23 de Novembro de 2024

Estudo investiga níveis de produtos químicos não degradáveis na água


Substâncias de per e polifluoroalquílicas, são chamadas de "eternas" ou de PFAs. Elas constituem um conjunto de mais de 14 mil produtos químicos sintéticos cuja popularidade remonta à década de 1950, devido às propriedades de resistência ao calor, água, gordura e manchas. Esses compostos estão presentes em itens domésticos, como panelas antiaderentes, vestuário, cosméticos, pesticidas e embalagens de alimentos, além de serem empregados em espumas de combate a incêndios. Apesar de suas vantagens, os PFAs têm um lado negativo: uma vez introduzidos no ambiente ou no organismo, não se degradam.

Os riscos associados aos PFAs incluem problemas ambientais e de saúde, como certos tipos de câncer, embora a extensão desses impactos ainda não seja completamente compreendida, incluindo sua presença no abastecimento hídrico ao redor do mundo. Um novo estudo internacional, liderado pela University of New South Wales (UNSW), na Austrália, e publicado na revista Nature Geoscience, investigou os níveis de contaminação por substâncias eternas em águas superficiais e subterrâneas, revelando que muitas fontes ultrapassam os limites seguros desses compostos.

"Descobrimos que muitas de nossas fontes de água excedem os limites regulatórios para os PFAS. Estamos falando de uma porcentagem superior a 5%, e, em alguns casos, ultrapassando 50%", alertou, em nota, Denis O'Carroll, autor sênior do estudo e professor de engenharia da UNSW.

O trabalho incluiu dados de contaminação por PFAs em todo o mundo ao longo de aproximadamente 20 anos. Segundo os autores, é o primeiro estudo a quantificar esse problema de forma global. Também foram identificadas concentrações elevadas dos químicos na Austrália, especialmente em áreas onde espumas de combate a incêndios foram muito utilizadas, como áreas militares e de treinamento.

Marianna Brandão, professora de química do Colégio Everest, em Brasília, frisa que ao abordar a natureza persistente dos PFAs, fala-se sobre substâncias que não existiam naturalmente. "Quando ela foi produzida, foi observada uma alta estabilidade do composto todo. Ser muito estável é um sinal de que a degradação é complexa. Os PFAs, assim como outros filmes, têm características poliméricas, então são moléculas grandes que não se degradam por sua alta estabilidade."

A química reforça que a data de criação do PFA, 1950, se encontra com o período pós-segunda guerra, quando foram descobertos muitos polímeros distintos. "Não só o PFA, mas muitas coisas de plástico que utilizamos hoje foram criadas nesse período. Depois, descobrimos que é difícil a degradação desses compostos, que também causam prejuízos e se alojam no corpo, como estamos observando agora com essa problematização do PFA. PFA é uma coisa que está em alta, mas já existiram outras estruturas, outras substâncias poliméricas, sintéticas, criadas em laboratório, com comportamento similar."

O'Carroll enfatizou que esses vestígios de PFAs são localizados em fontes de água, como represas, e não necessariamente na água potável final, que geralmente passa por tratamento para reduzir a presença dos contaminantes. No entanto, ele frisou a falta de monitoramento abrangente das substâncias em muitos sistemas de abastecimento.

Embora a compreensão dos efeitos à saúde ainda seja incompleta, muitas autoridades regulatórias impõem restrições ao uso desses compostos e procuram estabelecer limites para sua presença na água potável como medida de precaução. O trabalho enfatiza a importância de uma abordagem mais abrangente para monitorar e regular as substâncias em decorrência da poluição causada e a persistência de muitas delas no ambiente.

O estudo abordou as quantidades aceitáveis de químicos na água potável, ressaltando diferenças entre países quanto aos padrões estabelecidos.

Em 2023, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou o PFOA, um tipo de PFA, um carcinógeno humano de categoria 1. Embora os PFAs tenham sido associados a muitos tumores, não foi demonstrado que eles os causam. No entanto, pelos riscos potenciais e a característica "eterna" desses produtos, muitos órgãos reguladores restringiram seu uso e impuseram limites para água potável ser considerada segura.

Nos Estados Unidos, os limites para água potável de PFOS e PFOA são de quatro nanogramas por litro. Na Austrália a soma de PFOA e PFAs é limitada a 70 nanogramas a cada mil mililitros. Os autores sublinharam a importância do cuidado por parte dos fabricantes e dos consumidores ao lidar com produtos que contêm essas substâncias, incentivando uma avaliação completa dos impactos na saúde antes de sua utilização indiscriminada.

Ramon Andrade, professor de química do colégio Objetivo, no Distrito Federal, explica que, por se tratar de polímeros, a remoção da água é bastante complexa. "Diversos mecanismos ainda precisam ser compreendidos para, assim, elaborar estratégias para a eliminação deste. Hoje há uma linha de pesquisa nos EUA onde trabalham com uma nova bactéria que degrada polímeros, mas, no Brasil, as metodologias têm sido de detecção e redução do consumo de produtos com PFAs"

Para o especialista, as abordagens mais promissoras são reações orgânicas que degradam os compostos. "Porém, outro problema surge dessa maneira, os subprodutos do processo. E, por fim, microrganismos capazes de degradar os produtos das reações com PFAs, o que diminui a ecotoxicidade do material no meio ambiente."

Um estudo conduzido por pesquisadores do Departamento de Ciência Ambiental da Universidade de Estocolmo, na Suécia, e publicado na Science Advances, recentemente, revelou que os PFAs estão sendo reemitidos no ar a partir da rebentação das ondas oceânicas em níveis comparáveis ou superiores a outras fontes, estabelecendo assim um ciclo de transporte desses produtos ‘eternos’ entre a terra e o mar. Ian Cousins, professor do Departamento de Ciência Ambiental e coautor do estudo, enfatizou que, embora a crença comum seja de que os PFAs saiam da terra para os oceanos e permaneçam lá diluídos por décadas, experimentos de campo no Oceano Atlântico mostraram concentrações da substância no ar ultrapassando em mais de 100 mil vezes as concentrações de água do mar. O que levanta preocupações sobre os impactos na saúde, especialmente nas regiões costeiras, onde o estudo prevê o maior impacto.

Fonte: correiobraziliense

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