Milhares de pacientes na Inglaterra com suspeita de câncer de pulmão estão fazendo exames de sangue que podem revelar se conseguem um acesso precoce a tratamentos específicos.
O teste procura variações genéticas para auxiliar nas decisões dos médicos sobre tratamento.
Alguns tumores podem ser tratados com comprimidos, por exemplo, em vez da quimioterapia padrão, o que muitas vezes significa menos efeitos colaterais para o paciente.
Atualmente, a chamada biópsia líquida é usada em alguns países, o Brasil entre eles, apesar de a técnica ainda ser pouco difundida no sistema brasileiro.
Apesar de já ser utilizada para outros tipos de câncer, seu maior uso é em pacientes com câncer colorretal e câncer de pulmão, já que são essas as doenças com mais pesquisas que reforçam benefícios da técnica.
A paciente com câncer de pulmão britânica Kat Robinson, de 33 anos, teve a possibilidade de tomar comprimidos em casa em vez de receber tratamento no hospital, o que lhe deu mais tempo com a filha.
Kat diz que ouviu da equipe médica que ela tem pelo menos um ano de vida, mas talvez vários outros mais.
Ela está entre os 2 mil pacientes que já haviam feito o teste quando apresentaram sintomas de câncer.
A previsão do sistema de saúde do Reino unido é que outros 10 mil pacientes com suspeita de câncer de pulmão recebam a oferta do exame na Inglaterra durante o próximo ano.
Os sintomas de Kat começaram com uma dor de cabeça que não passava. Depois de duas semanas, sua irmã a convenceu a consultar um médico.
"Achei que fosse uma enxaqueca, mas meu médico da família disse que eu precisava ir ao hospital imediatamente. Fiz imediatamente uma ressonância magnética e uma tomografia computadorizada e, duas horas depois de entrar no hospital, eu estava conversando com um médico oncologista."
"Eles encontraram sete tumores no meu cérebro, que estavam causando minhas dores de cabeça, mas uma investigação mais aprofundada identificou que meu câncer primário estava no pulmão, onde tenho três tumores".
O câncer também se espalhou para os gânglios linfáticos e para o crânio de Kat.
Então ela fez um exame de sangue, também descrito como "biópsia líquida", que procura fragmentos de DNA que se separaram de tumores e estão na corrente sanguínea.
O chamado "DNA tumoral circulante" revelou que o crescimento do câncer de Kat estava sendo impulsionado por uma mutação no gene ALK.
Embora incomum, a mutação é frequentemente observada em pacientes mais jovens com "câncer de pulmão de células não pequenas" que, como Kat, não são fumantes.
Isso significava que o melhor tratamento para ela era um medicamento específico chamado brigatinibe.
"Eles estavam me preparando para a radioterapia e depois para a quimioterapia, mas, em vez disso, consegui tomar este comprimido diário."
Fora náusea, ela diz que teve poucos efeitos colaterais.
Kat, que é da região de Dorset, na Inglaterra, decidiu ser completamente transparente com sua filha Paige, de 11 anos, sobre seu câncer: "Conversamos sobre praticamente tudo".
Paige conta que antes do diagnóstico sua mãe estava muito focada no trabalho de contadora, mas agora ela sempre tem tempo para a filha.
"Isso me ensinou que a família é tudo o que importa. Aprendi a preparar muitas refeições e estamos tentando construir o máximo de memórias que pudermos."
Kat diz que quando a medicação parar de funcionar, os médicos disseram que há outro medicamento específico que ela pode tomar antes de precisar de radioterapia e quimioterapia.
A família criou uma página de vaquinha virtual para juntar 10 mil libras (cerca de R$ 62 mil) para que Kat possa levar sua filha à Disney, na Flórida (EUA).
O Brigatinibe tem um preço de tabela de mais de 5 mil libras (R$ 30 mil) por mês na Inglaterra, mas o NHS (sistema de saúde público britânico) negociou um desconto confidencial com a fabricante, a farmacêutica Takeda.
No projeto em vigor na Inglaterra, os exames de sangue de pacientes de todo o país serão analisados ??em um laboratório do Royal Marsden Hospital em Surrey, com o objetivo de ter resultados em 14 dias.
O professor Sanjay Popat, oncologista clínico consultor do Marsden, diz que o uso do exame de sangue é uma "ideia excelente" e permite que os pacientes tenham acesso mais rápido ao tratamento correto para o câncer.
Ele diz que o brigatinibe é um dos oito tratamentos direcionados para o câncer de pulmão de células não pequenas, que é responsável por pelo menos 80% dos casos de câncer de pulmão. Todos esses medicamentos são comprimidos que podem ser tomados em casa pelos pacientes.
"Esses comprimidos são altamente eficazes e seu perfil em termos de efeitos colaterais é muito bom. Em contraste, a quimioterapia é dura - deixa as pessoas cansadas e pode causar náuseas e queda de cabelo".
Ele diz que as perspectivas de longo prazo para os pacientes estão melhorando.
"Na época dos medicamentos pré-direcionados, os pacientes com câncer de pulmão de células não pequenas generalizado tinham uma sobrevivência média de cerca de um ano ou até menos. Agora vemos a sobrevivência medida em anos."
O professor Popat diz que o uso de exames de sangue, ou "biópsias líquidas", provavelmente se estenderá ao câncer de mama e ao câncer em crianças.
Peter Johnson, Diretor Clínico Nacional para o Câncer do NHS England, afirma que "o NHS mostrou que pode liderar o caminho na inovação no diagnóstico e tratamento do câncer, e este piloto é outro exemplo do nosso compromisso em fornecer aos pacientes tratamentos e terapias de ponta para melhorar os resultados, dando às pessoas que enfrentam o câncer de pulmão mais tempo precioso com os seus entes queridos".
De acordo com os especialistas entrevistados pela BBC News Brasil, a técnica pode oferecer muito mais no futuro.
Por meio da biópsia líquida, o mesmo sangue que tiramos para checar doses de glicemia e colesterol, de acordo com os médicos, deve nos indicar, nos próximos anos, se estamos com células cancerosas muito antes de um tumor aparecer — além de oferecer informações bem específicas sobre o tipo do câncer.
Isso possibilitaria uma intervenção precoce, o que para muitos cânceres é o principal fator determinante no sucesso do tratamento.
Leia nesta reportagem os principais pontos negativos da biópsia líquida, o que o exame já oferece em termos de vantagens para os pacientes e o que podemos esperar do futuro.
Fonte: correiobraziliense
Utilizamos cookies próprios e de terceiros para o correto funcionamento e visualização do site pelo utilizador, bem como para a recolha de estatísticas sobre a sua utilização.