22 de Novembro de 2024

Mudanças climáticas ameaçam a qualidade e a oferta da água potável


As mudanças climáticas e as consequentes secas e inundações provocam mais um efeito colateral que coloca em risco a saúde do homem e do meio ambiente. Uma revisão de quase 1 mil estudos científicos liderada pela Universidade de Utrecht, na Holanda, constatou que esses problemas põem sobre pressão a qualidade — além da disponibilidade — da água.

Segundo o artigo, publicado na revista Nature Reviews Earth and Environment, a integridade dos rios, que são fonte da água doce potável, é reduzida nos períodos cada vez mais extensos de extremos climáticos. "À medida que esses eventos se tornam mais frequentes e graves devido às alterações climáticas, a saúde dos ecossistemas e o acesso humano à água potável podem estar cada vez mais ameaçados", alertam os autores.

O relatório mais recente do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) das Nações Unidas, referência científica no tema, traz poucas informações a respeito do impacto do clima na qualidade das águas, diz Michelle van Vliet, professora da Universidade de Utrecht e principal autora do estudo. Para preencher a lacuna, um grupo internacional de pesquisadores analisou 965 episódios de mudanças na qualidade da água de rios durante condições climáticas extremas, como secas, ondas de calor, tempestades e inundações.

Os cientistas também avaliaram as alterações na qualidade dos recursos hídricos durante mudanças climáticas de longo prazo. "Analisamos vários constituintes da qualidade da água, como temperatura, oxigênio dissolvido, salinidade e concentração de nutrientes, metais, e presença de micro-organismos, produtos farmacêuticos e plásticos", diz van Vliet.

Entre as principais conclusões, estão a de que a qualidade da água piora durante secas e ondas de calor (em 68% dos casos), tempestades e inundações (51%) e sob alterações climáticas de longo prazo (56%). Van Vliet esclarece que, na estiagem, há menos recurso hídrico disponível para diluir contaminantes. Já quando chove excessivamente, mais poluentes escoam da terra para os rios. Além disso, sob o cenário de mudanças prolongadas, há um aumento na produção de algas, com consequente redução de oxigênio.

De acordo com as Nações Unidas, desde 2000, as inundações aumentaram 134% no globo, ao mesmo tempo em que a duração da seca cresceu 29% no período. Apenas 0,5% da água na Terra é potável, percentual que pode decrescer caso o ritmo das mudanças climáticas não se altere nem sejam adotadas políticas para minimizar o impacto dos extremos sobre a qualidade dos rios, alerta o artigo holandês.

"Os graves efeitos que as alterações climáticas já estão tendo na qualidade da água a nível mundial são muito preocupantes. Previsões anteriores sobre as mudanças climáticas assinalaram isso, mas, infelizmente, agora assistimos a esses eventos extremos em todo o mundo", comenta Luke Mosley, professor da Universidade de Adelaide, na Austrália, que participou do estudo.

Mosley é autor de alguns dos artigos da revisão, incluindo dados sobre a Seca do Milênio, que assolou a Austrália entre 2007 e 2020. Nesse período, foram observados diversos indicadores de má qualidade da água nos recursos hídricos do país, incluindo salinização e acidificação extremas. Os impactos ecológicos também foram drásticos, com a morte de milhares de peixes no principal rio australiano, o Darling, em 2019. "Os rios são ecossistemas intrinsecamente importantes, mas também fornecem fontes essenciais de água para consumo humano e para a agricultura. Água de má qualidade pode fazer com que a água do rio seja inadequada para esses usos", lembra o professor.

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As alterações na qualidade da água são fortemente impulsionadas pelas mudanças na vazão e na temperatura dos rios. O uso do solo e outros fatores humanos, como o tratamento de resíduos, também impactam nas propriedades do recurso, lembra van Vliet. "É crucial compreender a complexa interação entre o clima, o uso do solo e os fatores humanos, que, juntos, influenciam as fontes e o transporte de poluentes", afirma.

A pesquisadora destaca que os resultados da revisão apontam para a necessidade de mais dados sobre a qualidade da água em países não ocidentais. "Precisamos de uma melhor monitorização da qualidade da água na África e na Ásia. A maioria dos estudos sobre o tema concentra-se agora em rios da Europa." Além disso, a pesquisadora destaca que é urgente "uma melhor compreensão das mudanças na qualidade da água durante eventos climáticos extremos e dos mecanismos subjacentes". "Só então, seremos capazes de desenvolver estratégias eficazes de gestão da água que possam salvaguardar o nosso acesso à água limpa e garantir a saúde dos ecossistemas face às alterações climáticas e ao aumento dos extremos climáticos", justifica.

"Reservatórios — abastecidos por rios — garantem nosso fornecimento de água potável. A boa qualidade da água é, portanto, crítica, mas corre um risco significativo devido às alterações climáticas. Ondas de calor, secas, inundações, incêndios florestais e suas consequências estão aumentando e alterando o nosso ambiente. Fizemos um estudo na região de Harz (Alemanha) e demonstramos que o desaparecimento das florestas associado aos extremos do clima afetam a área de captação dos reservatórios de água potável. Infelizmente, o problema dessas consequências indiretas das alterações climáticas está seriamente subestimado."

Michael Rode, pesquisador do Departamento de Análises e Manejo de Ecossistemas Aquáticos da Universidade de Leipzig, na Alemanha

 

Fonte: correiobraziliense

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