23 de Novembro de 2024

Mudanças na forma de plantio colocam animais e plantas em risco


A biodiversidade global pode ter diminuído entre 2% e 11% ao longo do século 20, devido, principalmente, às mudanças no uso da terra. É o que aponta um grande estudo publicado na Science. O trabalho, liderado pelo Centro Alemão de Pesquisa Integrativa da Biodiversidade (iDiv) e pela Universidade Martin Luther Halle-Wittenberg (MLU), aponta a mudança climática como a maior ameaça deste século para a fauna e a flora.

Para a pesquisa, a equipe comparou 13 modelos para avaliar o impacto das modificações na utilização da terra e das alterações climáticas em várias métricas de biodiversidade.

"O objetivo dos cenários de longo prazo não é prever o que vai acontecer", afirmou, em nota, a coautora Inês Martins, da Universidade de York, no Reino Unido. "Em vez disso, trata-se de compreender as alternativas e, portanto, evitar essas trajetórias, que podem ser menos desejáveis, e selecionar aquelas que têm resultados positivos. As trajetórias dependem das políticas que escolhemos e essas decisões são tomadas dia após dia."

O estudo revela ainda um aumento expressivo nos serviços ecossistêmicos, tal qual produção de alimentos e madeira, ao longo do último século. No entanto, a regulação dessas atividades, como polinização e sequestro de carbono, diminuiu de maneira moderada.

Projeções para o futuro indicam que as mudanças climáticas se tornarão um fator predominante na perda de biodiversidade no século 21, colocando uma pressão adicional sobre a variedade da fauna e da flora ao redor do mundo e nos serviços ecossistêmicos. Mesmo os cenários mais sustentáveis avaliados no estudo não implementam todas as políticas necessárias para proteger a biodiversidade, destacando a necessidade de esforços renovados para lidar com esse desafio global.

Reuber Brandão, membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN) e professor de Manejo da Fauna e Áreas Silvestres da Universidade de Brasília (UnB) alerta que medidas para minimizar impactos das mudanças climáticas já deveriam ser praticadas, como a recuperação de áreas degradadas. "Temos vastas regiões degradadas em todos os locais do planeta. Essas áreas podem ser recuperadas e voltar a acumular carbono com o crescimento da vegetação, e gerar serviços ecossistêmicos com o retorno da biodiversidade. Além de ajudar a incorporar mais água no solo.

Para o especialista, há uma tensão crescente sobre espécies e ecossistemas mais sensíveis. "No passado, o clima na Terra mudou várias vezes. Durante esse processo era possível que organismos migrassem de uma região que perdeu a qualidade climática, para outra melhor. Atualmente, isso é impossível, principalmente pela perda de habitat. Animais e sementes não conseguem mais sair de uma região para outras."

As modelagens utilizadas pelos cientistas não apenas fornecem uma compreensão abrangente das tendências da biodiversidade, mas ajudam a identificar políticas eficazes para proteger o meio ambiente.

Karina Lima, doutoranda em climatologia e divulgadora científica, ressalta que a crise climática é uma questão transversal que atravessa todas as outras áreas, incluindo, sobretudo, saúde, economia, segurança alimentar, além da biodiversidade. "Cada décimo de grau a mais no aquecimento global nos empurra para novos problemas. Limitar o aquecimento conforme a meta do Acordo de Paris não elimina os riscos. Trata-se de conter os impactos o máximo possível."

"Ao incluir todas as regiões do mundo no nosso modelo, conseguimos preencher muitos pontos cegos e responder às críticas de outras abordagens que trabalham com dados fragmentados e potencialmente tendenciosos", reforçou o autor principal, Henrique Pereira, chefe do grupo de investigação do iDiv e MLU. "Toda abordagem tem seus altos e baixos. Acreditamos que nossa abordagem de modelagem fornece a estimativa mais abrangente das tendências da biodiversidade em todo o mundo", acrescentou. 

Marcia Marques, membro da RECN e professora de Ecologia e Conservação da Universidade Federal do Paraná (UFPR), pondera que os esforços para reverter perdas de biodiversidade poderão ser inúteis se o aquecimento não for controlado. Precisamos pensar na perda da biodiversidade associada ao aquecimento global, essas duas questões caminham lado a lado. Mesmo se pensarmos em políticas de adaptação, a medida que teria maiores efeitos, de forma imediata, é a redução das emissões de gases do efeito estufa."

Serviços ecossistêmicos são benefícios diretos e indiretos que os ecossistemas fornecem aos seres humanos e a outros organismos.

"Vários estudos têm apontado uma preocupante tendência de perda de biodiversidade no planeta. São várias causas, mas a mudança do clima tem um peso importante, especialmente em alguns grupos e regiões. Os corais, por exemplo, têm sido bastante impactados pelo aumento da temperatura dos oceanos, que resulta no seu branqueamento e aumento de mortalidade. No Brasil, a associação entre a conversão dos habitats e os efeitos das mudanças climáticas têm impactado a fauna e a flora de forma cada vez mais intensa. Exemplos não faltam, como as queimadas completamente fora de controle em Roraima no início do ano e o episódio de mortalidade dos botos da Amazônia, no ano passado, quando o bioma passou por sua pior seca dos últimos 120 anos."

Mariana Napolitano, gerente de Estratégia do WWF-Brasil

Uma meta-análise global de 186 estudos, revelou que iniciativas de conservação têm impactos positivos significativos na biodiversidade, porém insuficientes, especialmente medidas direcionadas a espécies e ecossistemas. Conforme a pesquisa, liderada pela Arizona State University, nos Estados Unidos, embora bilhões de dólares sejam investidos anualmente em ações para combater a degradação do meio ambiente, muitas metas internacionais ainda não foram alcançadas.

Os resultados do ensaio, publicados, ontem, na revista Science, destacam a necessidade de uma avaliação criteriosa das políticas de conservação e de uma análise sobre como essas intervenções contribuem para os objetivos em comparação a cenários sem intervenção. A meta-análise liderada por Penny Langhammer e sua equipe mostrou que em cerca de dois terços dos casos, as iniciativas de conservação tiveram um efeito líquido positivo, melhorando ou pelo menos retardando o declínio da biodiversidade.

Especificamente, as intervenções direcionadas a espécies e ecossistemas, como controle de animais invasores, restauração de habitat e gestão sustentável, foram identificadas como as mais eficazes, com impactos significativos.

Porém, os pesquisadores ressaltam que, apesar do sucesso observado, é crucial ampliar substancialmente os esforços de conservação para reverter a crise global da biodiversidade, o que exigirá investimentos significativos em diversos setores da sociedade, além do tradicional setor de conservação.

 

Fonte: correiobraziliense

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