18 de Setembro de 2024

Crise entre Argentina e Espanha piora após saída de embaixadora


A resposta à decisão do governo da Espanha veio na forma de nova ofensa. "É um disparate próprio de um socialista arrogante. (...) Ele fez uma escalada diplomática absolutamente sem sentido", afirmou o presidente da Argentina, Javier Milei, depois que o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, retirou de Buenos Aires a embaixadora María Jesús Alonso Jiménez, "em caráter definitivo". No domingo (19/5), ao visitar Madri, onde participou de reunião de líderes da extrema direita organizada pelo partido espanhol Vox, Milei chamou a esposa de Sánchez, Begoña Gómez, de "mulher corrupta". Também qualificou o socialismo como "satânico" e "cancerígeno" — o premiê espanhol é líder do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE).

Além de chamar o dirigente espanhol de "arrogante", o ultralibertário argentino o acusou de sofrer de "complexo de inferioridade" e de ter "totalitarismo no sangue". Milei também anunciou que voltará à Espanha em 21 de junho, onde receberá o Prêmio Juan de Mariana, voltado a personalidades que defendem ideias de liberdade. "Veremos se seu grande complexo de inferioridade lhe permite que os liberais espanhóis me premiem pessoalmente", provocou, na rede social X. Em quase seis meses à frente da Casa Rosada, Milei enfrenta a pior de uma série de crises diplomáticas. 

"Não existem precedentes para um chefe de Estado ir à capital de outro país para insultar suas instituições e fazer interferência flagrante nos assuntos internos", declarou o ministro de Assuntos Exteriores espanhol, José Manuel Albares. O chefe da diplomacia de Madri havia chamado a embaixadora Jiménez para consultas e exigido um pedido de desculpas formal de Milei. A ministra das Relações Exteriores da Argentina, Diana Mondino, tentou colocar panos quentes e se referiu à crise como uma "anedota", ao reforçar que "não deveria ser algo que afete" o vínculo bilateral. 

Construção do poder

Mara Pegoraro, cientista política da Universidad de Buenos Aires (UBA), admitiu ao Correio que as palavras de Milei sobre Begoña Gómez foram "infelizes" e desataram uma crise. "Essa situação deve ser avaliada sob o contexto no qual o presidente Javier Milei pensa a política. Nessa construção, o governo da Argentina tem criado adversários, pois isso lhe permite sustentar altos níveis de agitação. Esse cenário o fortalece para a construção do poder", explicou.

"A decisão de Sánchez de retirar a embaixadora não é o mesmo que fechar a embaixada, mas não deixa de ser uma mensagem de advertência a Buenas Aires." A estudiosa lembra que as relações entre Argentina e Espanha são muito anteriores ao governo de Milei. "Eu interpreto esse incidente como um elemento a mais na construção de uma política adversária de Milei para se fortalecer internamente", acrescentou ela. 

Colega de Pegoraro, o professor Miguel De Luca minimizou a crise. "É um conflito internacional sem consequências econômicas ou comerciais. Vejo isso mais como um duelo ideológico, não de interesses econômicos", comentou, por meio do WhatsApp. Para Carlos Fara, especialista em opinião pública e em comunicação de governo, em Buenos Aires, a crise foi "longe demais". "Em âmbito diplomático, o que se faz é chamar o embaixador para consultas. Isso representa uma grave advertência. Muitos países mantêm relações a nível de encarregado de negócios durante vários anos, em consequência de uma crise", disse à reportagem. "Retirar a embaixadora é quase como fechar a embaixada."

Fara comentou que Milei ameaçou não manter o embaixador da Argentina em Madri, o que tensiona ainda mais a situação. Ele acredita que, durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, Argentina e Brasil não terão relações fluidas. Também destacou que Milei não tratará o Mercosul como prioridade. "Milei tem personalizado várias disputas, como com Gustavo Petro (Colômbia), o Chile, a Venezuela, a Nicarágua e o México. Nesse sentido, ele não presta um favor às relações regionais, pois colocou a ideologia acima de tudo."

Mara Pegoraro, cientista política da Universidad de Buenos Aires
Mara Pegoraro, cientista política da Universidad de Buenos Aires (foto: Fotos: Arquivo pessoal)

"Apesar de um incidente infeliz, o presidente Milei nos tem acostumado a esse tipo de atitude. São demonstrações de sua loucura e é parte da forma como construiu sua legitimidade eleitoral. Creio que o Brasil e outros sócios de países da União Europeia adotarão a prudência e tentarão desescalar essa situação de tensão. A crise é mais de retórica do que de conteúdo ou de forma."

Mara Pegoraro, cientista política da Universidad de Buenos Aires (UBA)

Carlos Fara, especialista em opinião pública em comunicação de governo, em Buenos Aires
Carlos Fara, especialista em opinião pública e em comunicação de governo, em Buenos Aires (foto: Arquivo pessoal )
 

"A Espanha é um país mais importante do que a Argentina no cenário internacional. Não apenas faz parte do G-20, como é país-membro da União Europeia. Precisamos prestar atenção se Madri reclamará uma posição do bloco. Ninguém interpreta que as opiniões de um presidente têm somente caráter pessoal e não afetam as relações entre países."

Carlos Fara, especialista em opinião pública em comunicação de governo, em Buenos Aires 

Miguel De Luca, professor de ciência política da Universidad de Buenos Aires
Miguel De Luca, professor de ciência política da Universidad de Buenos Aires (foto: Arquivo pessoal )
 

"Não vejo impacto no âmbito econômico. As empresas fazem investimentos de acordo com as condições de mercado, não segundo as pirotecnias do governo. No entanto, diplomaticamente, haverá consequências. Somente poderemos avaliar o alcance delas com o decorrer do tempo."

Miguel De Luca, professor de ciência política da Universidad de Buenos Aires (UBA)

Fonte: correiobraziliense

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