Entre os detalhes divulgados na última semana sobre a morte do ator Matthew Perry, foi revelado que a estrela da série 'Friends' estava passando por terapia de infusão de cetamina (TIC).
O legista concluiu que o tratamento — disponível em vários países, inclusive no Brasil, para tratar depressão — não foi responsável pela morte de Perry devido à cetamina, que os promotores alegam ter sido fornecida a ele ilegalmente.
Cinco pessoas, incluindo dois médicos, o assistente de Perry e um suposto traficante de drogas, foram acusadas de fornecer a substância fora do regime de tratamento.
Perry, de 54 anos, sempre falou abertamente sobre seu histórico de abuso de substâncias, e os promotores afirmam que os acusados lucraram com suas tendências à adicção.
A cetamina é um anestésico que pode ser usado para tratar depressão, ansiedade e dor em um ambiente médico.
No entanto, ela também tem efeitos dissociativos — o que significa que pode distorcer as percepções de visão, som e tempo, além de produzir efeitos calmantes e relaxantes. Isso faz com que também seja usada ilegalmente.
Segundo o serviço de aconselhamento sobre dependência Talk to Frank, a cetamina pode aumentar a frequência cardíaca e a pressão arterial, deixando os usuários confusos e agitados — o que pode levá-los a se machucar sem perceber.
O uso crônico de cetamina tem sido associado a danos no fígado, bem como a problemas na bexiga, como incontinência.
A cetamina é usada para tratar a depressão em casos nos quais os antidepressivos tradicionais não foram eficazes.
O tratamento é oferecido em vários países, incluindo o Brasil, embora não tenha aprovação da Anvisa. As clínicas baseiam-se em um parecer do CFM de 2021, que reconhece a eficácia do anestésico para depressão e autoriza seu uso off label.
"Em um nível biológico, a cetamina provavelmente desativa a área do cérebro envolvida na decepção", diz o professor Rupert McShane, psiquiatra da Universidade de Oxford, na Inglaterra, que dirige uma clínica de tratamento com cetamina do NHS, o sistema de saúde pública britânico. "Essa área provavelmente está envolvida na depressão."
Rajalingam Yadhu, médico do Royal Free Hospital em Londres, que também dirige a Save Minds, uma clínica de terapia de infusão de cetamina, disse à BBC que os pacientes que ele trata têm depressão de longa data e geralmente já tentaram pelo menos sete medicamentos diferentes sem ver melhora.
"Essas são pessoas que já tentaram de tudo na vida, são extremamente suicidas — e, se tivessem a chance, se matariam."
O tratamento também foi usado por indivíduos de destaque. Além de Perry, o bilionário empresário Elon Musk afirmou ter usado cetamina para tratar a depressão.
Em uma entrevista à emissora americana CNN em março, o dono da X e da Tesla disse que a droga foi "útil para sair de um estado mental negativo".
A terapia de infusão de cetamina funciona administrando a droga por via intravenosa em doses menores do que as usadas para anestesia.
"Para a depressão, usa-se uma dose mais baixa do que para dor crônica, uma dose realmente menor do que os pacientes recebem como anestésico", diz Mario Juruena, psiquiatra do King's College London, especializado em distúrbios mentais resistentes ao tratamento.
A cetamina age mais rapidamente que os antidepressivos tradicionais — mas seus efeitos também desaparecem mais rápido.
"Ela tem uma meia-vida curta, então o tempo em que os pacientes sentem o efeito é relativamente curto em alguns casos", diz Juruena à BBC, enfatizando a importância de monitorar o estado mental dos pacientes para evitar recaídas na depressão.
Yadhu afirma que, ao contrário dos antidepressivos convencionais, foi descoberto que a cetamina afeta os nervos que utilizam o glutamato como mediador químico. O glutamato é o neurotransmissor mais abundante no sistema nervoso.
Alguns estudos apontam que a cetamina também pode ajudar a reverter a poda sináptica — a remoção de neurônios — que ocorre naturalmente, mas que também pode estar associada ao estresse crônico e à depressão.
"Quando você fica deprimido, as conexões no cérebro parecem retrair", diz McShane à BBC. "É quase como se, na depressão, alguns dos neurônios fossem como uma árvore no inverno — e, com a cetamina, eles se transformam mais em uma árvore na primavera."
Ele acrescenta que a droga provavelmente reduz pensamentos suicidas e o "ciclo de ruminação" que alimenta a depressão.
Especialistas estão pesquisando por que a cetamina pode ajudar alguns pacientes, mas não outros.
Juruena diz à BBC que mais de 60% dos pacientes responderam bem ao tratamento com cetamina — mas destacou que isso geralmente ocorre enquanto os pacientes também tomam outros antidepressivos ou fazem psicoterapia.
Os clínicos alertam que as pessoas ainda podem experimentar efeitos colaterais negativos ao tomar cetamina, mesmo quando supervisionadas por um profissional médico — embora Juruena afirme que isso acontece com menos frequência devido à menor dosagem.
Yadhu afirma que, embora muitas experiências de seus pacientes tenham sido positivas, algumas foram desagradáveis e podem trazer de volta memórias ruins.
McShane observa: "Embora a cetamina possa ser muito eficaz para pessoas para as quais nada mais funcionou, um dos problemas é que você precisa continuar tomando — e simplesmente não estamos acostumados a considerar isso uma boa ideia."
Yadhu afirma que não trata pessoas com tendências ao vício com cetamina — embora alguns médicos estejam explorando seu uso no tratamento de dependência de drogas e álcool.
Receber cetamina em uma "infusão" — ou seja, por meio de um gotejamento intravenoso — não é a única maneira de tratar pessoas com cetamina.
Juruena diz que ela também pode ser administrada por injeção, spray nasal ou em forma de cápsula.
Especialistas afirmam que a dosagem de cetamina administrada no tratamento de infusão deve ser precisa e em quantidade pequena para ter efeitos antidepressivos.
No entanto, uma autópsia revelou que o sangue de Perry continha uma alta concentração de cetamina e que ele morreu devido aos "efeitos agudos" da droga.
O exame médico também revelou que a última sessão de terapia de infusão de cetamina de Perry havia ocorrido mais de uma semana antes de sua morte — tempo suficiente para a droga ter perdido seu efeito.
Eles afirmaram que os níveis de cetamina no corpo de Perry no momento de sua morte eram muito superiores à dosagem usual.
Os promotores alegam que o assistente de Perry lhe deu pelo menos 27 doses de cetamina nos quatro dias que antecederam sua morte.
Fonte: correiobraziliense
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