Começam a valer, hoje, as novas regras que limitam a 100%, ao ano, os juros da dívida do rotativo do cartão de crédito. A modalidade é ativada automaticamente quando o cliente não paga o valor total da fatura até a data do vencimento e é a mais cara do país, com juros que chegaram a 431,6% ao ano em 2023. A norma foi estabelecida em dezembro, em decisão do Conselho Monetário Nacional (CMN), depois da falta de acordo entre o governo e instituições financeiras.
A proposta estabeleceu um prazo de 90 dias, a partir da publicação da lei que instituiu o programa de renegociação de dívidas Desenrola, para que as administradoras de cartão apresentassem uma proposta de teto para os juros. Como nenhuma solução foi encontrada, passou a valer o dispositivo fixado na lei que impõe teto aos juros.
Pela nova regra, a dívida total de quem atrasa a fatura do cartão não poderá ultrapassar o dobro do débito original. Por exemplo: se a dívida original for de R$ 100, o valor total a ser pago pelo cliente, com a cobrança de juros e encargos, não poderá ultrapassar R$ 200, independentemente do prazo.
Para o economista Otto Nogami, professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), a medida ensejaria a redução do endividamento dos consumidores. "O novo teto pode ajudar a aliviar o fardo financeiro sobre os consumidores com dívidas rotativas, evitando que cresçam exponencialmente devido aos altos juros. Além disso, ao limitar o crescimento da dívida, pode-se esperar uma redução na inadimplência, uma vez que as dívidas se tornam mais gerenciáveis para o consumidor", avalia.
Apesar de ser considerada uma medida positiva, Nogami afirma que os bancos podem restringir o rotativo e limitar o acesso ao consumidor com menor pontuação de crédito.
"As altas taxas do rotativo são reflexo do risco das administradoras de cartão. Os bancos podem se tornar mais seletivos e limitar o acesso ao crédito para consumidores com menor pontuação. Essa limitação pode levar à queda no consumo das famílias, impactando negativamente no PIB (Produto Interno Bruto)", adverte.
Nogami alerta, ainda, que a melhor maneira de evitar os altos custos do rotativo ainda é o pagamento integral da fatura no vencimento: "A nova regulamentação serve como uma rede de segurança, mas a gestão responsável das finanças pessoais continua sendo a chave para evitar o endividamento", ensina.
Além de oficializar o teto de juros, o CMN instituiu a portabilidade do saldo devedor do cartão — que permite ao consumidor levar a dívida do rotativo para uma instituição financeira que ofereça melhor condição de renegociação. O Conselho Monetário também aumentou a transparência nas faturas, mas essas exigências só vigorarão a partir de 1º de julho.
A portabilidade será gratuita. Caso a instituição credora original faça uma contraproposta ao devedor, deverá ter o mesmo prazo do refinanciamento daquela que se propõe a "comprar" a dívida. O Banco Central (BC) considera que a igualdade de prazos permitirá a comparação de custos.
Segundo o economista Newton Marques, professor da Universidade de Brasília (UnB), o teto do rotativo é uma oportunidade de reduzir o superendividamento e incentivar a educação financeira da população. "Tende a cortar um pouco o ciclo vicioso que existe entre a alta da inadimplência e alta taxa de juros. A partir desse momento, caso haja um aumento do endividamento, deve-se ao devedor — que terá, agora, de colocar em prática algumas premissas de educação financeira", observa.
Porém, para a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), as causas dos elevados juros do rotativo não foram estruturalmente solucionadas com o teto. Por meio de nota, a entidade considera "temporária a solução atual e, por não resolver a causa-raiz, os juros se manterão ainda em patamar elevado, prejudicando o comércio e aqueles que mais precisam de crédito para consumir".
Passada a primeira fase de implementação do teto, a Febraban assegura que "vamos buscar soluções para o reequilíbrio do principal instrumento de financiamento do consumo no Brasil, com maior transparência e uma efetiva e sustentável redução dos juros, que beneficia especialmente a população de renda mais baixa".
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