22 de Novembro de 2024

Por que muitos russos não veem alternativa a Putin nas próximas eleições


Em um salão de exposições em frente ao Kremlin, Vladimir Putin sobe ao palco.

Há aplausos arrebatadores, ele é ovacionado.

Sem surpresas. Os convidados, muitos deles celebridades russas, apoiam oficialmente a candidatura de Putin para a eleição presidencial de março.

O líder do Kremlin concorre a um quinto mandato. E o público aqui está bem satisfeito.

"(Putin) é um líder extraordinário, a pessoa mais corajosa e sábia", elogia o cineasta Andrei Konchalovsky.

"O povo russo nunca esteve tão unido em apoio ao seu presidente", afirma a cantora Nadezhda Babkina. "E qualquer um que tentar impedir isso vai falhar."

A ideia por trás do evento (e esse apoio de celebridades de alto perfil) parece ser mostrar que o candidato Putin está em uma liga própria: a Premier League do Putin.

Mas tenha em mente: esta é uma liga que ele criou e da qual está no comando. O sistema político da Rússia é o sistema político de Putin; suas regras do jogo, sua eleição. Os críticos mais vocais de Putin há muito tempo foram relegados. Estão no exílio ou na prisão.

O que torna as eleições aqui bastante previsíveis.

Nem sempre foi esse o caso.

Trinta anos atrás, em Moscou, lembro-me de assistir a um dos primeiros programas noturnos de resultados eleitorais da TV russa - era uma eleição parlamentar. Ninguém tinha ideia de quem ganharia.

Nunca esquecerei o astrólogo que fazia previsão política. Muito apropriado, na verdade, porque há três décadas os olhos dos russos brilhavam com democracia, liberdade e o futuro do país.

Para uma eleição russa hoje, você não precisa de astrólogos ou bolas de cristal. Posso dizer agora como a eleição presidencial de 2024 terminará: com a vitória esmagadora de Vladimir Putin.

As razões para tanta confiança?

Primeiro, embora o dele não seja o único nome na cédula, entre os concorrentes de Putin não estarão arqui-rivais como o líder da oposição Alexei Navalny, que teve sua morte anunciada na sexta-feira (16/02). Ele foi preso no fim do ano passado e cumpria uma sentença de 19 anos de prisão.

Outro crítico do Kremlin, Boris Nadezhdin, segue tentando estar na cédula de votação. Mas Nadezhdin não é Navalny. Ele calibra cuidadosamente suas críticas a Putin. Acredita-se também que ele tenha conexões dentro da administração presidencial.

Se ele acabar concorrendo, será porque o Kremlin decidiu que é do interesse de Putin enfrentar um concorrente mais crítico.

Em segundo lugar, na Rússia, o Kremlin controla a televisão. Putin recebe grandes quantidades de tempo de TV durante, em que é muito elogiado e raramente criticado: útil quando você está buscando a reeleição.

E há outro motivo pelo qual Putin vai se sair bem.

"Todos nós apoiamos sua decisão de concorrer à eleição. Porque você está no poder desde que consigo lembrar", disse Alexander, um jovem repórter de TV russo na coletiva de imprensa de fim de ano de Putin.

Eu conheci muitos russos como Alexander que não conseguem imaginar mais ninguém no Kremlin. Não porque eles idolatram o Putin. Mas porque simplesmente não veem alternativa.

Muitas vezes ouvi as pessoas dizerem: "Se não Putin, quem então?"

O Kremlin construiu isso. Limpou o cenário político removendo qualquer potencial concorrência ao homem que governou a Rússia, como presidente ou primeiro-ministro, por quase um quarto de século. Ao fazer isso, garantiu que a tal pergunta - "quem então?" - seja deixada sem resposta.

Quando falo com pessoas da cidade de Rzhev, a 225 km de Moscou, sobre suas esperanças para a eleição, muitos parecem querer mudanças, mas sem mudar o líder.

"Espero que as coisas mudem para melhor porque há estagnação agora", diz um jovem chamado Ilya. "Mas se você eleger alguém novo, essa pessoa pode não saber lidar com o fardo do governo. Alguém experiente como Putin pode desenvolver o país mesmo na situação difícil em que estamos agora."

"Tenho grandes esperanças para a eleição", diz o pensionista Lidiya. "Espero que a guerra acabe e a economia melhore. Mas eu respeito Putin."

"Não há mais ninguém que possa fazer o trabalho dele?" Eu pergunto.

"Agora não", responde Lidiya. "Talvez Putin encontre alguém mais tarde. Mas acho que ele permanecerá no poder por muito tempo ainda."

Mesmo a guerra na Ucrânia e as perdas militares russas significativas não parecem ter provocado uma desilusão generalizada com o presidente e comandante-em-chefe da Rússia.

Foi decisão de Putin lançar a invasão em grande escala. Mas alguns russos acreditam que, em um momento de guerra, é dever deles apoiar seu líder sem questionar os motivos ou consequências. Outros aceitam a narrativa oficial/realidade alternativa de que foi o Ocidente, e não a Rússia, que iniciou a guerra.

Encontro uma mulher em Rzhev que quer ver mudança no Kremlin. A ex-jornalista de TV e legisladora regional Yekaterina Duntsova recentemente tentou concorrer à presidência. Ela pedia paz na Ucrânia, libertação de prisioneiros políticos e uma Rússia "humana".

A Comissão Eleitoral Central da Rússia recusou-se a aceitar sua candidatura, citando erros em sua documentação.

"Acho que o sistema político aqui me vê como algum tipo de objeto alienígena e não sabe o que fazer comigo", disse Duntsova. "Como eu apareci do nada, o sistema não entende quem eu sou. Então decidiu me manter bem fora do caminho do perigo."

Agora ela está criando um novo partido. Ela não tem medo de que o sistema vá contra ela?

"Não estamos fazendo nada ilegal. Agimos de acordo com a lei. Quanto ao medo, ele não deve prevalecer. Eu acredito no que estou fazendo. E essa convicção relega o medo para o segundo lugar."

De volta ao evento de campanha de Putin, converso com Margarita Simonyan, editora-chefe da RT.

"Um líder no poder por um quarto de século e mais... sem freios e contrapesos. Isso não é perigoso?" Eu pergunto.

"Esse é um mantra que vocês propagam há anos", responde ela. "Se uma pessoa está no poder há muito tempo, isso não significa necessariamente que será pior do que se você trocar de líder a cada quatro anos. Pol Pot, no Camboja, aniquilou um terço de sua população em três anos."

Fonte: correiobraziliense

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