Os hormônios produzidos durante o ciclo menstrual afetam o corpo das mulheres de diversas formas. Não só os órgãos reprodutores são atingidos, mas, de acordo com pesquisas recentes, o cérebro feminino também é alterado pela menstruação.
Dois estudos descobriram que o volume ou a espessura de determinadas regiões cerebrais mudam em sincronia com os níveis hormonais. As áreas do cérebro destacadas são as do sistema límbico (grupo de estruturas cerebrais que regem às emoções), a memória e o comportamento.
"É como se o cérebro estivesse em uma montanha-russa a cada 28 dias ou mais, dependendo da duração do ciclo", disse Erika Comasco, professora associada de saúde da mulher e da criança na Universidade de Uppsala, na Suécia. "A importância desses estudos é que eles estão construindo conhecimento sobre o impacto dessas flutuações hormonais sobre como o cérebro é estruturado."
"Essas mudanças cerebrais podem ou não alterar a maneira como agimos, pensamos e sentimos em nossa vida cotidiana. Portanto, as próximas etapas importantes para a ciência são juntar essas peças do quebra-cabeça", disse Adriene Beltz, professora associada de psicologia da Universidade de Michigan, que mostra que o próximo questionamento é se os efeitos hormonais na estrutura cerebral influenciam o funcionamento do cérebro.
O ciclo menstrual se reinicia a cada período de 24 a 38 dias até a transição para a menopausa, o que significa que, em média, a mulher tem cerca de 450 menstruações ao longo de sua vida. A fase tem o início marcado pelo baixo nível hormonal. Mas eles aumentam drasticamente ao longo de algumas semanas, principalmente durante o período menstrual, ocasionado pela não fecundação do óvulo.
Os níveis de estrogênio no sangue se tornam oito vezes mais altos na ovulação, por volta do 14º dia do ciclo, enquanto os níveis de progesterona aumentam em 80 vezes, aproximadamente, sete dias depois. A produção do hormônio folículo-estimulante (FSH) estimula o crescimento de um folículo ovariano em um óvulo maduro, enquanto um pico de hormônio luteinizante (LH) desencadeia a liberação do óvulo.
Viktoriya Babenko, pesquisadora da Universidade da Califórnia, em Santa Bárbara, utilizou ressonância magnética (MRI) para mapear as alterações estruturais em todo o cérebro durante três fases do ciclo: ovulação, menstruação e fase lútea média (que vai do dia seguinte à ovulação ao dia anterior ao início da menstruação).
As participantes, 30 mulheres jovens com ciclos regulares, também tiveram sangue coletado para registrar com precisão os níveis hormonais no momento dos exames.
Concentrações mais altas de estrogênio e de hormônio luteinizante foram associadas a mudanças que sugerem uma transferência de informações mais rápida, ao observarem uma substância branca do cérebro. Essa substância é um tecido mais profundo, composto por fibras nervosas que transmitem informações para partes do córtex cerebral mais externo, conhecido como substância cinzenta - que, por sua vez, ficou mais espessa com o aumento do hormônio folículo-estimulante.
Outra pesquisa, publicada na Nature Mental Health, avaliou 27 participantes saudáveis, com ressonância magnética de alta resolução, durante seis fases do ciclo menstrual: menstrual, pré-ovulatória, ovulação, pós-ovulatória, lútea média e pré-menstrual.
Os pesquisadores se concentraram no hipocampo e nas áreas circundantes do lobo temporal medial, que suportam uma ampla gama de funções cognitivas e emocionais. Eles realizaram coletas de sangue em cada um dos seis momentos para correlacionar as alterações cerebrais com as concentrações de estrogênio e progesterona.
O aumento do estrogênio foi associado à expansão do córtex parahipocampal, uma região cortical de massa cinzenta que desempenha papel na codificação e recuperação da memória. A progesterona elevada foi associada a um maior volume no córtex perirrinal, uma área que recebe informações sensoriais e também é importante para a memória. E o alto nível de estrogênio em combinação com baixo nível de progesterona foi associado a uma região maior do hipocampo, essencial para a memória.
Os dois estudos analisaram diferentes características anatômicas do cérebro, logo, seus resultados não podem ser comparados diretamente. O primeiro escaneou todo o cérebro, inclusive a substância branca, e mediu a espessura cortical; enquanto o segundo deu um zoom em uma região da substância cinzenta do cérebro e analisou o volume cortical. Mesmo assim, os dois confirmaram que a morfologia do cérebro muda ao longo do ciclo menstrual, de forma consistente e simultânea aos níveis hormonais.
"Para a maioria das mulheres, durante a maior parte de nossas vidas, esse fluxo e refluxo de hormônios ao longo do ciclo menstrual é tão constante quanto as marés", explicou Emily Jacobs, professora da Universidade da Califórnia. "Podemos pensar nesse pulso como um sinal vital, pois sabemos que os hormônios impulsionam as funções fisiológicas em todo o corpo. Mas ninguém sabia realmente como isso afetava o cérebro dos seres humanos."
O estrogênio, hormônio sexual feminino produzido pelos ovários, têm mostrado efeitos no cérebro em diversos estudos. No início da década de 1990, um experimento revelou os efeitos dramáticos do hormônio em ratas de laboratório. Os cientistas contaram o número de espinhas dendríticas - pequenas saliências ao longo dos ramos dos neurônios, que servem como pontos de contato de uma célula para a outra - no hipocampo, durante o ciclo menstrual de quatro a cinco dias das roedoras.
No início do ciclo, quando o estrogênio está baixo, a densidade da coluna dendrítica fica em seu ponto mais baixo. Nos dias seguintes, os níveis de estrogênio aumentam gradualmente e atingem o pico. Durante esse período, mais espinhas começam a se proliferar e a densidade delas aumenta em cerca de 30%. Perto do final do ciclo, elas se retraem e o processo começa novamente.
Os resultados atuais sugerem que uma flutuação cíclica semelhante nos neurônios também pode estar ocorrendo em humanos. "Os estudos criam uma base bastante robusta para estudos futuros a fim de investigar se a estrutura do cérebro tem impacto sobre a função e o comportamento do cérebro, o que então se tornaria relevante para a saúde mental", conclui Comasco.
Utilizamos cookies próprios e de terceiros para o correto funcionamento e visualização do site pelo utilizador, bem como para a recolha de estatísticas sobre a sua utilização.