A Faixa de Gaza, pedaço de terra entre o Mar Mediterrâneo e Israel, tem apenas 41km de comprimento por 11km de largura, mais de 2 milhões de habitantes e um complexo sistema de túneis construído pelo Hamas, que controla o enclave. O sinal verde para a ofensiva terrestre depende somente do consenso do gabinete de guerra montado por Benjamin Netanyahu. "Estamos nos preparando para a incursão", declarou o primeiro-ministro israelense, que descartou considerações políticas sobre a operação. "Todos os membros do Hamas estão marcados para morrer, acima e abaixo do solo, dentro e fora de Gaza. (...) Não posso dizer quando, como ou quantos (militares) haverá, nem as medidas que levamos em conta (para a invasão)", acrescentou, em pronunciamento aos 9 milhões de cidadãos. A próxima fase da campanha militar contra o grupo extremista que matou 1,4 mil pessoas e sequestrou 222, no sul de Israel, em 7 de outubro, promete ser desafiadora. A guerra de guerrilha urbana no território palestino reserva armadilhas e obstáculos para os 360 mil soldados das Forças de Defesa de Israel que aguardam a ordem, diante da fronteira de Gaza.
No discurso televisionado, Netanyahu fez um mea-culpa pelos ataques terroristas. "Como primeiro-ministro, sou responsável por garantir o futuro do país. Agora, o meu papel é liderar o Estado de Israel e o povo a uma vitória esmagadora sobre nossos inimigos", disse. "Todos terão que responder (pelo atentado), inclusive eu, mas isso acontecerá somente depois da guerra." Nesta quarta-feira (25/10), o Hamas voltou a disparar vários foguetes contra Israel e atingiu a cidade mais ao sul do país, Eilat, às margens do Mar Vermelho, na fronteira com a Jordânia. As sirenes antiaéreas voltaram a soar em Tel Aviv, a 70km de Gaza.
Em entrevista ao Correio, por meio do WhatsApp, Ali Barakeh — chefe do Departamento de Relações Nacionais do Hamas — destacou que "morte e vida estão nas mãos apenas de Deus". "Netanyahu está tentando levantaro moral de seu exército, mas ele é um primeiro-ministro fracassado, ao ameaçar uma invasão por terra. Ele está hesitante e teme o confronto com os homens da resistência", assegurou. Barakeh fez uma ameaça: "O que espera por ele são mais perdas humanas e materiais; Gaza será um cemitério para o exército da ocupação, caso decida atacar".
As IDF realizaram uma série de simulações de invasões à Faixa de Gaza no centro de treinamento de Tze'elim, uma espécie de réplica em menor escala da Cidade de Gaza. Diretor do Departamento de Estudos de Guerra Urbana do Instituto de Guerra Moderna da Academia Militar dos EUA, John W. Spencer explicou ao Correio que uma ofensiva por terra impõe vários riscos a Israel. "Um dos principais está na percepção da operação, que envolveria tanques, infantaria, mais bombardeios e milhares de disparos de artilharia diariamente. A rede de túneis construída pelo Hamas, as passagens e a adoção de táticas de guerrilha, como casas-bomba, IEDs (dispositivos explosivos improvisados), drones e franco-atiradores visa não destruir as forças israelenses, mas ganhar tempo", alertou, por telefone.
Para Spencer, a presença de reféns dentro dos túneis e o uso de civis como escudos humanos serão os principais obstáculos enfrentados pelos soldados da IDF no enclave palestino. Ele não acredita que uma incursão em Gaza cause danos políticos em Netanyahu. "Como líder de Israel, Netanyahu seria prejudicado se não levasse adiante uma ofensiva por terra. Destruir o Hamas e resgatar as pessoas sequestradas em 7 de outubro são uma meta, não uma campanha pela vingança. Netanyahu tem que responder ao atentado cometido pelo Hamas e minar a capacidade militar do grupo, de forma que eles não repitam o ataque nem disparem um único foguete em direção a Israel. Desde 7 de outubro, o Hamas tem lançado foguetes todos os dias", acrescentou o estudioso.
Uma reportagem do The Wall Street Journal informou que o presidente norte-americano, Joe Biden, teria pressionado Netanyahu a adiar uma incursão terrestre até a libertação de todos os 220 reféns em poder do Hamas. Também anunciou que o grupo extremista treinou combatentes no Irã, antes dos ataques ao sul de Israel. Barakeh negou e admitiu à reportagem que os treinamentos ocorreram na própria Faixa de Gaza. Por sua vez, Biden desmentiu ter feito qualquer exigência. "O que lhe indiquei foi que, se é possível retirar essas pessoas de forma segura, isso é o que ele deve fazer. É decisão dele", declarou.
Os bombardeios à Faixa de Gaza ganharam ainda mais intensidade nas últimas horas. O Ministério da Saúde, controlado pelo Hamas, afirma que 6.500 palestinos morreram nos últimos nove dias. Os EUA duvidam do balanço. "Estou certo de que morreram inocentes, é o preço de se fazer a guerra. Mas não confio no número apresentado pelos palestinos", disse Biden. Em Deir Al Balah, no centro-sul da Faixa de Gaza, o engenheiro civil Mohammed Al Assar relatou ao Correio que "os ataques aéreos estão apertando". "Está difícil. Temos cada vez menos comida. Estamos sem gasolina até para os geradores. O mais difícil, nesta manhã, foi encontrar água e comida. Durante as noites, temos que enfrentar o medo. Muitas famílias fugiram do norte de Gaza e, agora, estão saindo do sul. Está muito difícil."
Daniel Zohar Zonshine, embaixador de Israel no Brasil
O que o senhor diria a quem acusa Israel de cometer uma punição coletiva aos palestinos?
Isso não é verdade. Israel atua contra alvos militares ou contra alvos usados militarmente. Se já uma residência ou um escritório usado como depósito de armas, quartel-general ou ponto de reuniões militares, torna-se um alvo militar legítimo. Podemos atacá-lo e isso está em consonância com o direito internacional. Nós combatemos apenas o Hamas e tentamos prevenir, tanto quanto possível, o assassinato de pessoas não envolvidas. Ao contrário do Hamas, que, de forma deliberada, aponta suas armas para civis e utiliza moradores de Gaza como escudos humanos. O Hamas os impede de abandonar as zonas de combate, a fim de proteger os seus terroristas dos ataques das Forças de Defesa de Israel (IDF).
O senhor vê o risco de o conflito se espalhar para países vizinhos?
Desde 7 de outubro, o Estado de Israel está sob ataque também na frente norte. Houve um grande número de ataques com mísseis antitanque e foguetes contra alvos militares e civis, em Israel, e uma resposta militar israelense comedida. Estamos tentando evitar um conflito total, mas estamos prontos para isso. A responsabilidade total cabe ao Irã e ao Hezbollah, que tentam expandir a guerra para frentes adicionais. (RC)
"Os homens da resistência palestina estão ansiosos pelos combates terrestres, pois são mais fáceis para eles do que a guerra aérea. A resistência está preparando muitas surpresas para as forças de ocupação. Nós desafiamos Netanyahu a enviar seu exército derrotado à Faixa de Gaza. Não recuaremos e não nos renderemos. Resistiremos até a vitória, à libertação e ao regresso para nossos lares na Palestina ocupada em 1948."
Ali Barakeh, chefe do Departamento de Relações Nacionais do Hamas, em entrevista ao Correio
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