No mundo atual é impossível dissociar o uso das telas, seja de smartphone, televisão ou computador em qualquer idade, a sociedade foi tomada pela tecnologia. Entretanto, o tempo de exposição, sobretudo, nos primeiros anos de vida, é um ponto de alerta. Saber a hora de se desligar das telas é questão de saúde. Mas nem todos entendem, aceitam ou conseguem.
Último exemplo do que para muitos se tornou um "vícío", "escape", "companhia" ou seja lá o adjetivo que quiser nomear, ocorreu com uma menina de 11 anos, em Patos de Minas, no Alto Paranaíba. Inconformada pela fato dos avós a terem proibido de usar o celular, a neta os trancou no quarto, ateou ateou fogo em um sofá e deixou o imóvel. As chamas se alastraram e as vítimas (um casal de 53 e 70 anos), que dormiam, tiverem de pular da janela do quarto do prédio onde moram para escaparem do pior.
Nada mais grave ocorreu. A mulher relatou dores nas pernas e no tórax e foi atendida pelo Serviço de Urgência e Emergência (Samu). Ela também inalou muita fumaça e foi encaminhada para o Hospital Regional Antônio Dias (HRAD). Já o homem não sofreu ferimentos e recusou atendimento. A criança foi entregue à mãe, que relatou que a filha sofre com oscilações de humor. O Conselho Tutelar foi acionado para acompanhar o caso.
O uso excessivo de eletrônicos muitas vezes leva a um estilo de vida sedentário, leia-se risco alto de obesidade, má postura, síndrome do olho seco, afeta a coluna de várias formas devido ao tempo prolongado gasto em frente a esses dispositivos (sídrome do pescoço de texto), falta de sociabilidade, o risco de estar exposto a crimes e violências entre outras questões preocupantes.
E, especificamente, na pré-adolescência e adolecência as telas estão bem presentes e o mau uso nesta fase, marcada por transformações intensas, tanto no aspecto físico quanto mental, cognitivo e social, é um risco. Há mudanças na estatura, na voz, no corpo, no jeito de se comportar em socidade, em seu núcleo de vivência, além do despertar da sexualidade, enfim, mudanças que influenciam a saúde mental para absorver tudo isso, e daí pode vir a ansiedade, questões de humor, isolamento e maior mergulho nas telas.
A jornalista Kaísa Romagnoli, de 37 anos, mãe da adolescente Kethelyn Romagnoli, de 13, revela que faz controle do uso do smartphone da filha desde os 8 anos: "Tenho um aplicativo instalado no celular dela, que se chama family link, e por meio dele consigo ver todas as ações que ela teve no celular, whatsapp, quanto tempo permaneceu em cada rede social, consigo ver qual aplicativo e conteúdo ela baixou. Além disso, também tenho controle de localização do telefone dela. Então, o que eu faço? Sempre que ela está se movimentando, recebo uma notificação falando a rua o numeração próxima em que a Kethelyn está".
Kaísa Romagnoli explica o por que de fazer este controle da filha: "Internet, vídeo-game seja no celular ou computador, é uma terra que não conseguimos controlar, ainda que não chega a ser uma terra sem lei, porque há leis com controle de conteúdo, mas sabemos da dificuldade de fazer esta administração.Como ela jogo on-line, quis saber com quem ela se relaciona e o que joga. Assim, tenho maior controle dos acessos".
A mãe revela que nada foi feito sem o conhecimento da filha: "Nunca fiz escondido dela. Falei sobre a instalação do aplicativo e que teria acesso. E além disso, ela tem um limite de horário. O celular dela desbloqueia às 10h e é bloqueado às 20h. O o controle também faço pelo aplicativo".
E como tudo foi às claras, Kaísa assegura que Kethelyn entendeu: "A cumplicidade de comunicar à minha filha que o controle é para a sua segurança a fez entender. Sempre procuro instruí-la e ela sabe os riscos que envolve a internet hoje em dia, sabe o que pode acontecer.
Vemos filmes e documentos juntas para dar esta visibildade para ela o quão é perigoso usar internet sem se preocupar com quem está falando, com quem está do outro lado, ataques criminosos, há bastante coisa envolvida. No começo, ela ficou um pouco assim, principalmente na fase dos 11 anos, com o coração desperta para paixões, ela ficou um pouco mais reprimida, mas respeito a privavidade dela. Nós, como mães, temos um feeling, acende uma luz e vou lá e olho e vejo se ocorreu alguma coisa. Tenho todo esse histórico".
A psicóloga clínica Cynthia Dias Pinto Coelho enfatiza que, quando uma situação complexa como essa ocorre, ela joga luz sobre um tema que precisa ser olhado com mais atenção por toda a sociedade, que é a saúde mental de crianças e adolescentes e o uso desregrado de telas: "O caso em questão assusta e causa espanto, mas ele poderia ocorrer na casa de qualquer pessoa. As crianças e adolescentes estão cada vez mais apegados ao celular e às redes sociais.
A colocação de limites de tempo de uso ficou seriamente comprometida em função da pandemia, onde as atividades escolares e as atividades de lazer envolviam o celular e/ou o computador. A convivência familiar foi perdendo espaço para os eletrônicos e o diálogo diminuiu de intensidade e profundidade, com cada um inserido em seu próprio mundo digital. Por causa disso muitos detalhes que chamariam a atenção no comportamento de uma criança ou adolescente em casa ou no seu círculo de amizade acabam passando despercebidos pelos pais, que só descobrem que algo estava muito errado com o seu filho/a quando uma tragédia como essa acontece".
Cynthia Dias Pinto Coelho detaca que, normalmente a criança ou o adolescente apresentam sinais que não devem ser negligenciados pela família, como, por exemplo, a agressividade com palavras e respostas grosseiras, o isolamento social, a dificuldade da aceitação de regras e limites em casa ou na escola, oscilações de humor, alteração de sono, comportamentos impulsivos, sem a devida reflexão sobre seus atos e suas consequências, a dificuldade de lidar com a frustração ou com a elaboração da raiva, dentre outros.
De acordo com a psicóloga, diante de comportamentos assim a família deve procurar ajuda profissional do psicólogo e do psiquiatra, para receber as orientações necessárias para o seu manejo e para iniciar um acompanhamento de saúde mental.
Cynthia Coelho lembra que é importante conversar e ouvir os filhos, saber de suas relações de amizade, conhecer os tipos de páginas digitais que eles acessam, os jogos e comunidades virtuais que eles participam, saber sobre o seu comportamento na escola e a sua forma de ver o mundo: "Essa relação de maior interesse e diálogo pode criar na família um espaço para debates e ponderações, para que os combinados sejam traçados, com a definição clara de direitos e deveres dos filhos em casa.
Os limites devem ser claros e explicados, para que a criança e o adolescente se organizem mentalmente tanto para o seu tempo de uso de telas como para o tempo de sua suspensão, nos horários previamente combinados. A rotina saudável deve envolver outras atividades de lazer que não as digitais, como aulas de arte, atividade física, jogos de tabuleiro, conversas, passeios culturais, aula de música, etc. Ou seja, é preciso mostrar a eles que a vida também precisa acontecer fora das telas e das relações mágicas do mundo digital e que ela, aliás, ela pode ser muito mais divertida".
A psicóloga destaca que a criança e o adolescente ainda estão em formação, tanto na parte psíquica quanto na parte neurobiológica: "Eles ainda estão aprendendo sobre o seu jeito de ser, sobre o seu lugar no mundo, sobre conceitos de certo e errado, de causa e consequência. E cabe à família a colocação de limites e regras, para que seus filhos cresçam de forma saudável do ponto de vista emocional. É nessa fase que o ser humano aprende que ele não pode ter tudo na vida, da maneira como ele quer e na hora que ele quer".
Cynthia Coelho conta que são os "nãos" que a criança e o adolescente recebem que irão prepara-lo para lidar com a frustração de forma adequada, resiliente e saudável: "Muitos pais tem sérias dificuldades em colocar limites para seus filhos, achando que ao permitir tudo farão seus filhos mais felizes. Mas pelo contrário, é a colocação do limite que o auxilia a viver de forma equilibrada e sensata, achando outras formas de lidar com uma questão quando se depara com um limite trazido em sua vida hoje e também no futuro, em seu ambiente de trabalho, em suas relações afetivas, em um problema de saúde, dentre outros".
No entanto, a psicóloga ressalta que nem todo problema é fruto apenas de questões ligadas à educação recebida: "Crianças e adolescentes também sofrem com psicopatologias e transtornos mentais, que necessitam de tratamento psicológico e psiquiátrico, podendo, inclusive, necessitar do uso de medicação. O diagnóstico adequado e o tratamento correto são fundamentais".
Para Cynthia Coelho, depois do ocorrido, com a neta colocando fogo no sofá dos avós, a atenção à saúde mental da menina se faz ainda mais necessária: "Ela tem de ser acompanhada de perto por uma equipe multidisciplinar, com psicólogo e psiquiatra, assistente social e a coordenação da escola. É preciso entender o que a levou a agir de forma concreta para lidar com sua frustração emocional, colocando em risco a vida de seus avós e outros vizinhos do prédio.
É preciso avaliar sua saúde mental, diagnosticar e tratar algum possível transtorno psiquiátrico, se for o caso. Entender o ambiente familiar e a forma das relações interpessoais nessa família para alguma intervenção terapêutica, caso necessário. E, por fim, ajudá-la a retornar às suas atividades cotidianas, sem críticas ou julgamentos por parte da sociedade, escola ou família, sem ataques ou cancelamentos, que podem prejudicar ainda mais o seu quadro emocional", recomenda a psicóloga.
De acordo com orientações que fazem parte de conscientização da agência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre sedentarismo e obesidade, crianças de até cinco anos não devem passar mais de 60 minutos por dia em atividades passivas diante de uma tela de smartphone, computador ou TV. A recomendação foi divulgada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que alertou ainda que bebês com menos de 12 meses de vida não devem passar nem um minuto diante das telas de dispositivos eletrônicos.
Uso saudável
Recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) para o tempo de exposição de telas de acordo com a faixa etária. Lembrando da importância de dar um intervalo a cada 20 ou 30 minutos para ter contato com luz ambiente.
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