Em mais uma superquarta do mercado financeiro — quando ocorrem reuniões dos comitês de políticas monetárias dos bancos centrais do Brasil (Copom) e dos Estados Unidos (Fomc) — ambos tomaram decisões distintas. Enquanto aqui, os juros básicos subiram, conforme o esperado devido à economia mais aquecida, nos EUA, caíram acima das expectativas.
Na noite de ontem, o Copom aumentou a taxa básica da economia (Selic) pela primeira vez no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em decisão unânime, os diretores do colegiado, incluindo o indicado de Lula para presidir o BC em 2025, o diretor de Política Monetária, Gabriel Galípolo, elevaram a Selic em 0,25 ponto percentual, para 10,75% ao ano.
O novo patamar da taxa Selic, de 10,75% ao ano, mantém o Brasil na vice-liderança do ranking global de juros reais (descontada a inflação) elaborado pela MoneYou. A lista é composta por 40 países é liderada pela Rússia e tem a Argentina na lanterna, com taxa de juros real negativa de 33,92%.
Na nota, contudo, o Copom não sinalizou quando deverá interromper esse ciclo de alta nos juros. Algumas projeções indicam mais de 12% no próximo ano. "O ritmo de ajustes futuros na taxa de juros e a magnitude total do ciclo ora iniciado serão ditados pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta e dependerão da evolução da dinâmica da inflação, em especial dos componentes mais sensíveis à atividade econômica e à política monetária, das projeções de inflação, das expectativas de inflação, do hiato do produto (produtividade) e do balanço de riscos", informou o comunicado.
O Comitê ainda destacou a preocupação com a desancoragem das expectativas de inflação e com piora do quadro fiscal. Além disso, lembrou que o cenário externo permanece desafiador, em função do momento de desaceleração da economia dos Estados Unidos, que vem demandando o afrouxamento da política monetária do Fed. O comunicado do Copom lembrou que as expectativas de inflação apuradas no boletim Focus, do Banco Central encontram-se em torno de 4,4%, para 2024, e em 4%, em 2025, respectivamente, dado acima do centro da meta, de 3%, e próximas do teto, de 4,5%.
O Comitê ainda reafirmou que "uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida contribui para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária". Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV, avaliou que a decisão do Copom não teve surpresas e lembrou que o BC destacou no comunicado que as expectativas de inflação desancoradas, a inflação de serviços rodando em patamar elevado, o real desvalorizado e o mercado preocupado com o fiscal foram as explicações para justificar o novo ciclo de alta da Selic. "Mas o BC não sinalizou qual o tamanho do ciclo, porque deixou em aberto. Não me pareceu que vai ser maior do que um ponto percentual, mas ainda vai depender dos acontecimentos, e o ciclo pode ser maior. A comunicação do Banco Central tem sido ruim e ela não ajudou muito para ancorar as expectativas e, por isso, o ciclo pode ser um pouco maior.
Essa falta de um sinal claro sobre o fim do ciclo de alta dos juros preocupa analistas que esperavam um indicativo de estabilização nas próximas reuniões, segundo Sidney Lima, analista CNPI da Ouro Preto Investimentos. "Essa decisão reforçaria o compromisso do Brasil com uma política monetária mais rígida, diante de pressões inflacionárias. No entanto, com o corte nos EUA, o aumento da Selic pode acabar gerando uma maior atração de capital estrangeiro, fortalecendo o real temporariamente, mas com o risco de enfraquecer o crescimento econômico", avaliou.
Luis Otávio Leal, economista-chefe da G5 Partners, destacou que o Banco Central deixou o caminho aberto para o ritmo de aumento da Selic para as próximas reuniões do Copom ao colocar um comunicado bastante enxuto. "O Banco Central iniciou um novo ciclo de alta de juros no ritmo esperado pelo mercado, com um comunicado extremamente curto e direto, que deixou pouco espaço para contestação. Não houve nenhuma indicação dos próximos passos e, inclusive, o texto foi bastante cuidadoso nos comentários sobre o cenário internacional, provavelmente para não dar margem para especulações a respeito do impacto da decisão do Fed, que ocorreu poucas horas antes", afirmou. Ele prevê a taxa Selic encerrando o ano em 11,25% e o ciclo de alta terminando em 11,50% ao ano.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não quis comentar a decisão do Banco Central e afirmou aos jornalistas "que pretende esperar a ata da reunião do Copom", que será divulgada na próxima terça-feira.
Já entidades patronais criticaram a alta dos juros. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgou uma nota informando que recebeu com "total indignação" a decisão do Comitê. "Para a CNI, o nível da Selic antes da reunião desta quarta-feira (18) era mais do que suficiente para manter a inflação sob controle", informou a nota da entidade. Segundo a CNI, a a alta dos juros "vai prejudicar a criação de emprego e renda para a população". Já a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) considerou precipitado o aumento de juros e alerta para riscos à indústria. "A atual conjuntura exige atenção, mas o risco inflacionário ainda não está claro."
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