O governo ainda deve demorar 45 dias úteis para explicar a contento as causas do apagão que deixou 25 estados e o Distrito Federal sem energia na manhã da última terça-feira. O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) divulgou, nesta quinta-feira (17), o primeiro documento oficial sobre as causas do blecaute. No Informe Preliminar de Interrupção de Energia no Sistema Interligado Nacional, o órgão confirma que foi identificada uma falha na linha de transmissão 500kV Quixadá II/Fortaleza II, no Ceará. A linha é operada pela Chesf, subsidiária da Eletrobras.
De acordo com o informe, uma atuação incorreta no sistema de proteção da linha, que operava dentro dos limites, ocasionou o seu desligamento. No entanto, esse incidente sozinho não poderia ter causado um apagão da magnitude que ocorreu, segundo o relatório.
No documento, o ONS afirma que, depois da ocorrência, passou a gerir o Sistema Integrado Nacional (SIN) de forma "mais conservadora" para garantir a segurança do fornecimento de energia. Entre as medidas tomadas pelo Operador, estão a redução no carregamento das linhas de transmissão e a postergação de manutenções programadas.
O relatório do ONS explica que o desligamento da linha da Chesf provocou um efeito em todo o sistema. "Após a abertura da linha, foi observado afundamento brusco de tensão com propagação do efeito para equipamentos adjacentes e consequentes oscilações elétricas (tensão e frequência) no sistema das regiões Norte e Nordeste", destaca o documento. "O evento provocou a separação elétrica das regiões Norte e Nordeste das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, com abertura (queda) das interligações entre essas regiões."
O relatório preliminar, porém, não conseguiu encontrar causas técnicas que expliquem o apagão de forma conclusiva. O ONS afirmou que está elaborando uma análise mais detalhada da ocorrência, que deve ser apresentada em reunião marcada para o próximo dia 25, com o Ministério de Minas e Energia e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). A avaliação será consolidada em um Relatório de Análise da Perturbação (RAP), que levará até 45 dias úteis para ser concluído.
Mesmo sem causa totalmente conhecida, o apagão deu impulso às discussões sobre a revisão da privatização da Eletrobras, concluída em junho do ano passado, durante o governo Jair Bolsonaro. Ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) publicou decreto que exclui as ações da empresa ainda sob controle do governo do Programa Nacional de Desestatização (PND). O decreto também revoga a qualificação das participações acionárias remanescentes de emissão da Eletrobras do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI).
A medida em nada modifica a situação e o controle da companhia por capitais privados. Porém, sinaliza que o governo quer manter a fatia de papéis da empresa em seu poder, que atualmente corresponde a 43% das ações ordinárias, e deve continuar buscando meios de reverter a venda da elétrica. Lula vinha criticando a venda do controle acionário da companhia e chegou a chamar a privatização de "crime de lesa pátria".
Além da privatização em si, o governo reclama que o poder de voto que a União passou a ter na diretoria é menor do que a sua real participação no capital da Eletrobras. No início deste mês, a Advocacia-Geral da União (AGU) acionou o Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar alguns pontos da lei que permitiu a alienação do controle da companhia. Assinada pelo presidente Lula, a ação pede que o STF anule o trecho da lei que limitou o poder de voto de cada acionista a 10% do capital, independentemente da participação que tenha na companhia.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifestou favoravelmente à ação proposta pelo governo. O procurador-geral, Augusto Aras, no entanto, sugeriu que haja tentativa de conciliação entre União e demais acionistas, antes que o STF decida sobre o caso.
"Nessa perspectiva de busca pelo equilíbrio na composição dos interesses dos acionistas voltada ao desenvolvimento da Eletrobras enquanto agente econômico da maior relevância para o mercado e para o setor elétrico brasileiro, o ideal é que os próprios interessados (União e demais acionistas) cheguem a uma solução de consenso", disse Aras.
Apesar da articulação do governo, no Congresso, o clima não é favorável à reversão do processo de desestatização. Tanto o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), quanto o do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), já sinalizam que são pequenas as chances de rever a lei da privatização, aprovada por ampla maioria nas duas Casas.
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