate a incêndios. São instruções úteis para profissionais médicos no tratamento de pacientes e para os bombeiros no combate a incêndios e vazamentos de substâncias químicas.
As fichas de informações de segurança não são perfeitas, mas representam um recurso útil. Por isso, na próxima vez em que você encontrar uma "cura milagrosa" incomum nas redes sociais, ou se tiver dúvidas sobre alguma substância na sua casa, procure sempre ler antes a sua ficha de informações de segurança.
* Nathan Kilah é professor de química da Universidade da Tasmânia, na Austrália.
Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado sob licença Creative Commons. Leia aqui a versão original em inglês.
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