23 de Novembro de 2024

Inovação: COP28 debate a saúde do planeta


Pela primeira vez em 28 edições, a Conferência de Mudanças Climáticas das Nações Unidas terá uma sessão oficial sobre os impactos dos gases de efeito estufa na saúde humana. A COP 28 começa na próxima quinta-feira em Dubai, nos Emirados Árabes, e vai até 12 de dezembro, quando é esperada a declaração conjunta dos 197 países e da União Europeia que participam do evento. Em uma coletiva de imprensa, a Organização Mundial da Saúde (OMS) destacou que não é possível assegurar que o tema estará no documento final, mas comemorou a inclusão inédita no calendário.

O relatório mais recente do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da ONU (IPCC) aponta que 3,5 bilhões de pessoas — metade da população mundial — vivem em áreas altamente vulneráveis às alterações do clima. Mortes associadas ao calor que afetam sobretudo pessoas com mais de 65 anos aumentaram 70% em duas décadas, e esse número deve quintuplicar até 2050, diz a OMS. Os eventos extremos cada vez mais frequentes, como ondas de calor, secas e inundações, devem afetar drasticamente os sistemas de saúde pública.

"Há dez anos, éramos pouquíssimas pessoas falando sobre mudanças climáticas e saúde", recordou Maria Neira, diretora do Departamento de Meio Ambiente, Mudanças Climáticas e Saúde da OMS. "Agora teremos um dia inteiro (3 de dezembro) para discutir os impactos na saúde, com cerca de 100 eventos nesta área." Neira também informou que mais de 60 ministros da saúde estarão na COP28, um recorde. A ministra da Saúde, a brasileira Nísia Trindade, é esperada para a série de debates.

Pressão

Embora em COPs anteriores eventos paralelos tenham abordado a saúde sob o cenário de mudanças climáticas, este jamais foi um tema do calendário oficial das reuniões de alto nível — as da segunda semana, quando são tomadas as decisões da conferência. Maria Neira destacou que a população precisa pressionar seus líderes para colocarem na mesa de negociações da declaração questões como o impacto dos gases de efeito estufa na mortalidade por doenças respiratórias, entre outras enfermidades.

Diarmid Campbell-Lendrum, líder da equipe de Mudanças Climáticas e Saúde da OMS, reforçou que as alterações no clima também são acompanhadas por aumento e redistribuição de doenças infecciosas. "Vemos que mais partes do mundo estão adequadas para a transmissão da malária ou da dengue. Portanto, temos que ser capazes de responder a isso. Precisamos de desenvolver planos e implementar investimentos nos nossos hospitais, na formação dos nossos profissionais de saúde, para lhes permitir proteger as pessoas dos impactos das alterações climáticas que já estamos assistindo", disse.

Uma preocupação de cientistas e da sociedade civil é que a declaração da COP não associe os impactos do clima na saúde aos combustíveis fósseis. Um rascunho de uma declaração sobre o tema obtido na semana passada pelo site Health Policy Watch menciona a necessidade de mitigação, destaca a adaptação dos sistemas de saúde público e ressalta os riscos da poluição do ar. Porém, no texto preliminar não há menção aos hidrocarbonetos. Na coletiva da OMS, Maria Neira e Diarmid Campbell-Lendrum foram enfáticos sobre a necessidade de transição energética. "É preciso acabar com os subsídios aos combustíveis fósseis. É um dinheiro público, que deveria ser endereçado a outras áreas, como a saúde", criticou Neira.

Um relatório recente do Fundo Monetário Internacional (FMI) destaca que os subsídios governamentais aos combustíveis fósseis alcançaram um recorde mundial de US$ 7 trilhões (cerca de R$ 34,32 trilhões) em 2022, um aumento de US$ 2 trilhões (R$ 9,8 trilhões) em relação aos dois anos interiores.

No Brasil, um levantamento do Instituto e Estudos Socioeconômicos (Inesc) divulgado na COP27, no Egito, apontou um gasto de R$ 118,2 bilhões em 2021 no setor, uma cifra que deve aumentar em relação ao ano passado, devido às isenções de impostos concedidas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro durante a campanha eleitoral.

Na entrevista coletiva, Maria Neira, da OMS, afirmou que a energia limpa precisa ser prioridade, inclusive para hospitais, reduzindo a dependência dos hidrocarbonetos. Alguns modelos de centros de saúde que operam com fontes alternativas serão apresentados na COP28.

Para os líderes da Organização Mundial da Saúde (OMS), os líderes mundiais precisam investir mais no tema em metas individuais dos países, contribuições nacionalmente determinadas (NDCs). Recentemente, o organismo da ONU publicou o relatório Revisão da Saúde em 2023 nas NDCs, mostrando que 91% das NDCs mencionam a saúde pública, mas apenas 16% delas incluem metas para reduzir a poluição atmosférica, um dos principais riscos ambientais ao organismo, com impactos respiratórios, metabólicos e cardiovasculares.

"Os países fizeram progressos significativos no reconhecimento da ameaça das alterações climáticas para a saúde humana e planetária nos seus planos nacionais para enfrentar as alterações climáticas, mas precisamos de ver estes compromissos ampliados, acelerados e adequadamente financiados", disse Maria Neira, diretora do Departamento de Meio Ambiente, Mudanças Climáticas e Saúde da OMS em uma coletiva de imprensa on-line.

Maria Neira lembrou que, embora a maioria dos países dependa de financiamento internacional para ações de adaptação, somente 0,5% do fundo verde global é destinado diretamente à proteção da saúde.

Na COP28, a OMS também vai sugerir que governos incentivem dietas menos dependentes de carne e derivados da proteína animal. Um terço das emissões antropogênicas estão relacionadas à produção alimentar, diz o organismo da ONU.

Boa parte dos gases de efeito estufa associados aos alimentos vem da agropecuária: a produção de carne requer frequentemente extensas pastagens, que muitas vezes são criadas por desmatamento; o gado emite metano ao digerir gramíneas, resíduos dos animais nas pastagens e fertilizantes usados no cultivo de grãos para ração produzem óxido nitroso.

Ao mesmo tempo, pesquisas indicam que a adoção de uma dieta sem produtos de origem animal pode reduzir a pegada de carbono da alimentação. Estudo, publicado recentemente na revista Nature por pesquisadores da Universidade de Oxford, sugere que ao tirar do prato, carne e derivados pode diminuir as emissões em 75%.

Com a proximidade da COP28, nos Emirados Árabes, aumenta a pressão das Nações Unidas para um acordo ambicioso. Ontem, o secretário-geral da ONU, António Guterres, pediu aos líderes que se reunirão em Dubai para romper o “ciclo mortal” do aquecimento, com seu impacto devastador na Antártida, “um gigante adormecido (...) acordado pelo caos climático”. Mais de 200 governos foram convidados e, embora a delegação norte-americana esteja presente, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, não participará da cúpula, depois de comparecer por dois anos seguidos, para ressaltar a liderança norte-americana.

Fonte: correiobraziliense

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