06 de Setembro de 2024

PIB terá crescimento limitado neste ano, de acordo com analistas


Após o Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, frear o ciclo de corte da taxa básica da economia (Selic), mantendo os juros em 10,50% ao ano, no mês passado, o Ministério da Fazenda freou o ímpeto de revisões para cima do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano, na contramão do discurso de que a economia iria continuar supreendendo positivamente.

De acordo com analistas ouvidos pelo Correio, é possível que essa projeção do governo não se concretize, o que poderá ser mais um problema para o cumprimento da meta fiscal, que já está apertada, mesmo com o anúncio de contenção de R$ 15 bilhões de gastos — sendo R$ 11,2 bilhões de bloqueio e R$ 3,8 bilhões de contingenciamento — para o cumprimento da meta fiscal deste ano, que permite um rombo de até 0,25% no PIB, pois menos crescimento implica em menos receita.

"A taxa de crescimento de 2,5% do PIB neste ano é o teto. Com todas as restrições que estão aparecendo na economia, não vai ser simples manter o ritmo trimestral de 2,5% até o fim do ano", explica Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. Ele estima que com o anúncio de corte de R$ 15 bilhões em gastos no Orçamento deste ano, o governo está na metade do caminho do ajuste para conseguir entregar um deficit primário de 0,25% do PIB. "Ainda faltariam R$ 15 bilhões para chegar ao limite inferior do deficit neste ano de 0,25% do PIB. Como o governo interditou medidas mais estruturais de ajustes, será inevitável que esses bloqueios sejam comuns até 2026", acrescenta.

Pelos cálculos de José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator, os dados mais recentes de atividade sinalizam que o crescimento do PIB deste ano deverá ficar mais perto de 2% do que de 2,5%, o que deve reduzir ainda mais a previsão de receita do governo. Ele também prevê, além do valor anunciado, um corte adicional de, pelo menos, R$ 10 bilhões para compensar esse descompasso. "Esperamos mais ajustes até o quinto bimestre do ano, quando haverá mais clareza sobre eventuais avanços na compensação da desoneração da folha e na eficácia de medidas relativas a despesas", afirma.

No Boletim Macro Fiscal, divulgado na semana passada pela Secretaria de Política Econômica (SPE), a pasta manteve a projeção para o crescimento do da atividade econômica neste ano em 2,5%. Essa medida foi anunciada no mesmo dia em que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, divulgou a contenção de R$ 15 bilhões em despesas no Orçamento deste ano. Antes, tanto o governo quanto Haddad, vinham sinalizado que deveriam revisar para cima as projeções do PIB, o que ajudaria, de forma contábil, a melhorar o resultado fiscal e reduzir a necessidade de corte orçamentário. Mas, diante do clima apreensivo do mercado com o anúncio do corte de despesas, o chefe da equipe econômica do presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi mais contido e pediu "parcimônia". A previsão de 2,5%, que foi mantida, ainda é mais otimista do que as previsões do mercado e do Fundo Monetário Internacional (FMI), que reduziu de 2,2% para 2,1%, em grande parte, por conta da tragédia das enchentes no Rio Grande do Sul.

Técnicos da Fazenda e do Planejamento devem apresentar, na tarde de hoje, o relatório bimestral de avaliação de receitas e despesas com esse corte de R$ 15 bilhões — que é considerado por analistas insuficiente para o cumprimento da meta fiscal deste ano.

Sergio Vale, da MB, destaca também que, como os juros devem continuar elevados tanto no Brasil quanto no exterior, e o risco externo podendo aumentar caso o candidato republicano Donald Trump vença as eleições, esse cenário mais incerto pode travar o crescimento do PIB no último trimestre deste ano.

Na avaliação do economista Simão Davi Silber, professor da Universidade de São Paulo (USP), será muito difícil para o PIB crescer mais do que 2% neste ano e nos próximos, por conta da inércia. "Eu tenho falado isso desde o segundo semestre do ano passado, porque, se pegarmos a média geométrica de 1980 até 2023, dá 2%, e, por conta disso, a inércia não deixará o PIB crescer mais do que esse patamar", explica. "Não tem nada de especial neste ano, nem aqui nem lá fora, para que o país cresça acima de 2%. E, como a política monetária não conversa com a política fiscal, isso traz redução de crescimento e do investimento", acrescenta o professor da USP. Ele demonstra bastante preocupação com o forte aumento da despesa, que segue crescendo em ritmo mais acelerado do que a receita.

Conforme dados do Tesouro Nacional, de janeiro a maio, a receita tributária do governo aumentou 9%, em termos reais (descontada a inflação), em relação ao mesmo período de 2023. Enquanto isso, na mesma base de comparação, a despesa saltou 14%, gerando um saldo negativo de R$ 30 bilhões. No acumulado em 12 meses, o deficit primário somou R$ 268,4 bilhões, equivalente a 2,36% do PIB.

"A despesa tem vida própria. Ela cresce de forma vegetativamente, e o ralo da República é a Previdência, que é uma despesa que vai continuar crescendo de forma independente porque o número de aposentados está crescendo mais rapidamente porque o país está envelhecendo e, adicionalmente, os programas de transferência de renda são mais significativos", alerta Silber. Segundo ele, o país não vai resolver esse problema só aumentando a receita. "O país vai precisar crescer para que a receita também cresça de forma vegetativa. Se o país estivesse crescendo 4,5% ao ano, não estaríamos discutindo isso agora. Mas, não tem como conseguir isso agora, com o país refém de um crescimento de 2% ao ano e a população aumentando 1%. Isso significa que a renda per capita vai levar 70 anos para dobrar de tamanho. O Brasil está comendo poeira na estrada do crescimento, junto com o Egito", lamenta.

O especialista em contas públicas Manoel Pires, coordenador do Centro de Política Fiscal e Orçamento Público do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), não vê chances de o governo conseguir zerar o deficit primário neste ano, algo que já não está sendo cogitado mais por Haddad após a reunião da Junta de Execução Orçamentária (JEO), na quinta-feira. Ao anunciar o corte de R$ 15 bilhões nas despesas, o ministro sinalizou que o governo estará comprometido em entregar o resultado primário no limite da meta, que permite um rombo de até 0,25% do PIB, ou seja, R$ 28,8 bilhões.

"O sistema é mais complexo atualmente, mas não podemos reconhecer que o resultado primário deste ano, em comparação com o rombo do ano passado, deverá ser menor. Qualitativamente, será uma melhora substancial", afirma Pires. Contudo, o economista reconhece que houve um aumento expressivo no volume de benefícios sociais do governo federal e isso acabou expondo a ineficiência dos programas e, portanto, há espaço para cortes de gastos em medidas assistenciais, como Benefício de Prestação Continuada (BPC), auxílio-doença e Bolsa Família. "Existe uma margem de gordura que poderá ser cortada e isso vai ajudar o governo a anunciar um contingenciamento menor", frisa.

No boletim Macro Fiscal, a Fazenda ainda elevou as projeções para a inflação deste ano, de 3,70% para 3,90%. Segundo o documento, essa estimativa já leva em consideração os impactos do câmbio mais depreciado e da calamidade no Rio Grande do Sul nos preços, além dos reajustes recentes anunciados para os preços da gasolina e do gás de cozinha.

De acordo com Pires, além dessas três despesas que podem ser revistas e ajudar a minimizar o tamanho do corte orçamentário neste ano, o cenário com inflação mais elevada também pode ajudar, porque o PIB nominal será maior. "Outra notícia boa é o aquecimento do mercado de trabalho, que continua crescendo e pode contribuir com o aumento de receitas de tributos do governo e da Previdência", adiciona o especialista em contas públicas.

Em artigo recente, o economista e especialista em Previdência Fabio Giambiagi lembrou que a despesa previdenciária passou de 6,2% para 8,1% do PIB, entre 2003 e 2016, após 14 anos de PT no poder. E, agora, mesmo após a reforma no sistema de aposentadorias, em 2024, será da ordem de 8% do PIB novamente no governo do PT.

"O Brasil precisa avançar rumo a uma nova reforma previdenciária. É necessário dar o primeiro passo para que ocorra uma discussão intensa e criar condições políticas para aprovar uma reforma, em 2027 ou 2031. Nossa modesta contribuição é procurar dar o lastro técnico para que seja possível aprovar essa futura mudança", alerta Giambiagi. Segundo ele, não é recomendável apertar as regras para quem já foi afetado pela última mudança. "Aquela reforma foi muito importante e, basicamente, aumentou bastante o período contributivo para quem se aposentaria por tempo de contribuição. Essas pessoas, vale ressaltar, irão contribuir, na prática, em muitos casos, durante 40 anos ou mais. Em algum momento, porém, será preciso mudar as regras das outras modalidades de benefício", frisa ele, ao citar o recém-lançado livro A reforma inacabada — O futuro da Previdência Social no Brasil (Editora Altabooks), em parceria com o economista Paulo Tafner.

 


Fonte: correiobraziliense

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