23 de Novembro de 2024

Guerra na Faixa de Gaza: Joe Biden oscila entre a cruz e a espada


A 187 dias das eleições, um presidente cada vez mais acuado e indeciso entre condenar a guerra em Gaza e expressar apoio a um aliado histórico rompeu o silêncio sobre os protestos pró-Palestina que se espalham pelos Estados Unidos. Antes de embarcar para a Carolina do Norte, o democrata Joe Biden afirmou que as manifestações em várias universidades colocam à prova dois princípios fundamentais no país: o direito à liberdade de expressão e o Estado de direito. "Ambos devem ser mantidos. Não somos um país autoritário que silencia as pessoas ou sufoca as diferenças. O povo norte-americano é ouvido", declarou. "Protestos pacíficos são a melhor tradição de como os americanos respondem a questões consequentes. Mas, também, não somos um país sem lei", acrescentou, enquanto a polícia de Los Angeles desmontava um acampamento erguido por manifestantes contrários à guerra na Faixa de Gaza, no câmpus da Universidade da Califórnia (Ucla). Pelo menos 200 estudantes e funcionários foram presos. 

Desde 17 de abril, manifestações do tipo se espalharam por cerca de 30 universidades dos Estados Unidos. A repressão policial levou mais de 2 mil manifestantes à prisão. Biden ecoou o discurso de republicanos, ao associar os protestos ao ódio contra Israel. "Não deveria haver lugar em nenhum câmpus ou em qualquer lugar dos Estados Unidos para o antissemitismo ou ameaças de violência contra estudantes judeus", declarou o presidente. "Não há lugar para discursos de ódio ou qualquer tipo de violência, seja antissemitismo, islamofobia ou discriminação contra árabes-americanos ou palestinos-americanos."

Joe Biden: "Não somos um país autoritário que silencia as pessoas ou sufoca as diferenças. Mas, também, não somos um país sem leis"
Joe Biden: "Não somos um país autoritário que silencia as pessoas ou sufoca as diferenças. Mas, também, não somos um país sem leis" (foto: Drew Agerer/AFP)
 

Aaron David Miller, especialista em Oriente Médio do Woodrow Wilson International Center (em Washington), advertiu à reportagem sobre a impossibilidade de prever para onde os eleitores se inclinarão em 5 de novembro. "Todas as pesquisas e manchetes apontam que, com base nos resultados de 2016 e de 2020, estas eleições serão bastante apertadas. Provavelmente, serão decididas por quatro ou cinco estados e com menos de 100 mil votos de diferença", afirmou. Nesse contexto, ele considera muito difícil prever se os protestos nos EUA impactarão as urnas. "Se Biden conseguir um cessar-fogo ou mudar o panorama em Gaza, isso poderá influencar na sua eleição. Creio que Biden ganhará, mas por uma diferença extremamente pequena", acrescentou Miller. Ainda segundo o estudioso, a guerra em massa travada por Israel na Faixa de Gaza contra o movimento islamita Hamas pode estimular parte do eleitorado de Biden a votar em Donald Trump ou a se abster. 

Por sua vez, Alon Ben-Meir — professor de relações internacionais na Universidade de Nova York e também estudioso sobre o Oriente Médio — disse ao Correio que Biden acredita na liberdade de expressão, na livre associação e nas manifestações enquanto permanecerem pacíficas e normais. "Os estudantes têm todo o direito de protestarem por qualquer causa que considerarem justificada. Eles estão colocando uma enorme pressão sobre o governo para que faça algo mais concreto em relação à guerra na Faixa de Gaza, bem como apoie todos os esforços possíveis para fornecer ao povo palestino comida, água, medicamentos e combustível", comentou. 

De acordo com Ben-Meir, o Partido Republicano busca tirar proveito da situação e apela à repressão dos manifestantes. "Isso é o que Trump tem buscado fazer. Creio ser um terrível erro para qualquer polícia nas cidades ou universidades o uso de qualquer tipo de força", disse o professor de Nova York.

A 12 mil quilômetros de Los Angeles, em Rafah, no sul da Faixa de Gaza, o palestino Mohamed Abdel, 28 anos, assegurou que não acredita mais na paz. "Não depois do que temos visto acontecer aqui. Nós vivemos em um mundo cego e brutal, que desconhece a lei ou os direitos humanos. A situação em Gaza é de um desastre extremo", lamentou ao Correio, por meio do Instagram. Abdel perdeu o irmão durante um bombardeio. Hoje, vive em uma barraca, depois que mísseis caíram sobre sua casa e sobre a loja de roupas que administrava. Ele classificou os protestos nos EUA como "absoutamente maravilhosos". "Eles precisam continuar, pois criam pressão para deter o genocídio enfrentado por nós", pediu. 

Escalada

Professor do Instituto de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Ucla, Nick Shapiro contou ao Correio que o protesto na universidade ganhou contornos tensos na madrugada da última terça-feira. "Às 4h, eu me preparava para dormir, quando olhei as redes sociais e vi que a situação estava totalmente fora do controle no câmpus. Uma multidão de saqueadores atacou os estudantes no acampamento. Fogos de artifício foram lançados no local onde meus alunos tentavam dormir. Um spray usado para afastar ursos foi pulverizado na direção deles", relatou.

Shapiro foi até o local para entregar soro fisiológico aos estudantes, a fim de que lavassem os olhos. "Eles foram atacados com barras de metal, golpeados nos punhos, nos joelhos e nos pés. Fiquei impressionado com a contenção mostrada pelos estudantes no acampamento. Eles faziam apelos pela redução da escalada e pela não retaliação. A certa altura, um deles foi atingido com spray de pimenta, depois de ser golpeado na cabeça, e caiu nos meus braços. Eu o ajudei a lavar os olhos e a limpar os ferimentos. Terminei coberto de sangue", disse o professor, um judeu que negou a existência de antissemitismo entre os manifestantes. Ele preferiu não se pronunciar sobre os comentários de Biden. 

2014. Crédito: Arquivo Pessoal. Aaron David Miller, especialista do Woodrow Wilson InternacionalCenter for Scholars (Washington).
Aaron David Miller, especialista em Oriente Médio do Woodrow Wilson International Center (em Washington) (foto: Fotos: Arquivo pessoal)

"Joe Biden tenta se equilibrar entre o apoio ao direito de protestar e ao direito de associação. Ele inclinou fortemente o seu discurso em direção aos perigos do discurso de ódio, do caos e da desordem, assim como do antissemitismo. Biden claramente teve dificuldades em apoiar os manifestantes."

Aaron David Miller, especialista em Oriente Médio do Woodrow Wilson International Center (em Washington)

2018. Crédito: Arquivo Pessoal. Alon Ben-Meir, professor de relações internacionais da Universidade de Nova York.
Alon Ben-Meir, professor de relações internacionais da Universidade de Nova York. (foto: Arquivo Pessoal)

"Biden enfrenta um grande problema com o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu. Mas, assim como no passado, encontrará um meio de lidar com a situação de modo eficiente. Espero que o presidente seja capaz de falar publicamente sobre as preocupações dos universitários e prometer fazer tudo o que estiver ao seu alcance para alivar o sofrimento do povo de Gaza."

Alon Ben-Meir, professor de relações internacionais da Universidade de Nova York

A Turquia suspendeu todas as suas relações comerciais com Israel, após restringir no mês passado suas exportações para aquele país, anunciou o Ministério do Comércio turco. "As exportações e importações relacionadas com Israel foram suspensas", informou o ministério, acrescentando que as medidas serão aplicadas "até que o governo de Israel autorize um fluxo ininterrupto de ajuda humanitária para a Faixa de Gaza".

O chanceler israelense, Israel Katz, havia dito, também ontem, que o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, tinha "rompido os acordos (entre Israel e Turquia), ao bloquear as importações e exportações israelenses nos portos". O chefe da diplomacia israelense disse querer "criar alternativas para o comércio com a Turquia, concentrando-se na produção local e nas importações procedentes de outros países". No começo de abril, a Turquia restringiu as exportações a Israel de um grande número de mercadorias, como produtos compostos de aço, ferro e alumínio, devido à guerra em Gaza.

Ontem, o movimento fundamentalista islâmico Hamas informou que examina "com espírito positivo" a proposta de trégua com Israel apresentada na semana passada, após quase sete meses de uma guerra que, segundo a ONU, exigirá um trabalho de reconstrução custoso na Faixa de Gaza quando terminar.

O Hamas responderá a um plano que prevê um cessar-fogo de 40 dias e uma troca de reféns capturados em 7 de outubro por comandos islamistas em território israelense por palestinos presos em Israel. Mediada por Catar, Egito e Estados Unidos, a trégua seria a primeira desde a troca, no fim de novembro, de 80 reféns mantidos em Gaza por 240 prisioneiros palestinos.

Por meio de um comunicado, o Hamas anunciou que seu líder, Ismail Haniyeh, "enfatizou o espírito positivo do movimento ao estudar a proposta de cessar-fogo" em uma conversa telefônica com o chefe de inteligência do Egito, Abbas Kamel. Haniyeh também reiterou o desejo do Hamas de "chegar a um acordo" no diálogo com o ministro das Relações Exteriores do Catar, Mohamed bin Abdelrahman Al Thani.

Fonte: correiobraziliense

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