04 de Outubro de 2024

Reino Unido: Trabalhistas fazem história e voltam ao poder


Faltavam 12 minutos para o fechamento das urnas no Reino Unido, quando o primeiro-ministro conservador Rishi Sunak publicou uma mensagem, na rede social X, quase em tom de despedida: "Às centenas de candidatos conservadores, aos milhares de voluntários e aos milhões de eleitores: obrigado por seu trabalho duro, por seu apoio e por seu voto". Depois de 14 anos de governo dos tories (Partido Conservador), o Partido Trabalhista retorna ao poder.

As pesquisas de boca-de-urna apontaram que a legenda de centro-esquerda comandada por Keir Starmer, o provável novo futuro premiê, obteve uma vitória esmagadora e conquistou a maioria absoluta da Câmara dos Comuns: 410 dos 650 assentos. Os conservadores teriam 131 cadeiras, no pior resultado em quase dois séculos. "Foi um massacre", resumiu a ex-líder dos tories na Escócia Ruth Davidson.

Caso as sondagens se confirmem, os trabalhistas ficarão com mais do que o dobro dos 202 assentos do Parlamento ganhos em 2019 pelo partido. "A todos que trabalharam na campanha pelos trabalhistas nesta eleição, a todos que votaram em nós e depositaram confiança em nosso Partido Trabalhista transformado: obrigado", escreveu, por sua vez, Starmer, 14 minutos depois de Sunak, também na rede X. A última vez em que os trabalhistas estiveram no governo foi com Gordon Brown, entre 2007 e 2010. Ele foi antecedido por outro trabalhista, Tony Blair, que liderou o Reino Unido de 1997 a 2007. 

O partido anti-imigração Reform UK teve desempenho pouco bem melhor do que o esperado, ao conquistar 13 assentos. "É um terremoto político", comparou Ben Habib, vice-líder da legenda. O Partido Nacional Escocês (SNP) foi a grande decepção das eleições: teve apenas 10 cadeiras contra 48 no pleito de 2019. Segundo as projeções, o conservador Jeremy Hunt tornou-se o primeiro ministro das Relações Exteriores britânico da era moderna a perder o assento no Parlamento. 

O premiê conservador Rishi Sunak a caminho do voto, em Kirby Sigston, no norte da Inglaterra: fracasso histórico
O premiê conservador Rishi Sunak a caminho do voto, em Kirby Sigston, no norte da Inglaterra: fracasso histórico (foto: Oli Scarff/AFP)

Em entrevista ao Correio, Andrew Blick — diretor do Departamento de Economia Política do King's College London — avaliou que a vitória histórica dos trabalhistas se deve principalmente à impopularidade dos conservadores, depois de "desastres repetidos", nos governos dos premiês Boris Johnson, Liz Truss e Rishi Sunak. "Parece que houve um voto tático em larga escala, com os liberal-democratas entre os beneficiários. Vale registrar o aparente sucesso do Reform UK, partido da direita populista que produzirá impacto no cenário político do Reino Unido. Parece ter sido uma das piores performances dos conservadores na história, senão a pior, e uma grande vitória dos trabalhistas, mesmo que com uma partilha de votos menos impressionante", disse.

Anthony Glees, professor emérito da Universidade de Buckingham, disse à reportagem que a vitória avassaladora dos trabalhistas é, em parte, produto do sistema eleitoral do Reino Unido. "Também se trata de um voto contra os tories. Os britânicos não caem de amor por Starmer ou pelos trabalhistas, mas odeiam Sunak e os conservadores. Os votos para o Reform UK podem provocar uma 'guerra civil' entre os tories", advertiu. Ele crê que Starmer poderá fazer muito em seu governo, respaldado pela ampla maioria. "Em um futuro imediato, espero estabilidade, não fogos de artifício."

Durante a campanha, Starmer reposicionou o partido mais ao centro e anunciou que, caso chegue à 10 Downing Street, buscará uma gestão cuidadosa da economia, focada em um plano de crescimento a longo prazo. Uma das metas dos trabalhistas será fortalecer os serviços públicos, principalmente o serviço de saúde. "O importante é fazer a economia crescer e criar riqueza", declarou nesta semana. Para analistas, o Partido Conservador paga por vários erros cometidos nos últimos quatro anos: o divórcio da União Europeia (Brexit) em 2020 e suas consequências para a economia; o gerenciamento da pandemia da covid-19; o encarecimento no custo de vida; e um sistema público de saúde debilitado. 

Na tentativa de evitar um desastre, Sunak contou com o apoio de Boris Johnson. Nesta quinta-feira  (4/7), enquanto os 46 milhões de eleitores iam às urnas, o premiê apelava para a retórica do medo. "Se vocês derem um cheque em branco para Starmer e para os trabalhistas, não conseguirão pegá-lo de volta. Votem por impostos mais baixos. Votem nos conservadores", pediu Sunak, em vídeo divulgado na internet. 

Ascensão rápida

Em apenas quatro anos, o ex-parlamentar Keir Starmer conseguiu firmar sua liderança dentro do Partido Trabalhista e levar a legenda de esquerda a 10 Downing Street. O político de 61 anos sucedeu Jeremy Corbyn, defensor de uma ideologia mais à esquerda, na chefia do partido, em abril de 2020, depois de um fiasco trabalhista nas eleições de legislativas de 2019. Starmer mudou os rumos do partido, tornando-o menos radical, o que o levou a subir nas pesquisas de popularidade. 

Keir Starmer: nove anos de carreira na política
Keir Starmer: nove anos de carreira na política (foto: Andy Buchanan/AFP)

O provável novo premiê entrou pela primeira vez no Parlamento britânico em 2015, também pelo Partido Trabalhista, depois de ter sido eleito pelos bairros londrinos de Holborn e Saint Pancras. Tinha apenas 52 anos em sua estreia na política. A ambição de voar alto ficou clara desde o início, quando era perguntado sobre como gostaria de ser lembrado. "Como alguém que teve um governo trabalhista ousado e reformista. Como um grande pai e amigo", resumiu em entrevista.

Advogado de grande reputação, conheceu a mulher, Victoria, com quem tem dois filhos, por motivos de trabalho — ela também se dedica à advocacia. O sobrenome Starmer tem origem no nome de uma pessoa cuja personalidade ou aparência lembra uma estrela ("Star", em inglês). Depois de quase uma década e meia de domínio conservador, Starmer é a nova estrela do Partido Trabalhista.

Andrew Blick, diretor do Departamento de Economia Política do King’s College London
Andrew Blick, diretor do Departamento de Economia Política do King’s College London (foto: Arquivo pessoal )

"Nesse momento, é difícil falar sobre o que esperar de Keir Starmer como primeiro-ministro. Penso que ele buscará fornecer um senso de estabilidade que tem faltado há algum tempo no Reino Unido. Ele será cauteloso e contimuará a buscar tentar apaziguar os simpatizantes do Brexit ligados ao partido Reform Uk."

Andrew Blick, diretor do Departamento de Economia Política do King's College London 

Fonte: correiobraziliense

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