A guerra na Ucrânia completa dois anos em 24 de fevereiro, e não há razão para acreditar que o conflito vai terminar em breve.
Nem a Ucrânia, nem a Rússia, tampouco os principais aliados de ambos os lados, veem qualquer chance de um acordo de paz no momento.
Kiev está convencida de que suas fronteiras internacionalmente reconhecidas devem ser restabelecidas e que vai expulsar as tropas russas. Já o posicionamento de Moscou segue sendo de que a Ucrânia não é um país propriamente dito, e as forças russas vão continuar a avançar até que seus objetivos sejam alcançados.
A seguir, vamos analisar o que está acontecendo agora, e o rumo que o conflito pode tomar no futuro.
Os violentos combates continuam durante o inverno, custando muitas vidas a ambos os lados.
A linha de frente de combate se estende por 1.000 km — e sua forma mudou pouco desde o outono de 2022.
Poucos meses após a invasão em grande escala, há dois anos, a Ucrânia fez as forças russas recuarem no norte e em torno da capital, Kiev. Retomou ainda grandes partes do território no leste e no sul no fim daquele ano.
Mas, agora, as forças russas estão entrincheiradas com fortificações resistentes, e os ucranianos dizem que sua munição está acabando.
Muitos veem um cenário de impasse militar – incluindo o ex-comandante-em-chefe ucraniano, Valerii Zaluzhnyi, destituído recentemente do cargo, e vários blogueiros militares russos pró-Kremlin.
Em meados de fevereiro, as tropas ucranianas se retiraram da cidade de Avdiivka, há muito tempo disputada, no leste.
As forças russas consideraram isso como uma grande vitória – como Avdiivka está estrategicamente posicionada, abriria caminho potencialmente para invasões mais profundas.
Kiev disse que a retirada visava preservar a vida dos seus soldados, e não escondeu que suas forças estavam em menor número e com menos armas.
Foi a maior conquista da Rússia desde que tomou Bakhmut em maio do ano passado. Mas Avdiivka fica a apenas 20 km a noroeste de Donetsk, cidade ucraniana ocupada pela Rússia desde 2014.
Um avanço tão pequeno está longe da ambição inicial da Rússia em fevereiro de 2022, compartilhada por blogueiros militares e reiterada pela propaganda estatal, de tomar a capital Kiev “em três dias”
Atualmente, cerca de 18% do território ucraniano permanece sob ocupação russa, incluindo a península da Crimeia, anexada em março de 2014, e grande parte das regiões de Donetsk e Luhansk, no leste, que a Rússia tomou pouco depois.
Nos últimos dois anos, os aliados da Ucrânia enviaram uma grande quantidade de ajuda militar, financeira e humanitária ao país – sendo quase US$ 92 bilhões provenientes de instituições da União Europeia e US$ 73 bilhões dos EUA até janeiro de 2024, de acordo com o Instituto Kiel para a Economia Mundial.
Os tanques, as defesas aéreas e a artilharia de longo alcance fornecidos pelo Ocidente ajudaram substancialmente a Ucrânia.
Mas o fluxo de contribuições diminuiu nos últimos meses, em meio ao debate sobre por quanto tempo os aliados vão poder apoiar de forma realista a Ucrânia.
Nos EUA, um novo pacote de ajuda de US$ 60 bilhões está parado no Congresso devido a disputas políticas internas.
E existe ainda o receio entre os aliados da Ucrânia de que o apoio dos EUA vai diminuir se Donald Trump voltar à Casa Branca após as eleições presidenciais de novembro.
Na União Europeia, um pacote de ajuda de US$ 54 bilhões foi aprovado em fevereiro, após muita discussão e negociação, especialmente com a Hungria, cujo primeiro-ministro, Victor Orban, é um aliado de Putin que se opõe abertamente ao apoio à Ucrânia.
Além disso, a União Europeia está em vias de entregar apenas cerca de metade das munições de artilharia que pretendia fornecer a Kiev até o final de março de 2024.
Os países que apoiam a Rússia incluem seu vizinho Belarus, cujo território e espaço aéreo foi usado para acessar a Ucrânia.
O Irã vem fornecendo drones Shahed à Rússia, dizem os EUA e a União Europeia, embora o Irã apenas admita ter fornecido um pequeno número de drones à Rússia antes da guerra.
Os veículos aéreos não tripulados (Vant), mais conhecidos como drones, se revelaram eficazes para atingir alvos na Ucrânia – em uma guerra em que há uma demanda por drones de ambos os lados devido à sua capacidade de escapar das defesas aéreas.
As sanções não funcionaram tão bem quanto os países ocidentais esperavam, e a Rússia ainda consegue vender seu petróleo e obter peças e componentes para sua indústria militar.
Não acredita-se que a China esteja fornecendo armas a nenhum dos lados. De uma maneira geral, o país asiático adotou uma linha diplomática cuidadosa no que se refere a esta guerra: não condenou a invasão russa, mas tampouco apoiou Moscou militarmente — embora tenha continuado a comprar petróleo russo, assim como a Índia.
Tanto a Rússia quanto a Ucrânia também se empenharam bastante em cortejar países em desenvolvimento, incluindo uma série de visitas diplomáticas à África e à América Latina.
Acredita-se amplamente que o presidente russo, Vladimir Putin, ainda quer toda a Ucrânia.
Em entrevista recente ao apresentador de talk show americano Tucker Carlson, Putin – que não foi contestado – expôs mais uma vez sua visão distorcida da história e do conflito.
Ele argumenta há muito tempo, sem fornecer evidências sólidas, que os civis na Ucrânia – especialmente na região de Donbas, no leste – necessitam de proteção russa.
Antes da guerra, ele escreveu um longo artigo que negava a existência da Ucrânia como um Estado soberano, dizendo que russos e ucranianos eram “um só povo”.
Em dezembro de 2023, ele declarou que seus objetivos para o que a Rússia chama de “operação militar especial” permaneciam inalterados, incluindo a “desnazificação” – que se baseia em alegações infundadas sobre a influência da extrema direita.
Ele também diz que quer a “desmilitarização” e uma Ucrânia “neutra”, e continua a protestar contra a expansão da influência da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) para o leste.
Como um Estado independente, a Ucrânia nunca pertenceu a nenhuma aliança militar. Seus objetivos políticos incluíam a adesão à União Europeia, e o país estava em negociações para estreitar os laços com a Otan – ambas as perspectivas parecem agora mais próximas do que no início da guerra.
Estes objetivos procuravam fortalecer o Estado da Ucrânia e protegê-la de ser arrastada para qualquer projeto geopolítico que visa restaurar a União Soviética de alguma forma.
Dado que nenhum dos lados parece propenso a se render, e que Putin parece determinado a permanecer no poder, as previsões dos analistas tendem a crer em uma guerra prolongada.
O centro de pesquisa de segurança global Globsec combinou as opiniões de dezenas de especialistas para avaliar a probabilidade de diferentes desfechos.
O cenário mais provável é de uma guerra de atrito, também conhecida como guerra de exaustão, que se estenderia para além de 2025, com fortes baixas de ambos os lados, e a Ucrânia continuando a depender do fornecimento de armas de aliados.
O segundo cenário mais provável inclui potenciais escaladas de conflitos em outras partes do mundo, como no Oriente Médio, na China-Taiwan e nos Balcãs – com a Rússia tentando exacerbar as tensões.
Dois outros cenários em potencial, ambos considerados igualmente prováveis, seriam a Ucrânia realizar algum avanço militar, mas nenhum acordo ser alcançado para acabar com a guerra – ou a ajuda dos aliados da Ucrânia diminuir, e eles pressionarem o país a chegar a uma solução negociada.
Permanece a incerteza, no entanto, tanto sobre o potencial impacto das eleições presidenciais dos EUA, assim como sobre a forma como outras guerras, especialmente o conflito Israel-Hamas, vão afetar as prioridades e alianças dos apoiadores da Ucrânia e da Rússia.
Em meados de fevereiro, o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, advertiu que manter a Ucrânia num “déficit artificial” de armas ajudaria a Rússia.
Ele disse numa conferência de segurança internacional, em Munique, que Putin tornaria os próximos anos “catastróficos” para muitos outros países se o mundo ocidental não o enfrentasse.
O centro de pesquisa Royal United Services Institute (Rusi) afirma que a Rússia conseguiu fazer a transição da sua economia e indústria de defesa para ampliar a produção militar, e está se preparando para uma guerra longa. Diz ainda que a Europa não está acompanhando o ritmo — preocupação levantada também pelo ministro das Relações Exteriores da Polônia.
Países europeus — incluindo alertas feitos pelo ministro das Relações Exteriores da Alemanha e pelo serviço de inteligência da Estônia — manifestaram recentemente receio de que a Rússia possa atacar um país da Otan na próxima década.
Isso levou a Otan e a União Europeia a acelerar seu planejamento para o futuro, tanto em termos de capacidade militar como de preparação das sociedades para viver num mundo bem diferente.
Fonte: correiobraziliense
Utilizamos cookies próprios e de terceiros para o correto funcionamento e visualização do site pelo utilizador, bem como para a recolha de estatísticas sobre a sua utilização.