22 de Novembro de 2024

30 anos do Plano Real: o sucesso se deve à habilidade de FHC e sua equipe


Antes do sucesso do Plano Real, em 1994, o Brasil passou por uma série de tentativas frustradas de estabilização econômica, marcadas por planos que falharam em controlar a hiperinflação. A trajetória até a introdução do real foi pavimentada por esforços que, apesar de bem-intencionados, não conseguiram trazer a estabilidade necessária.

A implementação do Plano Real, uma das mais significativas reformas econômicas do Brasil, é um exemplo de liderança e estratégia econômica. Antes do sucesso do real, o Brasil enfrentou uma série de planos econômicos que falharam em estabilizar uma economia marcada por inflação alta e instabilidade. Segundo o economista Otto Nogami, professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), o sucesso do Plano Real, porém, não foi apenas resultado de ideias econômicas sólidas, mas também do contexto político e da liderança eficaz.

“Antes do Real, o Brasil tentou várias estratégias para controlar a hiperinflação, como os planos Cruzado, Bresser, Verão, Collor I e Collor II. Esses planos geralmente envolviam congelamento de preços e salários, mudanças na moeda, e bloqueio de ativos financeiros, mas nenhum conseguiu resultados duradouros e muitas vezes levaram a distorções econômicas e sociais significativas”, recorda Nogami.

Para o economista, o sucesso do Plano Real se deve muito à liderança de Fernando Henrique Cardoso, então Ministro da Fazenda, e ao presidente Itamar Franco. “FHC foi crucial por sua habilidade em formar e coordenar uma equipe de economistas notáveis, que projetaram e implementaram o Real. A Unidade Real de Valor (URV) foi uma inovação particularmente importante, agindo como uma moeda indexada que ajudou a estabilizar preços antes da introdução do real como moeda”, afirma.

“Itamar Franco, por sua vez, desempenhou um papel fundamental ao proporcionar o suporte político necessário para que as reformas fossem adiante. Seu governo foi marcado por uma estabilidade que permitiu que as reformas necessárias fossem implementadas com menor resistência política”, observa Nogami. A estratégia de introduzir a URV como uma “moeda de transição” permitiu que a população se acostumasse, gradualmente, com uma economia sem inflação diária, ajustando-se aos preços que eventualmente seriam convertidos para o Real. “Isso foi essencial para o sucesso do plano, pois desvinculou os preços da inflação anterior, permitindo uma transição suave para a nova moeda”, opina o economista.

De acordo com Otto Nogami, o Plano Real não só estabilizou a economia brasileira, mas também lançou as bases para o crescimento econômico sustentável nas décadas seguintes. “A liderança, durante esse período, foi crucial, mostrando que além de boas políticas, a capacidade de executar essas políticas de maneira eficaz e obter o apoio político e social necessário é essencial para o sucesso econômico”, frisa.

Para Otto, um dos movimentos de bastidor mais importantes durante a implementação do Plano Real foi a formação e coordenação de uma equipe de economistas altamente qualificados por Fernando Henrique Cardoso, então Ministro da Fazenda. “Este grupo ficou conhecido como “os pais do Real” e incluía nomes como Edmar Bacha, Pérsio Arida, André Lara Resende, entre outros. Eles foram fundamentais no desenvolvimento e na implementação da Unidade Real de Valor (URV), o mecanismo que permitiu uma transição gradual da moeda brasileira para o Real, estabilizando a economia”, diz.

“A habilidade política de FHC para negociar e manter o apoio de diferentes setores do governo e da sociedade também foi crucial. Ele trabalhou para garantir o apoio não apenas dentro do governo, mas também junto ao público em geral, criando um ambiente favorável para a aceitação e sucesso do plano. Além disso, a estabilidade política proporcionada pelo presidente Itamar Franco permitiu que o plano fosse implementado sem interrupções significativas, uma vez que houve um consenso político mais amplo sobre a necessidade de estabilização econômica”, ponta Nogami. Segundo ele, esses movimentos estratégicos nos bastidores garantiram não apenas a implementação técnica do Plano Real, mas também a sua aceitação e eficácia a longo prazo, fundamentais para o sucesso duradouro do plano.

Planos Anteriores

Vários planos foram utilizados no Brasil antes do Real. O Plano Cruzado (1986), implementado durante o governo de José Sarney, congelou preços e salários e introduziu uma nova moeda, o Cruzado (Cz$). Inicialmente, trouxe alívio, mas a falta de controle fiscal e o desabastecimento levaram ao fracasso do plano e ao retorno da inflação.

Já o Plano Bresser (1987), sob o comando do ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira, buscou ajustes fiscais e novo congelamento de preços. No entanto, a resistência social e a falta de medidas estruturais resultaram em outro fracasso. O Plano Verão (1989), liderado pelo ministro Maílson da Nóbrega, introduziu o Cruzado Novo (NCz$) e congelou preços novamente. Apesar de esforços, a inflação voltou a disparar devido à desconfiança do mercado e à insuficiência das medidas.

O Plano Collor (1990), que foi implementado no governo de Fernando Collor, congelou contas bancárias e introduziu o Cruzeiro (Cr$). A medida drástica gerou revolta popular e paralisou a economia, sem resolver a inflação a longo prazo.

O Plano Real, lançado em 1994, marcou uma ruptura decisiva com os fracassos anteriores. O sucesso do plano pode ser atribuído a uma combinação de fatores. Um desses fatores foi o apoio político e institucional: O presidente Itamar Franco desempenhou um papel crucial ao dar carta branca ao então ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, para formar uma equipe de economistas renomados e implementar medidas inovadoras. A estabilidade política foi um pilar fundamental para o sucesso do plano.

FHC também reuniu um time de economistas de renome, incluindo Pérsio Arida, Gustavo Franco, Edmar Bacha, Pedro Malan e André Lara Resende. Essa equipe trouxe expertise e visão estratégica, essenciais para a elaboração de um plano robusto e eficaz. Outro ponto que contribuiu para que o plano desse certo foi a Unidade Real de Valor (URV), que foi introduzida em março de 1994. A URV foi uma moeda virtual que serviu como uma ponte para o Real. A URV permitiu uma transição gradual e suave, desindexando a economia de forma ordenada e preparando o terreno para a nova moeda.

Para José Luiz Pagnussat, presidente do Conselho Regional de Economia (Corecon-DF) e professor de planejamento governamental da Universidade de Brasília (UnB), uma característica do Plano Real foi a sua implementação em etapas ou fases. “A primeira fase foi o ajuste fiscal, com o PAI - Plano de Ajuste Imediato; o IPMF; e o FSE — Fundo Social de Emergência (antecessor da DRU — Desvinculação das Receitas da União, uma Emenda Constitucional para liberar parte do Orçamento que sem a DRU, hoje seria 100% obrigatória”, explica.

“Não seria possível ter política fiscal e a máquina pública não teria como se financiar sem essa pequena parcela de orçamento discricionário”, afirma o economista. Entre as medidas precedentes ainda teve os ajustes no orçamento; a renegociação da dívida externa.

“A fase 2 foi a criação de um indexador diário e oficial ao dólar, a URV, para criar um padrão estável de valor. Ninguém tinha noção de preço dos produtos com uma inflação tão elevada. Os imóveis em Brasília eram cotados em dólar; as máquinas agrícolas em número de sacas de produtos, etc”, explicou Pagnussat. “A Fase 3 foi a implementação do Real em primeiro de julho de 1994, com a conversão do cruzeiro novo em Real pela URV”, diz.

A mobilização da equipe de economistas que tinham participado dos Planos anteriores, em especial o Plano Cruzado, se deve em grande parte ao perfil do FHC e do Pedro Malan, que são agregadores. Os fracassos dos planos anteriores que de uma forma geral eram focados numa causa principal da inflação.

O Papel de FHC

Fernando Henrique Cardoso foi a figura central na condução do Plano Real. Como ministro da Fazenda, FHC utilizou sua habilidade política e visão estratégica para articular o plano e assegurar seu apoio dentro do governo e no Congresso. Sua capacidade de formar uma equipe de notáveis e coordenar a implementação das medidas foi essencial para o sucesso do plano. A confiança e o respaldo dados por Itamar Franco foram igualmente fundamentais. Itamar entendeu a gravidade da situação econômica e deu a FHC liberdade para implementar as reformas necessárias, destacando a importância da liderança política em momentos de crise. De acordo com o economista e professor do Instituto de Economia e Relações Internacionais da Universidade federal de Uberlândia (UFU), Benito Salomão, o plano real foi a política mais bem sucedida das últimas décadas no Brasil. “Foi uma conjunção muito rara de fatores, uma conjunção que não se repetiu depois, e talvez nunca mais volte a se repetir no Brasil”, opina.

O caminho até o Plano Real foi repleto de desafios e tentativas frustradas. No entanto, o sucesso do plano se deveu à combinação de apoio político, competência técnica e uma abordagem inovadora e estruturada. A liderança de Fernando Henrique Cardoso e o suporte de Itamar Franco permitiram a criação de um plano que, finalmente, conseguiu estabilizar a economia brasileira e controlar a hiperinflação. O Plano Real permanece um marco na história econômica do Brasil, demonstrando a importância da colaboração e da expertise na formulação de políticas públicas eficazes.

 

Fonte: correiobraziliense

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