No 24º aniversário do naufrágio com o submarino russo Kursk, em que 118 marinheiros morreram, o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, citou o incidente para comentar a captura da região, no oeste da Rússia, a qual deu nome à embarcação. Nos últimos dias, forças da Ucrânia capturaram 28 cidades e forçaram a fuga de 121 mil civis. "Estamos testemunhando o que parece ser o capítulo final para ele (Vladimir Putin), novamente envolvendo Kursk. É o desastre de sua guerra. (...) A Rússia trouxe a guerra para outros; agora, ela está indo para casa", afirmou Zelensky. Também nesta segunda-feira (12/8), o presidente da Rússia determinou ao exército de seu país que "expulse" as tropas ucranianas.
"A principal tarefa do Ministério da Defesa é, obviamente, expulsar o inimigo dos nossos territórios", declarou Putin, em uma reunião transmitida pela televisão. Ele reconheceu que a tomada de cidades na parte ocidental da Rússia representa um "revés inesperado". O ataque ucraniano é o maior de um exército estrangeiro, dentro da Rússia, desde a Segunda Guerra Mundial.
Durante reunião com Zelensky e assessores, Oleksandr Syrsky — chefe do Exército da Ucrânia — assegurou que seus soldados continuam "realizando operações ofensivas na região de Kursk". Ele anunciou que os militares ucranianos assumiram o controle de "cerca de mil quilômetros quadrados do território da Federação Russa". Para Zelensky, a incursão em Kursk, que começou em 5 de agosto, é uma "questão de segurança".
Putin afirmou que ficou claro o motivo pelo qual o regime de Kiev rejeitou as propostas de Moscou para retomar as negociações de paz. "O inimigo, com a ajuda dos mestres do Ocidente, está fazendo o que eles querem, e o Ocidente está travando uma guerra contra nós, usando os ucranianos", disse, segundo a agência de notícias russa Tass. Para o presidente russo, o Exército de Zelensky tem o intuito de "semear a discórdia na nossa sociedade, intimidar as pessoas, destruir a unidade e a coesão da sociedade russa".
Alexei Smirnov, governador em exercício da região de Kursk, declarou que a incursão da Ucrânia compreende uma área de 40km de largura e 12km de profundidade em território russo. De acordo com ele, ao menos 12 civis morreram e 121 ficaram feridos, incluindo "10 crianças". Moradores de um distrito de Belgorod também foram retirados às pressas, apesar de não haver combates na área. As autoridades justificaram a decisão pelo fato de a situação na região ser "alarmante".
Professor de política comparada da Universidade de Kyiv-Mohyla, o ucraniano Olexiy Haran explicou ao Correio que as operações militares na região russa de Kursk surpreenderam as forças de Moscou. "Elas mostram que as tropas de Putin não conseguem controlar suas fronteiras, o que indica uma debilidade do Kremlin", admitiu. O especialista vê uma mudança de narrativas durante a guerra. Segundo ele, por um longo período, a situação parecia ter se congelado na própria ofensiva russa.
"Sob a ótica do militarismo, não acho que Kiev esteja interessada em manter o domínio sobre esses territórios. Talvez o façam para forçar negociações. Mais cedo ou mais tarde, os ucranianos se retirarão dessas regiões. A estratégia terá sido obrigar os russos a reagruparem seus soldados, movendo alguns homens do front, o que vai enfraquecer a invasão da Ucrânia", disse Haran.
Por meio do WhatsApp, Taras Zhovtenko — pós-doutor em segurança nacional e analista da Fundação para Iniciativas Democráticas Ilko Kucheriv (em Kiev) — afirmou ao Correio que a importância da incursão ucraniana na Rússia deve ser interpretada sob o prisma do impasse na linha de frente, no leste da Ucrânia. "A ofensiva drena as reservas russas e as forças engajadas nos combates, na região de Donetsk, e torna o kit de ferramentas agressivas híbridas russas contra os seus próprios autores no Kremlin."
Zhovtenko sublinhou que a reação oficial de Putin, ao anunciar uma operação contraterrorista em Kursk, coloca o Serviço Federal de Segurança Russo no comando da situação. "A caça às bruxas entre altos oficiais militares dará uma nova reviravolta na rivalidade tradicional entre 'as botas' (os militares) e 'as jaquetas' (as agências de inteligência) da Rússia. A situação está perigosamente saindo de controle para Putin."
"As operações ucranianas no oeste da Rússia mostram que o bloco de segurança de Moscou está completamente inocapaz de lidar com a situação, quando sua própria abordagem militar/híbrida se volta contra ele.As potências russas se mostram incapazes de defender seu próprio território soberano."
Taras Zhovtenko, pós-doutorem segurança nacional e analista da Fundação para Iniciativas Democráticas Ilko Kucheriv (em Kiev)
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