A expectativa em relação ao eclipse previsto para esta segunda-feira (8/4) está aumentando. Milhões de pessoas na América do Norte esperam passar cerca de quatro minutos na escuridão total, enquanto a Lua bloqueia a luz do Sol.
O fenômeno não será visível no Brasil, no entanto.
Para alguns pesquisadores, estes minutos preciosos vão ser uma oportunidade de realizar experimentos científicos muitas vezes impossíveis — uma chance de desvendar os segredos do Universo.
Os cientistas vão lançar foguetes durante o eclipse, observar animais em zoológicos, enviar sinais de rádio ao redor do mundo e dar uma espiada no espaço com câmeras poderosas.
E você não precisa ser cientista para participar.
Mas tudo isso pode dar errado. Uma explosão solar ou até mesmo algumas meras nuvens podem interferir na programação.
Adam Hartstone-Rose, professor da Universidade Estadual da Carolina do Norte, nos EUA, vai passar esta segunda-feira no zoológico de Fort Worth, no Texas.
Ele vai observar eventuais comportamentos estranhos nos animais, como gorilas, girafas e tartarugas de Galápagos. Alerta de spoiler: durante o eclipse de 2017, as tartarugas começaram de repente a se acasalar.
"À medida que (o eclipse) se aproximava da totalidade, elas ficavam cada vez mais ativas", ele recorda.
"No auge do eclipse, elas começaram a se acasalar, o que não conseguimos explicar. Talvez tenha sido um evento único. Vamos observar mais tartarugas desta vez."
Mas o fato é que muitos animais parecem ter reações de ansiedade à escuridão repentina.
“Os flamingos da última vez fizeram uma coisa linda”, diz ele.
“À medida que o eclipse se desenvolvia, os adultos reuniram os filhotes no meio do bando, e olharam para o céu como se estivessem preocupados com a queda de um predador aéreo.”
Mas "as girafas foram as minhas favoritas", relembra Hartstone-Rose.
"Alguém havia dito que girafas selvagens começaram a galopar durante um eclipse total na África. Eu estava bastante cético porque as girafas são animais muito passivos. Mas, apesar do meu ceticismo, algumas delas começaram a correr."
Já os gorilas se dirigiram para o local onde dormem, e deram início ao seu ritual de sono, à medida que seus ritmos circadianos eram afetados.
Um pássaro noturno chamado Tawny Frogmouth acordou onde geralmente se camufla como um toco de árvore podre. Começou a procurar comida e, de repente, voltou a se camuflar, quando o Sol reapareceu.
Qualquer pessoa pode participar do experimento. Se você vir animais de estimação, animais de fazenda ou animais selvagens se comportando de maneira incomum durante o eclipse, basta informar à equipe dele online.
"Existe muito pouca informação sobre o que os animais que vivem em fazendas fazem", explica Hartstone-Rose.
"Será que as vacas vão em direção ao celeiro durante o auge do eclipse? Os galos não deveriam cantar em algum momento durante o fenômeno?"
A equipe vai ter resultados quase instantâneos — e pretende publicar suas descobertas nos dias seguintes ao eclipse.
Mas Hartstone-Rose não é o único que vai estudar o comportamento dos animais durante o fenômeno desta segunda-feira.
Trae Winter é um dos fundadores do Laboratório de Pesquisas Avançadas sobre Inclusão e Acessibilidade na Ciência, Tecnologia, Engenharia, Arte e Matemática (Arisa, na sigla em inglês), em Massachusetts, nos Estados Unidos.
Ele vai liderar o projeto Paisagens Sonoras do Eclipse, da Nasa, que vai usar audiomoths — pequenos dispositivos do tamanho de celulares equipados com microfones — para ouvir os sons de animais próximos.
Centenas de voluntários vão instalar os aparelhos durante o fenômeno. Isso vai permitir a Winter e sua equipe ouvir como os diferentes animais reagem à redução da luz no auge do eclipse, e à consequente queda de temperatura de cerca de 5,5 °C verificada.
"Os animais reagem às mudanças da luz, às vezes de maneira muito forte, e também às alterações de temperatura", explica Winter.
"É uma experiência multissensorial."
Diversos animais vão ser estudados, desde grilos até seres humanos.
"Estou ansioso para ouvir seres humanos presenciando um eclipse pela primeira vez, e os sons de emoção que eles vão fazer."
Hartstone-Rose também está interessado nesta observação.
"O comportamento animal mais estranho que observamos em 2017 foi o das pessoas à nossa volta", relembra.
"Elas começaram a berrar, gritar, a se deitar no chão."
Quando a escuridão cair sobre partes da América do Norte, uma parte do Sol que as pessoas vêm tentando estudar há séculos — sua atmosfera ou coroa — vai ficar visível.
Esta parte misteriosa do Sol é composta de plasma magnetizado e tem uma temperatura de mais de um milhão de graus Celsius.
Normalmente, o brilho intenso do Sol torna impossível ver a coroa, mas nesta segunda-feira cientistas em Dallas, no Texas, vão ser capazes de apontar seus instrumentos para ela e capturar imagens.
Cientistas da Universidade de Aberystwyth, no País de Gales, e da Nasa, a agência espacial americana, esperam obter informações sobre o vento solar, que é o plasma lançado da superfície do Sol. Outro enigma é por que a coroa parece ser muito mais quente do que a superfície do Sol, apesar de ser uma camada externa.
Pode ser que eles conseguiam ver até o que é chamado de ejeção de massa coronal, quando nuvens enormes de plasma são lançadas da atmosfera para o espaço. As ejeções podem causar interferências nos satélites que usamos na Terra.
Uma grande quantidade de dinheiro, tempo e logística foram investidos nesta janela de quatro minutos, diz Huw Morgan, professor de física na Universidade de Aberystwyth.
“É uma verdadeira euforia quando dá certo, porque você se preparou por tanto tempo. Mas se houver uma nuvem, vai ser um desastre. E não há nada que possamos fazer a respeito”, acrescenta.
A atividade do Sol pode interferir em quase todas as nossas comunicações, incluindo as transmissões de rádio de onda longa.
A energia do Sol carrega uma região na parte superior da atmosfera chamada ionosfera, o que ajuda as transmissões de rádio a circular pelo planeta. Mas quando a Lua bloqueia o Sol, a ionosfera é afetada.
Para testar o que isso faz com o rádio, centenas de operadores de rádio amadores vão participar de uma verdadeira festa de audição e enviar sinais uns aos outros ao redor do mundo, competindo pelo maior número de conexões. Eles podem se comunicar em código Morse ou até mesmo falando.
Os resultados podem ajudar os cientistas a entender melhor as comunicações de rádio utilizadas por equipes de resgate, aviões e embarcações, assim como o GPS, de acordo com Nathaniel Frissell, da Universidade de Scranton, na Pensilvânia, nos EUA, que está organizando a "festa".
Thomas Pisano, aluno de engenharia elétrica de Frissell, planeja participar da competição. De uma mesa com equipamento de rádio, ele vai enviar sinais e tentar se conectar com o maior número possível de operadores em todo o mundo.
“Há um forte senso de comunidade”, diz ele.
"Estamos todos muito empolgados em obter esses dados."
A maioria das comunicações é formal — informando nome e local da estação —, mas cada uma é encerrada com “73”, um código para votos de felicidades.
“É a nossa maneira radiofônica de nos despedirmos e dizer 'se cuida'”, explica.
Embora o eclipse quase não seja visível no Reino Unido, operadores de rádio de todo o país vão sintonizar as mensagens enviadas do outro lado do Atlântico. A operadora de rádio Gwyn Griffiths planeja tanto enviar quanto receber sinais de ondas longas pelo oceano para avaliar quão longe elas viajam.
Enquanto isso, Aroh Barjatya, da Universidade Aeronáutica Embry Riddle, na Flórida, vai estar na Unidade de Voo Wallops da Nasa, na Virgínia, a centenas de quilômetros da totalidade do fenômeno.
Ele vai estar ocupado com um experimento totalmente único — conhecido como Perturbações Atmosféricas ao longo do Trajeto do Eclipse (Apep, na sigla em inglês) — que vai lançar na atmosfera três foguetes com 18 metros de altura, chamados foguetes de sondagem. A intenção é monitorar alterações na atmosfera do planeta no momento do eclipse.
"Meu lado profissional está muito animado", conta Barjatya. "Meu lado pessoal está um pouco triste por perder a totalidade (do eclipse)."
Mas o retorno científico do experimento deve aliviar parte da decepção de Barjatya.
Cada foguete será lançado a uma altitude de cerca de 420 km antes de cair de volta na Terra. Um deles será lançado 45 minutos antes do auge do eclipse, outro durante o fenômeno, e um terceiro, 45 minutos depois.
Os instrumentos a bordo vão medir as partículas carregadas e os campos elétricos e magnéticos da ionosfera, camada da atmosfera terrestre que se estende entre 100 km e 1 mil km acima da superfície do planeta — e como reagem em resposta ao eclipse.
Flutuações na ionosfera fora do contexto de um eclipse podem afetar as comunicações via satélite, de forma que o eclipse oferece uma rara oportunidade de estudar essas alterações com mais detalhes.
À medida que a sombra da Lua passar, a expectativa é de que a densidade da ionosfera diminua, reagindo em ondas à passagem da sombra.
"É como um barco a motor em um lago", explica Barjatya.
Voar a essa altitude permite realizar medições muito mais precisas da ionosfera durante o eclipse do que a partir do solo.
"As observações terrestres têm resolução muito alta, pelo menos de um ou dois quilômetros", afirma Barjatya.
"Os foguetes nos ajudam a observar em resolução de menos de um metro, às vezes de menos de um centímetro. Assim, você consegue observar o menor nível possível de flutuações, que geram interrupções nas frequências de rádio."
Além disso, a Nasa vai pilotar jatos WB-57 ao longo da trajetória do eclipse para tirar fotos a 15.240 metros acima da Terra.
Voar acima das nuvens significa que não há chance de perderem o eclipse. E as câmeras dos jatos devem tirar fotos mais nítidas porque vão capturar comprimentos de onda que normalmente não chegam até a Terra.
Além de detectar novos detalhes na coroa solar, a Nasa vai ser capaz de estudar um anel de poeira ao redor do Sol — e procurar asteroides orbitando possivelmente nas proximidades.
Um instrumento a bordo das aeronaves, chamado espectrômetro, vai ajudá-los a aprender mais sobre as rajadas de matéria solar que são lançadas do Sol.
Os jatos também vão ganhar tempo no eclipse.
Eles viajam a 740 km/h e vão passar mais de 6 minutos e 22 segundos na sombra da Lua — quase dois minutos a mais do que nós, meros humanos na Terra, que vamos passar apenas quatro minutos e meio em solo, se tivermos sorte.
E, se não bastassem aviões e foguetes, Angela Des Jardins, da Universidade Estadual de Montana, nos EUA, vai liderar 53 equipes de estudantes espalhados pelo país que vão lançar cerca de 600 balões na atmosfera, como parte do Projeto Nacional de Balões do Eclipse.
Subindo até 35 km de altura, os balões vão utilizar instrumentos para observar como a atmosfera e o clima da Terra reagem às alterações das condições atmosféricas causadas pelo eclipse.
Alguns dos instrumentos vão estudar as ondas gravitacionais — ondas de pressão que se movem pela atmosfera como resultado das mudanças de temperatura.
"É como uma pedra atirada em um lago, criando ondas", explica Des Jardins.
Outros instrumentos vão medir a umidade, a direção e a velocidade dos ventos, para acompanhar eventuais alterações causadas pelo eclipse.
"Ter 600 balões voando e medindo a atmosfera é uma fonte de dados rica e maravilhosa", afirma Des Jardins.
"Esperamos que sejam publicados pelo menos uma dúzia de artigos como resultado dos dados que vamos coletar."
Haverá até algumas câmeras a bordo dos balões, que vão transmitir o eclipse ao vivo.
Um determinado local da Terra observa um eclipse solar, em média, apenas uma vez a cada 375 anos. Isso significa que não só muita gente vai observar o eclipse, como também vai fotografar este evento histórico.
Laura Peticolas, da Universidade Estadual de Sonoma, na Califórnia, convida as pessoas que fotografarem o eclipse a participar do seu projeto Eclipse Megamovie, que vai tentar reunir centenas de imagens de observadores em um único filme do eclipse.
Peticolas desenvolveu o mesmo projeto em 2017, mas observou que "não ficou tão bonito quanto tínhamos em mente", por falta de imagens.
Por isso, desta vez, ela espera obter um volume de registros muito maior, incluindo imagens profissionais do eclipse, de melhor qualidade, para gerar um produto mais elaborado.
A expectativa é de que o megamovie revele detalhes da coroa solar, como jatos de plasma sendo disparados em volta da Lua, evoluindo à medida que diferentes pessoas fizerem imagens ao longo da sua trajetória.
"Desta vez, esperamos realmente poder ver esses jatos e detalhes em movimento", afirma.
Normalmente, é extremamente difícil estudar esses eventos, exceto a partir de telescópios especialmente projetados ou espaçonaves capazes de bloquear o Sol. Mas um eclipse solar total permite que mais observadores façam isso.
Este fenômeno deve ser particularmente notável, já que o Sol está caminhando para seu período de maior atividade, conhecido como máximo solar — que acontece em ciclos de 11 anos, por razões que ainda não conhecemos totalmente.
Podemos dizer que o eclipse solar total de 2017 nos Estados Unidos despertou o interesse do público e dos cientistas. E a expectativa é de que o eclipse de 2024 seja acompanhado e estudado por muito mais gente, devido à extensão de terra que ele vai cobrir e ao conhecimento sobre o que podemos esperar desta vez.
"Acho que as pessoas estão mais animadas com este evento", afirma Hartstone-Rose.
"O de 2017 foi inesperadamente bacana. O de 2024 vai acontecer sobre uma parte mais povoada da América, e será até mais bonito, já que o Sol está nesse incrível ciclo de ejeção. A coroa realmente vai estar fantástica."
Fonte: correiobraziliense
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