Lisboa — Chamado de caipira pelo presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, em jantar com jornalistas estrangeiros, o primeiro-ministro, Luís Montenegro, descartou, por meio de nota, qualquer possibilidade de o país assumir custos para compensar as ex-colônias pela exploração excessiva, pela escravidão e por outros crimes cometidos durante o período colonial. “A propósito da questão da reparação a esses Estados e aos seus povos pelo passado colonial do Estado português, importa sublinhar que o Governo atual se pauta pela mesma linha dos Governos anteriores. Não esteve e não está em causa nenhum processo ou programa de ações específicas com esse propósito”, destacou no documento divulgado ontem.
Na mesma nota, o governo português ressaltou que o país tem feito gestos e lançado programas de “cooperação de reconhecimento da verdade histórica com isenção e imparcialidade". Assinalou, ainda, que a linha a ser seguida é a de sempre, ou seja, “o aprofundamento das relações mútuas, o respeito pela verdade histórica e a cooperação cada vez mais intensa e estreita” para a “reconciliação de povos irmãos”. Quando falou em reparação pelos crimes cometidos nas ex-colônias, o presidente de Portugal não especificou prazos nem como se daria o processo. Ele foi duramente criticado pelos partidos de direita por conta dessas declarações.
Neste domingo, Luís Montenegro, não quis se pronunciar sobre o tema da reparação pelo passado colonial português. Ele ressaltou que o que tinha para ser dito estava na nota divulgada na véspera pelo governo. O primeiro-ministro também afirmou que ouviu “com muita normalidade e tranquilidade” as palavras proferidas a seu respeito por Rebelo de Sousa no jantar com correspondentes estrangeiros. “Ele (Montenegro) é uma pessoa que vem de um país profundo, urbano-rural, com comportamentos rurais”, disse o presidente. “Além disso, é imprevisível e dá muito trabalho”, complementou o presidente.
Durante a conversa com os jornalistas estrangeiros, na terça-feira (23/04), Marcelo Rebelo de Sousa ressaltou que Portugal deve assumir “total responsabilidade” pelos erros cometidos durante o período colonialista — países africanos como Angola, Moçambique e Guiné-Bissau só conseguiram a independência nos anos de 1970. “Temos de pagar os custos. Há ações que não foram punidas e os responsáveis não foram presos? Há bens que foram saqueados e não devolvidos? Vamos ver como podemos reparar isso”, assinalou.
No caso específico da escravidão, estima-se que Portugal tenha traficado mais de 6 milhões de africanos ao longo quase quatro séculos, a maioria, para o Brasil. Os escravizados foram submetidos a todo tipo de tortura e explorados em lavouras e em minas de ouro.
As declarações de Rebelo de Sousa surpreendem, porque Portugal sempre se negou a tratar desse tema, de compensação pela exploração colonial e pelo sequestro e escravidão de africanos. Inclusive, a população portuguesa, em sua maioria, não admite que houve abusos durante esse período. Nos livros de história usados nas escolas, Portugal é apresentado sempre como um desbravador, que muitos avanços trouxe para a civilização. O passado escravagista simplesmente é ignorado, uma posição racista, segundo os especialistas.
Na avaliação de Rebelo de Sousa, mais do que pedir desculpas por todas as atrocidades cometidas por Portugal, é fundamental assumir as responsabilidades e compensar pelos crimes cometidos. “Pedir desculpas é mais fácil”, enfatizou Em Portugal, o racismo e a xenofobia em relação aos estrangeiros, a maioria, de ex-colônias, vêm crescendo assustadoramente, impulsionados pela extrema-direita, que endeusa o período colonialista, com Portugal como potência mundial.
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