O presidente russo, Vladimir Putin, está na Mongólia, em sua primeira visita a um país membro do Tribunal Penal Internacional (TPI) desde que a corte emitiu um mandado de prisão contra ele em 2023.
Ele foi recebido pelo líder da Mongólia em uma cerimônia na capital do país asiático, Ulaanbaatar, na terça-feira (3/9).
O líder russo é procurado pelo tribunal pela suposta deportação ilegal de crianças ucranianas. E espera-se que os países membros do TPI detenham suspeitos caso um mandado de prisão tenha sido emitido, mas não há um mecanismo para fazer cumprir isso.
O tribunal, com sede em Haia, na Holanda, afirmou, na semana passada, que os países membros tinham "a obrigação" de agir. Mas a Mongólia não respondeu publicamente aos apelos do TPI ou da Ucrânia.
Afinal, por que a Mongólia não parece disposta a prender Putin?
O antigo Estado satélite soviético mantém relações amistosas ??com a Rússia desde o colapso da União Soviética em 1991. Não condenou a invasão da Ucrânia pela Rússia — e se absteve de votar sobre o conflito nas Nações Unidas.
O país sem litoral, que também faz fronteira com a China, depende da Rússia para obter gás e eletricidade.
A viagem de Putin é vista como um ato de provocação ao TPI, a Kiev, ao Ocidente e grupos de direitos humanos que pediram sua detenção.
Mas também coincide com o 85º aniversário de uma vitória decisiva das forças mongóis e soviéticas sobre o Japão Imperial.
Durante meses de combate em 1939, milhares de soldados morreram em ambos os lados.
Soldados a cavalo se enfileiraram na Praça Genghis Khan, na capital da Mongólia, enquanto hinos militares eram tocados por uma banda ao vivo para dar as boas-vindas a Putin, que se encontrou com o presidente da Mongólia, Ukhnaagiin Khürelsükh.
Um pequeno grupo de manifestantes se reuniu na praça antes da chegada de Putin, segurando cartazes que exigiam: "Tirem daqui o criminoso de guerra Putin".
Outro protesto estava planejado para acontecer no Monumento para os Politicamente Reprimidos de Ulaanbaatar, em homenagem àqueles que sofreram sob o regime comunista na Mongólia, apoiado pelos soviéticos, durante décadas.
As forças de segurança impediram que outros manifestantes se aproximassem do presidente russo na sua chegada.
O TPI alegou em 2023 que o presidente russo era responsável por crimes de guerra, com foco na deportação ilegal de crianças da Ucrânia para a Rússia.
A corte também emitiu um mandado de prisão contra a comissária russa para os direitos das crianças, Maria Lvova-Belova, pelos mesmos crimes.
O tribunal alega que os crimes foram cometidos na Ucrânia a partir de 24 de fevereiro de 2022, quando a Rússia lançou sua invasão em grande escala.
O Kremlin disse que não tinha "nenhuma preocupação" em relação à visita de Putin.
"Temos uma excelente relação com nossos parceiros da Mongólia", declarou o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, acrescentando que "é claro que todos os aspectos da visita do presidente foram cuidadosamente preparados".
Moscou negou anteriormente as acusações do TPI, e classificou os mandados de prisão como "ultrajantes".
O TPI afirmou que todos os seus membros tinham a "obrigação" de deter pessoas procuradas pelo tribunal, mas não têm poderes para prender suspeitos — e o TPI só pode exercer jurisdição dentro de seus países membros.
A Mongólia é um país sem litoral no Leste Asiático, localizado entre a China e a Rússia — e tem uma população de pouco mais de três milhões de habitantes.
Em 1990, a Mongólia abandonou seu sistema de partido único de 70 anos, no estilo soviético, em favor de reformas políticas e econômicas e eleições multipartidárias.
A vasta quantidade de riqueza mineral inexplorada fez da Mongólia um alvo para investidores estrangeiros, transformando a pequena — mas em rápida expansão — economia do país.
Apesar dos seus ativos, a Mongólia continua dependente da Rússia para a maior parte de seu fornecimento de combustível e eletricidade.
Uma democracia situada entre dois gigantes autoritários — Rússia e China —, a Mongólia tem fortes laços culturais com Moscou, e uma relação comercial crucial com Pequim.
Até o início do século 20, a Mongólia era controlada pela Dinastia Qing da China.
Quando a dinastia Qing caiu em 1911, China e Rússia disputaram a Mongólia, até que um governo comunista, apoiado pelos soviéticos, assumiu o poder no início da década de 1920.
Após o colapso da União Soviética em 1991, a Mongólia aderiu à economia de livre mercado — e se tornou uma democracia parlamentar.
Mas as relações diplomáticas e econômicas permanecem fortes entre as três nações.
Há muito tempo se discute, por exemplo, planos para a construção de um gasoduto para levar gás natural da Rússia para a China via Mongólia, conhecido como Power of Siberia 2.
Este gasoduto transportaria 50 bilhões de metros cúbicos (bcm) de gás natural por ano da região de Yamal, na Rússia, para a China, passando pela Mongólia.
O projeto faz parte da estratégia da Rússia para compensar a perda da maior parte de suas vendas de gás na Europa desde a invasão da Ucrânia em 2022.
Ao chegar à Mongólia, Putin enfatizou a importância da diplomacia contínua.
"No ano passado, mais de 90% da gasolina e do óleo diesel que entraram no mercado mongol vieram da Rússia. Vemos boas perspectivas de cooperação no setor de gás."
Ele acrescentou que o projeto de design para o Power of Siberia 2 foi "concluído".
Embora manter um vínculo forte com seus poderosos vizinhos seja crucial, a Mongólia tem, nos últimos anos, tentado diversificar suas relações internacionais — disposta a garantir sua independência política e econômica.
Colocando em prática o que é conhecido como "política do terceiro vizinho", a Mongólia fomentou novos relacionamentos com vários países ocidentais.
Em maio do ano passado, o presidente francês, Emmanuel Macron, fez uma primeira visita histórica à Mongólia.
Na época, um porta-voz do Palácio Eliseu disse que a França estava interessada em "afrouxar as restrições sobre os vizinhos da Rússia e ampliar suas opções".
Em agosto de 2023, a vice-presidente dos EUA, Kamala Harris, recebeu o primeiro-ministro da Mongólia, Oyun-Erdene Luvsannamsrai, em Washington DC.
Em uma declaração, a Casa Branca afirmou que a visita era "para celebrar a parceria estratégica do terceiro vizinho entre os Estados Unidos e a Mongólia".
Tanto os EUA quanto a Mongólia disseram que estavam buscando ampliar seu relacionamento econômico em áreas de "interesse mútuo".
Embora o Ocidente tenha incentivado os esforços da Mongólia para expandir suas relações diplomáticas, a recepção calorosa oferecida ao presidente Putin ameaça este avanço — e deixa claro que os laços entre a Rússia e seu vizinho estão mais fortes do que nunca.
Fonte: correiobraziliense
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