Por Karin Santin*
Um grupo de cientistas da Universidade Federal de São Carlos (CCA-UFSCar), Universidade Federal de Viçosa (UFV) e Universidade Estadual Paulista (Unesp) examinou os efeitos de três tipos diferentes de agrotóxicos sobre uma espécie particular de abelha nativa, a Melipona scutellaris, conhecida como uruçu nordestina. Eles concluíram que os três as impactam de forma permanente, embora nem sempre sejam letais e, paralelamente, alteram o ciclo produtivo da colmeia porque a capacidade de polinizar e manter funções naturais é reduzida.
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A constatação está em um artigo publicado na revista Environmental Pollution. A pesquisa sobre os efeitos adversos dessas substâncias é ainda incipiente quando se trata de espécies brasileiras e sulamericanas, sendo os riscos reais para essa parte delicada da fauna nativa ainda pouco conhecidos.
Os resultados também demonstram que, mesmo substâncias não destinadas ao combate de insetos, como os fungicidas e herbicidas, são prejudiciais à espécie. Fábia Mello, pesquisadora especialista em abelhas da Embrapa Meio-Norte em Teresina, no Piauí, confirma que os efeitos adversos não vêm apenas do impacto direto sobre os insetos, mas também da contaminação de suas reservas de alimentos.
Segundo a cientista, os fungicidas prejudicam diretamente a formação de leveduras a partir do pólen, uma parte essencial da dieta de várias espécies de espécies nativas, não apenas a uruçu: elas funcionam como suplementos alimentares para esses animais, além de atuarem na conservação e digestão de alimentos. "Esse material contaminado pode afetar toda a colmeia, das larvas à rainha", esclarece Roberta Nocelli, autora da pesquisa e professora do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal de São Carlos (CCA-UFSCar).
Para Antônio José de Aguiar, pesquisador especializado em abelhas nativas do Departamento de Zoologia da Universidade de Brasília (UnB), há um comprometimento à capacidade de polinização como um todo. "Se os pesticidas afetam a saúde das abelhas, é lógico pensar que elas não terão a mesma capacidade de carregar um volume original de pólen, nem de voar entre plantas depositando este pólen. Elas tendem a reduzir a capacidade de voo, a área e o número de plantas que terão visita e polinização e impactam indiretamente na cadeia reprodutiva também das plantas", diz.
No estudo, foram testados a imidacloprida, que é um inseticida, piraclostrobina, um fungicida, e glifosato, um herbicida. As abelhas submetidas aos testes apresentaram comportamentos comuns aos três agrotóxicos: elas se movimentaram menos e mais lentamente. No corpo gorduroso, houve alterações fisiológicas. Essa estrutura do organismo das abelhas é responsável por armazenar lipídios, constituindo uma reserva energética, além de ser o local onde são liberadas as moléculas responsáveis pela proteção imunológica delas.
"Alterações nesse grupo de células podem levar ao desequilíbrio energético e a uma imunossupressão, tornando as abelhas mais fracas, suscetíveis a doenças e outros contaminantes ambientais", destaca Roberta Nocelli.
Os pesquisadores dão ainda o sinal de alerta para o risco de extinção, pois de forma geral, espécies endêmicas também estão mais propensas a serem extintas do que as abelhas europeias e africanizadas do gênero Apis, uma vez que essas últimas variantes estão presentes em número maior no território brasileiro devido à predominância da apicultura em comparação à meliponicultura. Fábia Mello ressalta que, normalmente, testes para aprovação de agrotóxicos não são feitos com nativas ou são feitos com poucas espécies, de modo que o dano de substâncias já aprovadas e presentes no mercado sobre elas ainda não foi mensurado.
Ainda não foram examinados os impactos do uso dos agrotóxicos aplicados sobre as abelhas no organismo humano. "Existem trabalhos mostrando a presença dessa substância na cera e no mel também, mas nesse caso, estudos sobre os efeitos em humanos precisam ser desenvolvidos para verificar a extensão da contaminação", relata Nocelli.
Roberta Nocelli e Fábia Mello defendem o chamado "manejo integrado de pragas (MIP)", que é a associação de boas práticas ao uso dessas substâncias: fechar colmeias que estejam próximas, realizar a pulverização no fim da tarde ou noite quando as abelhas não estão ativas, não aplicar agrotóxicos na época de florescimento e optar por alternativas aos agrotóxicos sempre que possível.
Para Aguiar, é necessário tomar medidas urgentes que contenham a pulverização da aérea descontrolada por causa dos efeitos dos pesticidas, pois áreas de preservação e habitação correm riscos de serem afetadas de forma indiscriminada. "É fundamental promover o manejo integrado de pragas, abolir a pulverização da aérea, diminuir áreas de risco e promover a fiscalização rígida sobre a contaminação de produtos", reforça o pesquisador da UnB.
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