Além de perder o bonde da globalização, o Brasil desperdiçou o bônus demográfico, e, consequentemente, segue preso na armadilha da renda média e do baixo crescimento. Segundo especialistas, o país está diante de mais uma oportunidade que poderá ajudar a mudar esse quadro, mas, para isso, precisará parar de desperdiçar tempo e dinheiro na busca apenas de resultados de curto prazo.
Esse é um dos alertas do livro "O Desafio da Produtividade: como tirar o Brasil da armadilha da renda média", organizado pelos economistas José Ronaldo de Castro Souza Jr, professor de Economia do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec) e sócio da Leme Consultores, e Fabio Giambiagi, economista do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
A obra, dividida em 16 capítulos escritos por 30 autores, lançado no mês passado, aborda temas determinantes para o aumento da produtividade e, em grande maioria, de acordo com Souza Jr, de certa forma, estão relacionados com a formação da mão-de-obra, ainda um dos principais entraves para o país deslanchar como outras economias desenvolvidas.
E um dos principais fatores para a baixa produtividade do Brasil, lembra Souza Jr é a má qualidade da educação no país em exatas, especialmente em matemática. "O Brasil investe mal em Educação, e, aí, só recurso não resolve. A gente tem que ter cuidado com a eficiência do gasto. E esse é um ponto importante, porque produtividade é isso, gastar bem", ressalta Souza Jr, em entrevista ao Correio.
É bom lembrar que os investimentos do país em Educação, como proporção do Produto Interno Bruto (PIB), de 5,8% como mostra um dos capítulos do livro, são superiores à média da América Latina e até da Europa, ficando atrás apenas da média da Oceania, de 6,3%, mas o percentual de brasileiros com nível superior é baixo, de 21%. Com essa taxa, o Brasil está atrás de países vizinhos, como Colômbia (28,3%) e Chile (31,4%), e com menos da metade de taxas como Coreia do Sul e do Japão, de 52,8% e 56%, respectivamente.
"A Coreia é um ponto fora da curva, mesmo em comparação aos países desenvolvidos, mas não precisamos almejar chegar a um nível tão alto. Infelizmente, temos um problema muito grande que, muitas vezes, vai além da falta de pessoas com nível superior, mas sem formação técnica ou sem formação profissionalizante, o que é bastante ruim", explica Souza Jr, que está licenciado do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
O professor do Ibmec lamenta a paralisação da mudança do Novo Ensino Médio, que focava mais na formação profissionalizante e na redução da amplitude da formação básica, "que é muito aberta no Brasil comparativamente ao exterior".
"Agora, que estávamos caminhando para a efetivação dessa reforma, resolveram mudar de novo e, até agora, ainda não conseguiram sequer aprovar a nova proposta. Com isso, acabamos tendo um problema maior", lamenta. "Eu vejo essa questão com uma certa preocupação, porque isso não era uma coisa discutida pelo governo, mas uma questão de Estado", acrescenta.
Além de coordenador do livro, Souza Jr também é um dos autores do capítulo introdutório, que traz reflexões sobre a evolução da produtividade no Brasil e no mundo, mostrando como houve retração da capacidade produtiva do país ao longo das últimas décadas.
"A produtividade desempenha um papel fundamental para o crescimento econômico de longo prazo", destaca o texto escrito por ele e Cristiano Da Costa Silva. Eles citam, uma das conclusões do prêmio Nobel de Economia de 1957, Robert Solow, mas ressalta no texto que o artigo de Solow não responde porque há diferenças tão grandes de produtividade entre os países.
"No caso brasileiro, para reduzir a diferença de renda em relação aos países desenvolvidos, seria necessário aumentar a produtividade acima da média de tais países. Porém, ao contrário disso, enquanto a nossa produtividade representava 85% da dos Estados Unidos, em 1979, essa proporção caiu para apenas 52% em 2019. Esse fato é agravado quando se considera que o Brasil tem uma limitada capacidade futura de crescimento da renda per capita por meio da acumulação de fatores produtivos (capital e trabalho)".
Os especialistas lembram que, em economias europeias, o ritmo de crescimento da produtividade do trabalho decaiu de aproximadamente 2% ao ano, entre 1995-2007 para 0,7% ao ano, 0,5% ao ano e -0,1% ao ano entre 2007-2019, na Alemanha, França e Reino Unido, respectivamente. E o crescimento médio dos EUA passou de 2,7% ao ano para 1,3%, no mesmo período.
De acordo com Souza Jr, a principal mensagem do livro é que se o Brasil de fato quer ter um crescimento sustentável, ter um crescimento que faça o país sair do nível de renda média para o nível de renda alta, é preciso que o país tenha ganho de produtividade, uma receita conhecida, mas que, infelizmente, não é aplicada.
"O país tem que ficar mais produtivo, é preciso ter esse norte, porque uma questão muito clara é que o aumento estrutural do PIB, da renda, ele não vem de política de curto prazo, de estímulo fiscal, etc. Ele vem de aumento de produtividade, de ganho de eficiência, de ganho de competitividade. É isso que faz o país realmente ficar rico", afirma o economista.
Souza Jr lembra que investimento em infraestrutura é uma área em que o Brasil ainda tem muita deficiência. "Isso, por um lado, é ruim. Mas, por outro,é uma oportunidade de crescimento econômico, pois o investimento no setor de infraestrutura costuma gerar muita externalidade positiva, e muito efeito para os demais setores, bem-estar da sociedade", destaca ele, que defende, inclusive, punição para os governantes que negligenciam áreas importantes, como saneamento básico, uma das bases de qualquer país desenvolvido.
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