Washington — Nos bastidores dos debates no Lide Brazil Development Forum, na capital dos Estados Unidos, a preocupação das autoridades presentes era como o governo irá fazer para cumprir a meta de deficit zero no ano que vem. Até aqui, todos os presentes avaliaram que a situação é positiva, que o Produto Interno Bruto cresceu acima do esperado no segundo trimestre deste ano, mas que é preciso atenção. Não por acaso, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, tem repetido à exaustão, e o fez novamente no evento do Lide, que "a batalha da inflação em termos globais, não está ganha, mas o Brasil tem buscado um pouso suave". Ele mencionou inclusive a necessidade de ajudar o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a cumprir a meta (fiscal, de deficit zero) em 2024. "O governo precisará de arrecadação extra para cumprir o que está no arcabouço. É importante que se ajude o ministro", mencionou, em palestra-almoço para empresários e políticos, nesta sexta-feira (1/9), em Washington.
Pela manhã, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, já havia defendido que os Poderes da República se sentassem para discutir propostas que levem o Brasil a cumprir esse objetivo de deficit zero. "Temos que nos sentar e analisar as propostas legislativas inteligentes e justas para que o país possa cumprir a meta", afirmou, citando projetos que já estão em debate na Casa, como a taxação das offshores e das apostas esportivas.
Em sua fala inicial, Pacheco mencionou as conversas que teve nos Estados Unidos: "Há uma grande apreensão nos Estados Unidos sobre o comportamento do Brasil. O desenvolvimento das relações se dá sob a liderança do presidente da República, mas não só", disse Pacheco, referindo-se ao encontro que teve, na quinta-feira, com brasilianistas do Instituto Wilson Center, no qual uma das preocupações foi a relação do Brasil com a China. "O Brasil é um país que negocia com todos os países e isso não significa excluir ninguém", afirmou o presidente do Senado.
A agenda econômica, tanto na opinião de Pacheco quanto dos demais palestrantes, está intrinsecamente relacionada à agenda ambiental. E, nesse sentido, o senador mineiro considera que o Poder Executivo não pode decidir sozinho as questões nacionais, e que deve haver equilíbrio entre preservação e desenvolvimento. "Defesa do meio ambiente não pode ser intransigente. E possível conciliar. Não podemos permitir o radicalismo do explorador voraz e irresponsável nem o ambientalismo intransigente", afirmou, num discurso marcado pela defesa do equilíbrio político e econômico. "E isso não será feito só pelo Executivo."
Pacheco ressaltou que o Brasil não pode abrir mão de suas riquezas naturais e disse que o Senado estará atento aos projetos. Citou, por exemplo, o marco legal do saneamento. "Nós atuamos para fazer prevalecer o marco legal do saneamento, quanto houve a tentativa de mitigá-lo", disse o presidente do Senado, ao lembrar que o Congresso estará presente na análise das propostas na área ambiental, tratamento de resíduos sólidos, crédito de carbono, e fará isso com os olhos voltados para o equilíbrio de ações que levem à transição energética, sem viés ideológico.
Outro que também está pronto para ajudar o Brasil nessa transição energética é o presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento, Ilan Goldfajn. O dirigente deixou claro que o banco tem como ajudar nesse caminho. Porém, é preciso ter bom projetos. "O Brasil é o principal cliente do BID", afirmou, referindo-se aos 80 projetos que a instituição financia no país, num total de R$ 82 bilhões. Goldfajn frisou que, ao longo dos anos, a filosofia está mudando. Antes, o banco levava mais em conta o volume de recursos desembolsado para os países. Hoje, está no radar o impacto que os projetos podem ter no desenvolvimento dos países. "Não se trata apenas de repasses de recursos e sim de levar uma vida melhor para as pessoas", afirmou.
Do presidente do Banco Central ao do BID, passando por senadores, governadores e prefeitos, há uma boa vontade geral de influir e ajudar a construir o projeto de crédito de carbono. Pelos debates deste primeiro dia do forum, passaram 11 governadores, inclusive o do DF, Ibaneis Rocha, dois vice-governadores, de Minas Gerais, Mateus Simões, e o do Espírito Santo, Ricardo Ferraço.
A avaliação geral é a de que o país não pode perder a oportunidade de desenvolvimento que surge com a energia limpa, renovável e a sustentabilidade na produção dos mais variados insumos e produtos. "Temos uma visão otimista, de uma sequência de vitórias. A lista de reformas de três governos distintos é impressionante", comentou o CEO do Itaú, Milton Maluhy, referindo-se a várias delas, tais como lei do gás, marco do saneamento, open finance, Pix, reformas trabalhista e tributária, cuja análise ainda está em curso, e a autonomia do Banco Central, muitas vezes criticada pelo governo Lula. Maluhy ressaltou ainda o resultado do PIB, anunciado ontem, como algo acima das expectativas. Porém, não deixou de mencionar que espera um crescimento um pouco menor este ano, em relação à expectativa anterior.
Nenhum integrante do governo federal foi ao Lide Brazil Investment Forum ouvir as contribuições de tantas autoridades que, embora tenham uma visão diferente do governo federal em relação a alguns aspectos econômicos, querem contribuir no debate e têm poder de influenciar as decisões. No Planalto, a avaliação é a de que o presidente Lula não perdoou as críticas que recebeu de João Doria, fundador do Lide, quando o empresário ainda governava São Paulo. Porém, se o governo não vai ao Lide, os presentes ao evento — com votos no Congresso e presença forte no setor produtivo e econômico do país — estão preparados para influenciar as soluções.
"Terminamos com o sentimento de que estamos navegando com o mesmo destino, de ajudar o Brasil. Aqui, não há os que são de esquerda, de direita, aqui estão aqueles dispostos a caminhar pelo bem do país", disse Doria, que tem feito vários eventos de discussão mundo afora. A maratona de exposições do dia terminou com a música de Ivan Lins "Um novo tempo". Hoje, as autoridades têm encontro marcado no BID, em Washington.
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