O Exército de Israel ordenou na segunda-feira (6/5) que civis palestinos deixassem a região leste da cidade de Rafah, no sul da Faixa de Gaza, antes de realizar uma operação militar.
Por meio de mensagens de texto, panfletos e postagens nas redes sociais, os militares ordenaram que cerca de 100 mil pessoas fossem para acampamentos nas cidades vizinhas de Khan Younis e al Mawasi.
Vários países, incluindo os Estados Unidos, advertiram Israel para evitar uma ofensiva contra Rafah, o último refúgio para mais de um milhão de palestinos.
Enquanto isso, cresce o número de vozes na comunidade internacional que pedem a Israel que ponha um fim à sua ofensiva em todo o território.
Alguns países decidiram, inclusive, tomar medidas concretas para pressionar o governo do primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, seja cortando relações diplomáticas, suspendendo a venda de armas ou recorrendo à Justiça internacional.
A Colômbia, que anunciou na semana passada o rompimento das relações diplomáticas com Israel, e a Turquia, que suspendeu o comércio com o país, foram os que tomaram medidas específicas mais recentes para tentar influenciar as ações de Israel.
O impacto dessas medidas pode ser “meramente simbólico”, explicou à BBC News Mundo (serviço em espanhol da BBC) Yossi Mekelberg, analista especializado em Oriente Médio e Norte da África da Chatham House, uma consultoria e centro de pesquisa em Londres.
“Mas seu efeito cumulativo no isolamento diplomático ou no que isso diz sobre Israel e sobre como conduz a guerra é importante.”
Não é a primeira vez que Israel enfrenta a condenação de outros países por suas ações em Gaza ou na Cisjordânia.
No entanto, a pressão internacional nunca havia sido tão forte quanto agora, principalmente devido à dimensão da destruição sem precedentes causada pela retaliação israelense ao ataque do Hamas de 7 de outubro.
Na ocasião, Israel sofreu seu pior ataque em 75 anos de história, com a morte de cerca de 1,2 mil pessoas por combatentes do Hamas, que também fizeram 253 reféns.
A resposta israelense foi implacável: mais de 34 mil pessoas morreram em Gaza desde então, devido aos bombardeios do Exército israelense; 85% da população foi desalojada de suas casas; e cerca de metade, aproximadamente 1,1 milhão de pessoas, estão à beira da fome, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU).
Diante desse cenário, explicamos a seguir quais países decidiram tomar ações concretas contra Israel.
Após a eclosão da guerra, e à medida que a destruição de Gaza aumentava, um grupo limitado de países decidiu retirar seus embaixadores ou suspender as relações diplomáticas com Israel.
Países da região, como a Jordânia, o Bahrein e a Turquia, enviaram seus embaixadores de volta para casa, algo que o Chade e vários governos latino-americanos, como do Chile, de Honduras e da Colômbia, também decidiram fazer.
Este último decidiu agora dar um passo à frente e suspender as relações diplomáticas, juntando-se assim à Bolívia e Belize.
“Hoje a humanidade, em todas as ruas, concorda conosco. A era do genocídio, do extermínio de um povo inteiro diante dos nossos olhos, diante da nossa humanidade, não pode voltar", declarou o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, no discurso em que anunciou o rompimento das relações diplomáticas com Israel na semana passada.
Seis meses antes, em 31 de outubro, o porta-voz do governo boliviano anunciou a mesma decisão, usando palavras semelhantes.
A Bolívia “tomou a decisão de cortar relações diplomáticas com o Estado de Israel em repúdio e condenação à ofensiva militar israelense agressiva e desproporcional que está sendo realizada na Faixa de Gaza”, disse na época o vice-ministro das Relações Exteriores, Freddy Mamani.
Duas semanas depois, Belize anunciou em comunicado a suspensão das relações diplomáticas com Israel devido aos “incessantes bombardeios indiscriminados” sobre Gaza, já que, desde 7 de outubro, Israel havia violado “constantemente” o direito internacional.
Mas, afinal, em que se traduz este rompimento?
Na verdade, não está claro. Nenhum desses três países tem grande peso político no Oriente Médio, e suas trocas comerciais e diplomáticas com Israel antes desta crise eram modestas.
A Colômbia é, no entanto, o segundo parceiro comercial de Israel na América Latina, depois do Brasil.
Colômbia e Israel assinaram um acordo de livre comércio em 2020, e o Exército colombiano utiliza aeronaves e armas israelenses para combater cartéis de drogas e grupos insurgentes.
Mas, por enquanto, este acordo não parece ter sido afetado, e o Ministério das Relações Exteriores da Colômbia comunicou sua intenção de “manter a atividade das respectivas seções consulares em Tel Aviv e Bogotá”.
O efeito deste rompimento nas relações diplomáticas é, sobretudo, “simbólico, e manifesta uma sensação de isolamento e uma mudança de atitude em relação a Israel”, analisa Mekelberg.
Mas o especialista da Chatam House lembra também que esse tipo de decisão costuma ter um componente ideológico e de política interna.
“É como o que aconteceu no Brasil; com (o ex-presidente, Jair) Bolsonaro, havia um apoio total a Israel, e quando a esquerda voltou (ao poder), as críticas voltaram.”
Na semana passada, a Turquia anunciou que iria suspender todo o comércio com Israel até que o governo liderado por Benjamin Netanyahu aceitasse “um fluxo ininterrupto e suficiente” de ajuda humanitária em Gaza.
Segundo o ministro do Comércio turco, “as transações de exportação e importação relacionadas com Israel, abrangendo todos os produtos, foram interrompidas”.
O comércio entre os dois países somou US$ 7 bilhões no ano passado.
A Turquia foi o primeiro país de maioria muçulmana a reconhecer Israel, em 1949. Mas suas relações bilaterais pioraram nas últimas décadas.
O episódio mais tenso ocorreu em 2010, quando a Turquia rompeu relações diplomáticas com Israel depois que o país atacou uma frota de seis navios turcos em águas internacionais que tentavam chegar a Gaza, furando o bloqueio marítimo que Israel impõe à região.
O ataque dos militares israelenses resultou na morte de 10 ativistas turcos pró-palestinos.
As relações foram restabelecidas em 2016, mas ambos os países expulsaram seus respetivos embaixadores dois anos depois, devido a um novo conflito sobre o assassinato de palestinos na fronteira de Gaza.
A situação se agravou ainda mais desde 7 de outubro. Netanyahu e o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, têm trocado cada vez mais acusações mútuas.
Enquanto Erdogan comparou o líder israelense a Hitler, Mussolini e Stalin — e o chamou de “carniceiro de Gaza”, Netanyahu afirmou que o presidente turco “apoia os assassinos em massa e estupradores do Hamas, nega o genocídio armênio [e] massacra os curdos em seu próprio país”.
Vários países — como Canadá, Itália, Japão, Bélgica e Espanha — anunciaram nos últimos meses que iriam deixar de vender armas a Israel.
Mas, analisando de forma mais detalhada estas decisões, a realidade que prevalece é um pouco diferente.
Na Bélgica, foi a região da Valônia que decidiu suspender a venda de pólvora a Israel. A Itália também anunciou a suspensão das exportações de armas desde 7 de outubro, embora seu ministro da Defesa tenha admitido depois que eles continuavam a enviar para Israel as encomendas que haviam sido feitas previamente, com garantias de que não seriam utilizadas em Gaza.
Algo semelhante aconteceu na Espanha, que também anunciou que suspenderia os envios de armas — e, mais tarde, se descobriu que continuava a enviar munições. Madri disse, no entanto, que eram destinadas a exercícios militares.
A situação do Canadá é parecida. O primeiro-ministro do país, Justin Trudeau, anunciou que possíveis novos acordos de venda de armas a Israel estavam suspensos, mas não aqueles que já estavam acordados.
No Japão, foi uma empresa, a Itochu Corporation, que suspendeu a colaboração com um fabricante de armas israelense. E, na Holanda, um tribunal obrigou o país a interromper uma venda de aeronaves militares a Israel.
Mas estas decisões dificilmente vão ter impacto na guerra.
Mais de 95% das importações de armas israelenses são provenientes dos Estados Unidos e da Alemanha, que não deram nenhum sinal claro de que vão suspendê-las.
O impacto destas restrições à venda de armas “é limitado, uma vez que são os Estados Unidos e a Alemanha que fornecem a maior parte das armas, enquanto os outros enviam principalmente componentes ou equipamentos muito específicos que provavelmente podem ser substituídos por outros, então não vai mudar nada”, argumenta Yossi Mekelberg.
Diante da ofensiva israelense em Gaza e do aumento das mortes no território, a África do Sul optou em dezembro passado por uma estratégia diferente para tentar deter Israel: recorreu à Justiça internacional.
Seus advogados entraram com um processo na Corte Internacional de Justiça (CIJ) em Haia, no qual acusaram Israel de cometer genocídio contra a população palestina de Gaza, o que o Estado israelense nega.
Em janeiro, o tribunal, que julga disputas entre Estados, emitiu uma decisão provisória, determinando que Israel tomasse medidas para evitar atos genocidas em Gaza, mas não chegou a exigir que interrompesse sua ofensiva militar.
“Israel saiu relativamente ileso desse processo, mas o fato de o processo ter sido aberto significava que Israel havia perdido a batalha”, disse à BBC Michael Oren, que foi embaixador de Israel nos Estados Unidos entre 2009 e 2013.
Neste momento, no entanto, há uma forte preocupação entre os membros do alto escalão israelense, mas por causa das medidas que outro tribunal internacional pode tomar.
A possibilidade de o Tribunal Penal Internacional (TPI) emitir mandados de prisão contra os principais líderes políticos e militares israelenses, incluindo o próprio Netanyahu, é motivo de tensão.
O TPI, que tem o poder de acusar e julgar indivíduos por crimes de guerra ou crimes contra a humanidade, investiga há três anos as ações de Israel nos territórios ocupados — e, mais recentemente, também as ações do Hamas.
No passado, já emitiu mandados de prisão contra líderes como Vladimir Putin, da Rússia, Muammar Gaddafi, da Líbia, e o guerrilheiro Joseph Kony, de Uganda.
Embora o TPI não tenha confirmado nada, quando o procurador-chefe do tribunal, Karim Khan, visitou Israel e a Cisjordânia ocupada em dezembro do ano passado, ele deixou claro que “todos os protagonistas devem cumprir o direito humanitário internacional".
"Se não fizerem isso, não reclamem quando meu escritório for obrigado a agir", ele acrescentou, na ocasião.
Mekelberg diz: “Aonde isso vai levar, eu não sei, mas deveria enviar uma mensagem a Israel de que toda ação tem consequências.”
Fonte: correiobraziliense
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