A reforma ministerial anunciada por Nicolás Maduro ocorreu um mês depois das eleições de 28 de julho e sinalizou um aumento da repressão na Venezuela. Ao trocar metade de seu gabinete, o presidente nomeou o número dois do chavismo, deputado Diosdado Cabello, para assumir o Ministério do Poder Popular para Relações Interiores, Justiça e Paz (ou Ministério do Interior), 22 anos depois de ocupar o posto durante o governo de Hugo Chávez. Um dos aliados mais leais de Maduro, Cabello terá o controle total sobre o Serviço Bolivariano de Inteligência Nacional (Sebin), a Polícia Nacional Bolivariana (PNB), dois dos principais órgãos repressivos do Estado. "Estive com o presidente Chávez, junto com o seu povo, vencendo a batalha (contra a oposição). Hoje, a Venezuela segue rumo a uma paz definitiva, uma paz com justiça. Uma paz onde se aplica a justiça para aqueles que atuarem contra a Constituição e as leis", declarou o novo ministro do Interior, que substitui Remigio Ceballos.
Pouco depois de Cabello ser reconduzido à pasta do Interior, a oposição denunciou a prisão de Perkins Rocha, porta-voz do Comando Nacional de Campanha da ex-deputada María Corina Machado. "O regime de Nicolás Maduro sequestrou meu amigo e companheiro de causa, Perkins Rocha. Ele é nosso advogado pessoal, nosso coordenador jurídico e representante do Comando Nacional de Campanha ante o Conselho Nacional Eleitoral (CNE)", escreveu Machado. "Um homem justo, valente, inteligente e generoso. Um venezuelano exemplar. Querem nos quebrar, confundir nosso foco e nos aterrorizar. Seguimos em frente, por Perkins, por todos os prisioneiros e perseguidos, e por toda a Venezuela. Seremos livres."
Maduro também concedeu à vice-presidente e então ministra das Finanças, Delcy Rodríguez, o controle sobre o estratégico Ministério do Petróleo. Por sua vez, o ministro da Defesa Nacional, Vladimir Padrino López, foi ratificado no cargo. "(As mudanças) são para acoplar a força do governo popular revolucionário e socialista da Venezuela. A etapa iniciada com a vitória de 28 de julho é aquela da construção do socialismo territorial, da democracia comunal e direta, do novo sistema de governo", declarou o presidente, ao fazer os anúncios. De acordo com Maduro, "Cabello sabe muito de paz e de justiça". "Ele liderou os primeiros passos da revolução judicial", disse.
Jose Vicente Carrasquero Aumaitre, professor de ciência política da Universidad Central de Venezuela (UCV), disse não ter dúvidas de que Cabello intensificará a repressão. "Ele se caracterizou pela perseguição direta a opositores, por distintos meios. É uma pessoa muito perigosa, haja visto sua capacidade escassa de manter linhas éticas", afirmou ao Correio. De acordo com ele, Maduro tem priorizado lealdade política ao distribuir os cargos e preterido conhecimento técnico. "É evidente que Delcy Rodríguez nada sabe de petróleo. O mesmo se sucede com Cabello, um engenheiro que nunca foi militar e ocupou outros postos ministeriais. Ele tem claros indícios de não respeitar as normas morais mínimas e os princípios democráticos. Essa rotação de ministros pretende passar a ideia de que Maduro tem o controle sobre o que se passa no país, além de militarizar fortemente o governo. O objetivo é seguir endurecendo a repressão."
Em entrevista ao Correio, Marino Alvarado — advogado e ex-coordenador da organização não governamental Programa Venezuelano de Educação e Ação em Direitos Humanos (Provea) — admitiu que a nomeação de Diosdado Cabello tem o objetivo de "aprofundar o terrorismo de Estado". "A meta é ampliar a perseguição sistemática contra toda forma de dissidência. Ele terá, sob sua responsabilidade, o Sebin, principal organismo de inteligência, e a Polícia Nacional Bolivariana, a primeira força na repressão a protestos sociais", comentou.
O anúncio das mudanças no gabinete ocorreu no mesmo dia em que o opositor Edmundo González Urrutia, que se proclamou vencedor nas eleições de 28 de julho, não atendeu a uma segunda intimação do Ministério Público (MP) para depor no âmbito de uma investigação criminal contra ele. "Essa pessoa que lidera o golpe de Estado de uma caverna, escondido, Edmundo González Urrutia, é muito covarde", criticou Maduro. "Ele ignora o Poder Eleitoral, o Poder Judicial, comete o erro de ignorar o Ministério Público e o poder moral. Ele acredita que está acima das leis e da Constituição. Como se chama isso? Fascismo."
"A única maneira de permanecer no poder, depois de roubar uma eleição de forma tão descarada, é com repressão pura e dura. Temos visto isso desde 28 de julho. Perseguições, pessoas detidas sem saber o próprio paradeiro, entre outras coisas. Não há limites para violações dos direitos humanos na Venezuela."
Jose Vicente Carrasquero Aumaitre, professor de ciência política da Universidad Central de Venezuela (UCV)
Utilizamos cookies próprios e de terceiros para o correto funcionamento e visualização do site pelo utilizador, bem como para a recolha de estatísticas sobre a sua utilização.