23 de Novembro de 2024

Atividade econômica ganha tração


A onda de revisões das apostas para o crescimento Produto Interno Bruto (PIB) deste ano, iniciada na sexta-feira, após a surpresa do crescimento da atividade econômica no segundo trimestre, deixou uma certeza entre analistas: as projeções do boletim Focus, do Banco Central, estarão melhores nesta semana, mas as de inflação podem piorar.

Os ministérios da Fazenda e do Planejamento e Orçamento, por exemplo, esperam crescimento de, pelo menos, 3% no PIB deste ano, e instituições estrangeiras de peso, como Capital Economics e Goldman Sachs, foram além e passaram a prever altas de 3,5% e de 3,25%, respectivamente. Os maiores bancos privados do país, o Itaú Unibanco e o Bradesco, ainda não divulgaram as novas projeções, mas sinalizaram que o viés é de alta para as estimativas atuais de 2,5% e 2,1%.

Conforme os dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o PIB do segundo trimestre cresceu 0,9% na margem (em relação aos três meses anteriores), dado acima da mediana das estimativas do mercado, de 0,2% a 0,3%, mas abaixo do avanço de 1,8% registrado no primeiro trimestre (dado revisado pelo IBGE). O volume total de riquezas do PIB de abril a junho, em valores correntes, somou R$ 2,651 trilhões.

A surpresa veio com o bom desempenho da indústria, que avançou 0,9%, enquanto o tombo da agricultura, de 0,9%, foi menor do que o esperado pela maioria dos analistas. Os indicadores de serviços (setor que representa quase 70% do PIB), mantiveram o ritmo de crescimento de 0,6%, e a aceleração de 0,7% para 0,9% no consumo das famílias foram importantes vetores para o desempenho da atividade econômica acima das expectativas.

Os estímulos fiscais do governo, como o novo Bolsa Família de R$ 600 e a antecipação do 13º dos aposentados, ajudaram a turbinar o consumo, uma das surpresas trazidas pela pesquisa, pois as famílias estão muito endividadas e, mesmo assim, continuaram comprando. E, como há uma expectativa grande para a renegociação das dívidas com o programa Desenrola, lançado em agosto pelo governo, as incertezas sobre essa sustentabilidade do crescimento são elevadas.

Mas, para o terceiro e o quarto trimestres, analistas alertam que a tendência é de queda. O economista-chefe do Banco BV, Roberto Padovani, destacou que o PIB foi melhor do que o esperado nos últimos três ou quatro anos. Mas o debate agora é se esses erros de previsão refletem que houve uma mudança estrutural, por conta das reformas realizadas no governo anterior e do arcabouço fiscal, como comentou o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, após o resultado do IBGE, na sexta-feira.

"Entre 2020 e 2021, houve uma enxurrada de estímulos no mundo e nós nunca tínhamos visto isso na história econômica. E, neste ano, houve uma produção agrícola recorde e aumento de gasto público. Foram R$ 170 bilhões a mais no Orçamento deste ano. Então, não tem muito mistério", afirmou Padovani. Ele pretende revisar a atual projeção de 1,8% para 2,8%. "A expectativa agora é de números levemente negativos no PIB do terceiro e no do quarto trimestre, porque o carregamento estatístico (do primeiro semestre) é de 3,10%", explicou.

Na avaliação do economista do Banco BV, o PIB potencial ainda é baixo e bem menor que os 3,5% registrados no primeiro mandato do governo Luiz Inácio Lula da Silva, quando havia um vento externo favorável. "Acho que o erro é acharmos que estamos sendo surpreendidos, porque tem alguma coisa estrutural, mas também conjuntural. A economia ainda está andando devagar. O nosso PIB potencial está em torno de 2%, e o cenário global não está favorável", alertou Padovani.

O governo não deveria estar soltando rojões com o PIB acima do esperado, porque ainda não há sinais de que a atividade vai crescer de forma robusta e sustentável, de acordo com Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. "O que tem feito o PIB crescer são as commodities, especialmente o agronegócio. Tem sido assim desde 2021, com o choque de preços e do câmbio. O governo precisa reconhecer com mais precisão a força do setor e a importância do agronegócio para o crescimento das últimas décadas, principalmente, nesses últimos anos. Chegou a hora de aparar as arestas com o setor e reconhecer que, se não fosse o agro, o crescimento teria sido bem mais magro", afirmou.

Na avaliação de Vale, o fiscal ainda preocupa, especialmente depois de o governo entregar o projeto do Orçamento de 2024 com um grande volume de fontes incertas de receitas, somando R$ 168 bilhões, para o novo arcabouço fiscal ser cumprido. "Já de partida, no desenho do arcabouço, estava claro que a arrecadação não seria atingida em 2024. O governo vai precisar da reforma do Imposto de Renda para, a partir de 2025, aumentar o resultado primário. Tenho impressão de que 2024 será outro ano perdido como o fiscal deste ano", lamentou. Padovani ressaltou que o fiscal é uma preocupação, mas não de curto prazo.

A economista Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), elevou de 1,8% para 2,5% a previsão de crescimento do PIB deste ano, mas se mantém na ala pessimista para o segundo semestre. Ela reviu de 0,3% para 0,4% a previsão de queda do PIB no terceiro trimestre e manteve em 0,3% a estimativa de recuo da atividade nos últimos três meses do ano.

"Daqui para a frente, o agronegócio terá impacto negativo no PIB por conta da entressafra e, como transporte e outros serviços associados ao setor devem perder força também, o cenário é de piora na atividade. Já tivemos antecipação de venda de automóveis e do 13º salário dos aposentados. Os primeiros dados do comércio e do mercado de trabalho estão mostrando desaceleração", destacou ela citando números do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que registrou queda de quase 37% em julho, no número de vagas formais criadas, para 142,7 mil.

Apesar de elevar de 2,5% para 3% a previsão do crescimento do PIB deste ano, o economista e consultor André Perfeito lembrou que, diante de uma perspectiva de crescimento maior da atividade, não vai demorar para o mercado e parte do colegiado do Banco Central começarem a dar mais peso aos aspectos da atividade que limitam a queda dos juros, como a inflação.

"Com o PIB sendo revisado para cima e com dados benignos no mercado de trabalho veremos em breve argumentações sobre o hiato do produto e PIB potencial ganharem peso", alertou. Ele manteve em 10,75% a previsão para a taxa básica de juros no fim de 2024, patamar elevado para permitir uma retomada mais robusta do crescimento. Atualmente, os juros básicos estão em 13,75% e, pela mediana das estimativas do boletim Focus, devem encerrar 2023 em 11,75% anuais.

De acordo com Eduardo Velho, economista-chefe da gestora JF Trust, os números do Caged corroboram a tese de que o emprego formal aumentou, mesmo com Selic de 13,75% ao ano por um período prolongado e, o por tabela, houve o crescimento da massa salarial, que deu mais gás à demanda agregada interna, ajudando na surpresa dos dados do PIB, principalmente, o consumo das famílias, mesmo endividadas. "Devemos ressaltar que um injeção na veia na demanda agregada interna ocorreu pelo fiscal, com o aumento do deficit público, via elevação dos gastos como Bolsa Família, transferências e subsídios", acrescentou. "Mesmo que não ocorra nenhum crescimento do PIB dessazonalizado nos dois últimos trimestres do ano, a economia brasileira crescerá 3,1% em 2023", resumiu Velho. Ele prevê alta de 3,22% no PIB deste ano.

Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, previa alta de 0,8% no PIB do segundo trimestre e manteve a aposta de crescimento do ano em de 2,4%. Ele reconheceu que há ainda muitas incertezas no cenário externo, especialmente em torno da China, que é o maior parceiro comercial do Brasil, que podem atrapalhar a atividade no segundo semestre e por isso não mudou as projeções. "O crescimento está se consolidando, mas não é nenhuma grande maravilha. Claro que 2,4% é muito melhor do que aquele que se projetava no início do ano, algo em torno de 0,8%", complementou.

Fonte: correiobraziliense

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