O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campo Neto, afirmou que a autoridade monetária estuda o fim dos juros rotativos do cartão de crédito para reduzir a inadimplência nas operações. A modalidade é a mais cara do mercado, com juros que chegaram a 437,3% ao ano em junho.
O crédito rotativo é oferecido ao consumidor quando ele não paga o valor total da fatura do cartão até o vencimento. Segundo Campos Neto, em até 90 dias, o BC apresentará uma "solução para o problema". Técnicos estudam encaminhar os devedores direto para o parcelamento da dívida, que teria taxas de juros menores, em torno de 9% ao mês — atualmente a média é de 15%.
"A solução está se encaminhando para que não tenha mais rotativo, que o crédito vá direto para o parcelamento, com uma taxa ao redor de 9% ao mês. Você extingue o rotativo. Quem não paga o cartão, vai direto para o parcelamento ao redor de 9% ao mês (equivalente a 181% ao ano)", declarou Campos Neto, que prestou depoimento ontem, em sessão plenária no Senado para prestar contas sobre a atuação da autoridade monetária no primeiro semestre, conforme prevê a lei que conferiu autonomia ao Banco Central.
O presidente do BC disse ainda que deve ser criado algum tipo de tarifa para desincentivar o parcelamento de compras em prazos muito longos. "Não é proibir os parcelamentos sem juros, é simplesmente tentar fazer com que eles fiquem um pouco mais disciplinados, numa forma bem faseada, para não afetar o consumo. Lembrando que cartão de crédito é 40% do consumo no Brasil", afirmou.
A taxa de inadimplência no rotativo do cartão está, atualmente, em cerca de 49%. Campos Neto destacou que o Brasil teve um grande aumento no número de cartões nos últimos anos e facilidades de crédito, o que fez crescer a inadimplência na modalidade. "Bancos, novos entrantes e varejistas acabaram usando o cartão de crédito como um instrumento de fidelizar o cliente", disse.
Outra solução seria simplesmente limitar os juros de cartão, mas isso, segundo ele, acarretaria a retirada de cartões de circulação e poderia travar o consumo. "Para as pessoas que têm mais risco os bancos não ofereceriam aquele cartão, devido a uma relação de risco e retorno ineficiente. O problema de cortar o número de cartões é que se sabe como começa, mas não se sabe como termina. Isso pode gerar um efeito muito grande na parte de consumo, na parte de varejo", destacou.
A proposta do fim do rotativo está sendo construída em diálogo com o deputado Elmar Nascimento (União-BA), autor do projeto de lei do Desenrola, programa de renegociação de dívidas. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já havia afirmado que o governo estava somando esforços para baixar os juros da modalidade. Segundo Haddad, a maioria dos credores do Desenrola se encontra inadimplente devido ao rotativo.
A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) vê a medida com reservas e defende a necessidade de uma "diluição de riscos", hoje concentrados nos bancos, que suportam um elevado custo da inadimplência. "Defendemos que deve ser mantido o cartão de crédito como relevante instrumento para o consumo. Da mesma forma, deve haver o reequilíbrio da grande distorção que só o Brasil tem, com 75% das compras feitas com parcelado sem juros", afirma nota da entidade.
A federação disse estar trabalhando junto ao Ministério da Fazenda, ao Banco Central e o varejo, para uma "solução construtiva que passe por uma transição sem rupturas, que possa incluir o fim do crédito rotativo e um redesenho das compras parceladas no cartão".
A Associação Brasileira de Bancos (ABBC), que reúne instituições de médio porte, afirmou, também em nota, que impor um teto de juros na modalidade poderia acarretar desdobramentos "extremamente contraproducentes", tais como "a complexificação de entrada de novos players no mercado, a diminuição do acesso ao crédito e a redução da inclusão financeira".
"Desconsiderando a alternativa de tabelamento dos juros ou quaisquer outras medidas restritivas de acesso do consumidor aos instrumentos de crédito, acreditamos que poderiam ser eficazes, em termos estruturais, ações como o fomento à portabilidade do crédito e o estabelecimento de uma comunicação mais transparente aos usuários sobre o valor dos juros, encargos e riscos envolvidos na utilização do produto", opinou a entidade.
Giancarlo Greco, presidente da Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs), que representa as empresas de meios eletrônicos de pagamento, disse esperar que as discussões em torno do projeto que prevê um limite aos juros do rotativo do cartão de crédito ganhem corpo nas próximas semanas.
Em coletiva de imprensa para a apresentação do balanço do primeiro semestre, ele ponderou que o tema é complexo e defendeu que o rotativo tenha um custo cada vez menor, de modo a contribuir com o poder de compra dos consumidores. "Nossa preocupação é com o consumo das famílias, que elas tenham um instrumento para caminhar no dia a dia", disse o executivo.
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