A volatilidade no mercado de ações segue forte neste ano e o Índice Bovespa (IBovespa), principal indicador da Bolsa de Valores de São Paulo (B3), voltou para o azul em agosto e bateu vários recordes seguidos. Essa mudança, principalmente, deveu-se à volta de investidores estrangeiros ao país, diante da perspectiva de queda dos juros nos Estados Unidos.
A volta do interesse dos investidores estrangeiros por mercados emergentes, como é o caso do Brasil, começou em julho, de acordo com levantamento feito por Einar Rivero, analista e fundador da consultoria Elos Ayta. Em agosto, o volume de entrada de recursos estrangeiros na B3 superou os R$ 7,34 bilhões de julho, somando R$ 10,06 bilhões até o dia 29. Mas, no acumulado do ano até a mesma data, entretanto, o saldo segue negativo em R$ 21,45 bilhões, conforme os dados da consultoria.
“Pelo segundo mês consecutivo, os investidores internacionais colocaram recursos no mercado acionário brasileiro. O saldo no terceiro trimestre está positivo em R$ 17,45 bilhões e houve resultados negativos no primeiro e no segundo trimestres”, afirma Rivero. Ele destaca que a declaração de Jerome Powell, presidente do Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos), no encontro anual da instituição, indicando cortes futuros de juros “trouxe otimismo aos mercados emergentes, impulsionando a entrada de novos recursos no Brasil”.
Outro fator que vem contribuindo para o retorno dos investidores estrangeiros para a Bolsa brasileira, segundo o analista, é a perspectiva de ganhos com dividendos de ações brasileiras neste ano. “A análise dos dividendos trimestrais e semestrais das companhias abertas revela que, apesar das adversidades econômicas, elas continuam gerando caixa de forma robusta e remunerando seus acionistas”, afirma.
De acordo com o analista, no primeiro semestre de 2024, o volume de dividendos pagos pelas empresas já respondem por 57% do volume total pago em todo o ano de 2023. “Nos últimos anos, o segundo semestre sempre registrou um aumento no volume de proventos pagos pelas empresas na comparação com a primeira metade do ano. Por isso é possível deduzir que 2024 será positivo para os investidores”, afirma.
Valores atrativos
Em levantamento feito por Rivero, considerando as 293 empresas listadas na B3, excluindo Vale e Petrobras, o volume desembolsado no pagamento de dividendos no segundo trimestre de 2024, de R$ 38,06 bilhões, é o maior para o período desde 2020. E, somados com os recursos distribuídos no primeiro trimestre de 2024, o montante chega a R$ 77,94 bilhões, 23% superior ao registrado no mesmo período de 2023. O dado ainda está acima dos R$ 66,74 bilhões pagos por Vale e Petrobras de janeiro a junho deste ano. “É importante destacar que este valor corresponde aos desembolsos feitos pelas empresas aos seus acionistas, podendo referir-se aos resultados do exercício atual ou de exercícios anteriores”, explica o consultor.
Ele destaca que, nos próximos meses, os pagamentos de dividendos das companhias estarão relacionados aos desempenhos do primeiro e do segundo trimestre deste ano. E, somente a partir do primeiro trimestre de 2025 é que poderá haver uma queda referente ao processo de desaceleração da economia que está sendo previsto para o segundo semestre deste ano. No mês passado, o IBovespa registrou ganho de 6,54% na B3 e, de acordo com Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos, quando a Bolsa bateu os recordes, “os investidores não residentes responderam por praticamente metade do volume de negociações”.
Juros
Após a sinalização de Powell de que “está na hora de mudar a política monetária”, a expectativa dos analistas é de que o fluxo de estrangeiros na B3 seguirá crescendo nos próximos meses. “Podemos ter entradas maiores ainda se a taxa de juros dos Estados Unidos continuar em expectativa de queda”, afirma Rivero. Por conta desse interesse estrangeiro, as novas estimativas para o IBovespa no fim de 2024, passou para 140 mil pontos, podendo chegar até 145 mil pontos, na melhor das hipóteses. Esse patamar era algo improvável em junho, quando foi registrado o piso do ano, de 119 mil pontos — após a reunião do Copom de maio, quando a diretoria ficou dividida em relação à redução de 0,25 ponto percentual na Selic, para os atuais 10,50% anuais.
A volta do consenso entre os integrantes do Copom desde a reunião de junho tem ajudado a melhorar as perspectivas do mercado financeiro, assim como a confirmação de que o atual diretor de Política Monetária do Banco Central, Gabriel Galípolo, para suceder o atual presidente da instituição, Roberto Campos Neto, em janeiro de 2025.
“A temporada de balanços foi melhor do que muitos esperavam, e a confirmação do Galípolo na presidência do Banco Central, no próximo ano, também retirou um pouco da incerteza da frente. Porém, o que mais trouxe esse impulso na Bolsa foi o Fed deixar bem claro que começará a cortar juros em setembro”, destaca Gustavo Cruz, da RB Investimentos. Galípolo começou, nos últimos dias, o périplo aos gabinetes dos senadores para ganhar apoio para a sabatina, prevista para outubro, depois das eleições municipais.
Analistas ressaltam que o quadro fiscal segue sendo desafiador tanto para o governo quanto para o Banco Central, pois a meta de deficit zero, prevista no novo arcabouço fiscal, segue distante. Na avaliação de Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, o mercado ainda seguirá desconfiado sobre a autonomia do BC mesmo com a indicação de Galípolo ter sido esperada. Ele destaca ainda que o Banco Central vai ter um trabalho enorme para conseguir reverter os ruídos junto ao mercado sobre as chances de intervenção política na instituição, e, por isso, as expectativas de inflação continuarão elevadas, em torno de 4%, acima do centro da meta, de 3%.
De acordo com o economista da MB, como o lado fiscal não deve ajudar a política monetária, que ainda precisa dissipar os ruídos da comunicação, ainda não está muito claro exatamente até onde o Banco Central vai, de fato, chegar com juros para trazer essa expectativa de inflação de fato para 3%. Vale recomenda que Galípolo restrinja um pouco mais as declarações quando assumir o BC, deixando os documentos serem um canal mais oficial de fala, tanto a ata quanto o comunicado do Copom, e que fossem mais explícitos em relação à questão econômica, “explicando como a economia está aquecida e o impacto que isso está tendo na inflação e os riscos fiscais”.
O resultado mais forte do PIB do segundo trimestre, que cresceu 1,4% em relação aos três meses anteriores confirmou os riscos inflacionários de uma economia mais aquecida e ajuda a aumentar as apostas para um novo ciclo de alta da Selic a partir deste mês. A próxima reunião do Copom ocorrerá nos dias 17 e 18. O PIB mais forte também está fazendo o mercado elevar as projeções para o crescimento econômico deste ano. Sergio Vale, por exemplo, revisou de 2,4% para 2,8% a previsão de crescimento do PIB deste ano, e acredita que a taxa Selic deverá voltar a subir, devendo encerrar dezembro em 11,50% ao ano.
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