19 de Setembro de 2024

O debate sobre eutanásia que está no centro do novo filme de Almodóvar


Na programação de lançamentos do 81º Festival Internacional de Cinema de Veneza, na Itália, poucos diretores presentes foram tão aclamados quanto Pedro Almodóvar.

O cineasta espanhol nunca se furtou a abordar temas controversos. Ele é famoso por retratar estruturas familiares não convencionais e pelas suas histórias de sexualidade e emocionalmente complexas, baseadas em mulheres.

Sua filmografia rendeu ao diretor um culto de seguidores, tanto nos círculos de cinéfilos quanto na mesa de jantar das famílias.

Seu filme mais recente é The Room Next Door, que estreou no Festival de Cinema de Veneza. E não é exceção – ele aborda um dos últimos tabus da sociedade moderna: a eutanásia.

Diferentemente de todos os seus filmes anteriores, esta é a primeira obra de Almodóvar em língua inglesa.

Adaptado do romance O Que Você Está Enfrentando, da escritora norte-americana Sigrid Nunez (Ed. Instante, 2021), o filme acompanha duas mulheres, interpretadas pelas atrizes Tilda Swinton e Julianne Moore.

Swinton retrata uma mulher que decide pôr fim à sua vida por sua própria vontade, enquanto a personagem de Moore é uma amiga de longa data que enfrenta a carga emocional de apoiar sua decisão.

O filme não promove uma visão estoica da morte. Almodóvar convida o espectador não só a presenciar o debate filosófico em torno do suicídio assistido, mas a sentir todo o espectro de emoções íntimas e confusas decorrentes de enfrentar o fim da vida: medo, ansiedade, arrependimento e luto.

O que terá inspirado Almodóvar a abordar um tema sensível e controverso como a eutanásia?

No festival de cinema, o diretor explicou que o filme foi uma forma de comunicar sua forte convicção de que a eutanásia deveria estar disponível "em todo o mundo".

A eutanásia é legal na Espanha desde 2021. Naquele ano, foi criada uma lei que permite que adultos portadores de doenças "sérias e incuráveis" que causem "sofrimento insuportável" coloquem fim às suas vidas.

Para Almodóvar, "deveria ser possível ter isso em todo o mundo. Deveria ser regulamentado; o parecer do médico deveria ser suficiente", conforme declarou aos jornalistas.

No Brasil, a eutanásia é considerada ilegal.

No Reino Unido, a legalização do suicídio assistido permanece um assunto controverso. Um exemplo é o famoso caso de Noel Conway, que sofria de doença do neurônio motor e levou sua campanha à Suprema Corte britânica, em 2018.

Ele defendia que um médico fosse autorizado a prescrever uma dose letal quando sua saúde se deteriorasse. Pela lei atual, o médico que fizesse a prescrição estaria sujeito a 14 anos de prisão.

Conway apresentou à Suprema Corte uma ação contra a proibição em 2018, mas perdeu o recurso. Ele morreu em casa, em 2021.

Almodóvar defende que pessoas como Conway tenham o direito de reivindicar autonomia sobre seus últimos momentos, como é ilustrado no filme. O diretor explica que "não é um filme sobre a morte – é sobre a vida, sobre a liberdade de decidir qual tipo de vida queremos ter, até o final".

Tilda Swinton concorda. Ela chama o filme de "uma celebração sobre o controle e a autonomia". Já Julianne Moore acrescenta que "é sobre apoiar alguém no seu momento mais vulnerável".

Almodóvar também usa o filme para expressar sua ansiedade sobre as mudanças climáticas.

Esta questão é incorporada pelo personagem Damian, interpretado por John Turturro. Ele é um escritor que oferece palestras niilistas sobre o tema, para forte decepção das pessoas à sua volta.

Durante o festival de cinema, Almodóvar declarou à imprensa que o filme se concentra no "estado do planeta e no estado das pessoas".

"Você precisa ser o dono da sua própria experiência", explica ele.

Swinton concorda também neste ponto. "Penso neste filme, em primeiro lugar, como uma história de amor entre Ingrid e Martha... e também sobre a evolução, seja em termos de guerra ou catástrofe climática".

"Existe no filme a fé na necessidade e na inevitabilidade da evolução, independentemente da direção a que ela nos leve."

Na sua estreia durante o Festival de Cinema de Veneza, The Room Next Door foi aplaudido de pé por sonoros 18 minutos.

Almodóvar tomou a decisão não convencional de se juntar à plateia para também aplaudir.

A reação dos críticos também foi amplamente positiva. O crítico Xan Brooks, do jornal britânico The Guardian, classificou o filme de "um caso belo, incisivo e sensível".

Já Owen Gleiberman, da revista americana Variety, elogiou o desempenho "monumental" de Swinton.

Mas outras críticas foram menos elogiosas. Robbie Collin, do jornal britânico The Telegraph, concedeu ao filme apenas duas estrelas.

Para ele, a obra é "uma decepção grosseira" e "os papéis parecem exigir muito pouco das duas atrizes".

Ainda assim, The Room Next Door está destinado a ser um dos filmes mais comentados da temporada de premiações. Ele irá gerar discussões importantes sobre a vida, a morte e o direito de escolha.

Como disse Almodóvar na estreia em Veneza, "todos nós temos um quarto ao lado, um lugar onde acabaremos enfrentando a nós e às nossas vidas".

"Minha esperança é que este filme dê às pessoas a permissão de falar sobre aquela sala, mesmo que seja um tanto desconfortável."

Fonte: correiobraziliense

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