20 de Setembro de 2024

Por que Katy Perry tem sido tão criticada em sua volta aos palcos


O retorno de um artista aos palcos tem um lugar especial na cultura pop.

Do show de 1961 que reviveu a carreira de Judy Garland no Carnegie Hall à reinvenção de Cher que a levou de volta ao topo das paradas de sucesso com Believe, de 1998, são histórias que têm um apelo emocional.

Há algo comovente e até reconfortante em ver uma grande estrela retornar ao topo, porque isso não acontece sempre.

Por esse motivo, há um outro lado triste deste tipo de narrativa: o retorno fracassado, que pode ser igualmente fascinante.

Isso nos lembra que errar é fundamentalmente humano e que nada na vida é garantido.

É o que Katy Perry enfrenta com o lançamento de seu sétimo álbum, 143.

Seu controverso single principal, Woman's World, estagnou na posição 63 na Billboard Hot 100, enquanto seu sucessor mais sem graça, Lifetimes, teve que se contentar com a 15ª posição 15 na menos prestigiada lista Billboard Bubbling Under Hot 100.

Esses são resultados decepcionantes para uma artista que tem mais singles de diamante, ou seja, com vendas de 10 milhões de unidades nos Estados Unidos — foram seis ao todo — do que qualquer artista feminina, exceto Rihanna.

"Katy Perry é um dos maiores nomes da música pop, então, quando essas músicas não deram certo, isso criou uma história interessante para a mídia", diz Hugh McIntyre, um jornalista musical da revista Forbes.

Mas por que suas novas músicas não estão conquistando o público?

Os problemas começaram com o lançamento de Woman's World em julho.

Dois meses depois, é difícil dizer outra coisa sobre esta a música a não ser que ela morreu na praia.

Em uma entrevista à Apple Music 1, a cantora disse que queria que ela refletisse seu "divino feminino" e parecesse "empoderadora" de forma semelhante que seus hits Firework (2010) e Roar (2013).

Quando ela canta "it's a woman's world and you're lucky to be living in it" (este mundo é das mulheres, e você tem sorte de estar vivendo nele), é uma expressão bem simplória da mensagem que Katy Perry quis passar.

Ela astutamente reconheceu na entrevista que as pessoas a associam a "músicas que podem ser estampadas em camisetas e coisas assim".

No entanto, muitos fãs e críticos sentiram que a mensagem feminista de Perry foi prejudicada por sua escolha de seu parceiro na criação — o produtor Lukasz Gottwald, mais conhecido como Dr. Luke.

Perry trabalhou extensivamente com Dr. Luke em seus três álbuns de maior sucesso — One of the Boys, de 2008, Teenage Dream, de 2010 e Prism, de 2013 —, mas ele esteve ausente de seus álbuns subsequentes, Witness, de 2017, e Smile, de 2020.

Ambos foram escritos e lançados em meio à longa batalha legal que ele travou com a cantora pop Kesha.

Embora Katy Perry nunca tenha comentado em uma entrevista sobre sua decisão de romper laços com Dr. Luke, ela disse durante um depoimento em 2017 que escolheu não trabalhar com ele em Witness, porque não queria parecer estar "tomando partido".

Na época, sua batalha legal ainda estava reverberando na indústria musical.

Em outubro de 2014, Kesha entrou com uma ação judicial contra Dr. Luke alegando que ele a drogou e estuprou em duas ocasiões, além de abusar dela "sexualmente, fisicamente, verbalmente e emocionalmente".

Dr. Luke revidou processando Kesha por difamação e disse que ela havia fabricado alegações para se livrar de um contrato.

Em fevereiro de 2020, um juiz decidiu que Kesha havia difamado Dr. Luke quando ela alegou em uma mensagem de texto para Lady Gaga que o produtor havia estuprado Katy Perry.

O produtor negou essa alegação, e Katy Perry disse que isso "absolutamente não" era verdade durante seu depoimento.

A disputa prolongada de Kesha e Dr. Luke foi finalmente resolvida em junho de 2023, quando ambas as partes publicaram uma declaração dizendo que "concordaram com uma resolução" do caso.

No entanto, o nome de Dr. Luke continua controverso, mesmo que alguns na indústria o tenham acolhido de volta — desde 2021, ele recebeu várias indicações ao Grammy por seu trabalho com a estrela do pop-rap Doja Cat.

A jornalista musical Rhian Daly acredita que Katy Perry "realmente avaliou mal ao trabalhar com Dr. Luke novamente".

Embora Daly reconheça que Katy Perry "não é o primeiro artista a colaborar com o Dr. Luke desde a batalha legal com Kesha", ela também observa que Doja Cat em particular se distanciou dele desde então.

Em 2021, a rapper e cantora disse à revista Rolling Stone que há músicas dela "pelas quais ele é creditado, onde eu fico tipo, 'Hmm, não sei se ele trabalhou nisso'". Ela também disse: "Não acho que preciso trabalhar com ele novamente".

Em contraste, um representante da gravadora de Katy Perry disse à Rolling Stone em junho que "Katy sabia exatamente o álbum que queria fazer e montou a equipe para fazer isso acontecer".

Como resultado, Perry lançou sua campanha do álbum 143 sob uma névoa de polêmicas.

Muitos fãs acharam estranho, na melhor das hipóteses, que ela criasse uma música sobre empoderamento feminino com um homem que foi publicamente acusado de abusar de uma mulher — embora a queixa tenha sido retirada e nunca tenha sido levada a um tribunal.

A letra da música também foi bastante questionada. Em suas composições, Katy Perry sempre favoreceu o apelo às massa em vez da sofisticação — seu hit de 2010 Firework diz: "Boom, boom, boom / Even brighter than the moon, moon, moon" (Boom, boom, boom / Ainda mais brilhante que a lua, lua, lua).

Mesmo assim, a letra de Woman's World parece reducionista, principalmente devido às questões de feminilidade e igualdade de gênero sobre as quais ela está escrevendo.

Ela canta: "She's a winner, champion / Superhuman, number one" (Ela é uma vencedora, campeã, super-humana, número um).

Embora bem-intencionada, essa visão um tanto monolítica da excelência feminina poderia ter ressoado melhor uma década atrás.

A jornalista musical Amy Davidson diz que, hoje, os fãs "não vão tolerar tentativas sem substância de entrar nesta conversa".

Ela ressalta que duas das artistas mais comentadas de 2024, Charli XCX e Chappell Roan, "abriram novos caminhos" ao escrever com uma autenticidade impressionante.

O sucesso recente de Charli XCX, Girl So Confusing, por exemplo, explora a complexidade das amizades femininas com letras como:

"Sometimes I think you might hate me / Sometimes I think I might hate you / Maybe you just wanna be me." (Às vezes, acho que você pode me odiar / Às vezes, acho que posso te odiar / Talvez você só queira ser eu)

Enquanto isso, a candidata presidencial democrata Kamala Harris usou uma canção de Chappell Roan, Femininomenon, em um vídeo de campanha do TikTok — algo que Katy Perry poderia imaginar que seria feito com Woman's World.

Enquanto isso, o videoclipe de Katy Perry para a música só colocou mais lenha na fogueira de seus detratores.

Cenas nas quais ela canalizou o ícone da Segunda Guerra Mundial Rosie the Riveter e retratou uma mulher biônica vestida de biquíni foram percebidas por alguns como bajulação aos homens.

Perry respondeu a essa crítica aparentemente alegando que os visuais tinham a intenção de ridicularizar o comportamento masculino. "Você pode fazer qualquer coisa! Até sátira!", ela postou no X junto com um clipe do vídeo.

Estar na defensiva é algo muito distante da postura confiante com a qual ela anunciou seu novo álbum 143 no mesmo dia em que Woman's World foi lançado.

Em um comunicado à imprensa, o álbum foi alardeado como "um retorno sexy e destemido à boa forma para uma artista multifacetada" que é "repleto de hinos pop empoderadores, sensuais e provocantes que você aprendeu a amar".

O subtexto era fácil de decifrar: Katy Perry estava tentando recuperar o domínio cultural de sua fase gloriosa do final dos anos 2000 e início dos anos 2010.

Com sucessos elegantemente atrevidos como I Kissed a Girl e Hot N Cold, o álbum de Katy Perry de 2008, One of the Boys — seu segundo, mas primeiro em uma grande gravadora — fez dela uma estrela global.

Então, com o álbum Teenage Dream, de 2010, ela estourou de vez. Uma mistura ousada e maximalista de pop, rock, hip-hop, dance e disco, rendeu cinco singles número um na Billboard Hot 100, incluindo California Gurls e a faixa-título, igualando um recorde estabelecido pelo álbum Bad, de Michael Jackson, de 1987.

Durante essa era, Perry exibiu sua habilidade de surfar no zeitgeist enquanto explorava a nostalgia multigeracional ao preencher seu videoclipe Last Friday Night com participações especiais de celebridades que vão desde a então recente estrela viral Rebecca Black até a boyband dos anos 1990 Hanson e o galã dos anos 1980 Corey Feldman.

Lançado em 2013, o quarto álbum de Katy Perry, Prism, fez menos sucesso, mas rendeu mais dois números um na Billboard Hot 100: Roar e Dark Horse.

Sua era no topo das paradas chegou ao fim com o álbum Witness, de 2017.

Katy Perry o descreveu como um álbum de "pop intencional" escrito após a eleição presidencial altamente polarizada do ano anterior, mas essa mensagem foi minada pelo segundo single Bon Appétit.

Cheio de metáforas grosseiras de comida como sexo, ele estagnou na 59ª posição nos Estados Unidos.

Embora seu álbum seguinte, Smile, de 2020, tenha sido acompanhado pela brilhante Never Really Over, ele não conseguiu fazer com que Perry voltasse ao topo das paradas.

Ainda assim, vale a pena notar que Katy Perry continuou sendo um nome poderoso da indústria mesmo quando sua cotação estava em baixa: em 2018, a Forbes a nomeou a mulher mais bem paga depois que ela embolsou US$ 83 milhões graças a uma turnê de sucesso e seu novo papel de jurada no American Idol.

A cantora manteve seu nome em alta ao participar do reality show desde então, mas anunciou em fevereiro que a temporada atual será sua última: um sinal claro de que ela quer lembrar às pessoas que uma estrela pop antes de mais nada.

Infelizmente, nem Woman's World nem seus singles seguintes restauraram seu brilho.

Lifetimes, uma celebração do amor maternal, e I'm His, He's Mine, uma colaboração com a estrela em ascensão Doechii construída em torno de uma amostra robusta do clássico de 1991 de Crystal Waters, Gypsy Woman, ficaram de fora da Billboard Hot 100.

Ela também teve mais problemas: em agosto, foi divulgado que ela estava sob investigação por autoridades espanholas por supostamente filmar o videoclipe de Lifetimes em uma parte ecologicamente sensível das Ilhas Baleares, na Espanha, sem permissão.

Um porta-voz da gravadora de Katy Perry disse que a produtora responsável pelo vídeo "nos garantiu que todas as autorizações necessárias para o vídeo estavam garantidas", mas isso alimentou a crescente narrativa de que o lançamento do álbum de Katy Perry tem sido incomumente conturbado.

O jornalista Hugh McIntyre acredita que os novos singles soam "meio datados", porque Perry não conseguiu acompanhar os novos tempos.

"Parece que ela está tentando criar uma música pop que todos gostem — desde crianças de 12 anos até seus pais de 40 anos", diz ele.

Perry pode ter aperfeiçoado essa fórmula durante sua era Teenage Dream, mas McIntyre questiona se é possível escrever músicas com "apelo tão amplo" em 2024, quando a mídia está "muito mais fragmentada".

Embora muitos fãs de música das gerações X e Y ainda sejam ouvintes ávidos de rádio, os consumidores da geração Z e mais jovens, a geração alpha, provavelmente têm mais chance de descobrir uma música por meio de aplicativos como TikTok e Spotify.

A jornalista musical Rhian Daly também acredita que Perry tem enfrentado dificuldades para se ajustar a um clima cultural muito diferente.

"Em 2014, havia uma verdadeira sensação de esperança, e seu pop brilhante e borbulhante combinava com aquele clima", diz ela.

"Mas, agora, depois de uma pandemia global, anos de austeridade e guerras e injustiças contínuas, é exatamente o oposto."

Daly argumenta que as novas músicas de Katy Perry simplesmente não se encaixa em uma visão de mundo predominante que é "mais apática, niilista e hedonista".

O retorno de Katy Perry também pode ter sido prejudicado por uma combinação tóxica de misoginia e etarismo que tende a afetar artistas femininas com mais de 35 anos: Perry tem hoje 39 anos.

Esse problema foi destacado em agosto de 2023, quando o hit viral de Kylie Minogue, Padam Padam, foi aparentemente desprezado por várias estações de rádio do Reino Unido voltadas para jovens, e o produtor musical Peter Rycroft afirmou que isso ocorreu "essencialmente porque ela é uma mulher mais velha".

Daly argumenta que "a idade é definitivamente um fator na reação ao retorno de Perry, quer seus críticos admitam isso ou não".

Ela observa que artistas femininas "frequentemente enfrentam uma reação negativa quando atingem uma certa idade e o público decide que elas estão 'se esforçando demais' para permanecer relevantes ou jovens".

Com o novo álbum de Perry, 143, ainda não se sabe se ela pode salvar uma campanha marcada pela negatividade.

Ao mesmo tempo, seria tolice descartar Katy Perry. Ela lançou sua carreira em 2001 como uma cantora de rock cristão chamada Katy Hudson, mas, depois que seu álbum de estreia homônimo foi mal, ela ressurgiu vários anos depois como a artista mais cosmopolita Katy Perry.

Ela também demonstrou pelo menos ter alguma disposição de reconhecer erros passados.

Nos anos desde seu lançamento, seu hit de sucesso de 2008 I Kissed a Girl foi acusado de reforçar velhos estereótipos bissexuais.

No ano passado, Perry admitiu que provavelmente faria mudanças na música se a estivesse escrevendo agora.

Davidson sugere que, se Perry aceitasse as críticas dirigidas a Woman's World, particularmente no que diz respeito à sua tentativa "malsucedida" de "embarcar em uma mensagem feminista que não parece ser mais relevante", ela poderia potencialmente "retornar com um sucesso pop que não tem outra agenda além de ser um sucesso pop".

Atualmente, parece improvável que ela aborde diretamente a controvérsia em torno de sua decisão de se juntar novamente a Dr. Luke.

Durante uma aparição recente no podcast Call Her Daddy, Katy Perry evitou uma pergunta sobre a "decepção" e "chateção" que isso causou, reafirmando que ela é a principal força motriz criativa por trás de seu novo álbum.

"A verdade é que escrevi essas músicas a partir da minha experiência de toda a minha vida passando por essa metamorfose. E ele foi uma das pessoas que ajudou a facilitar tudo isso – um dos escritores, um dos produtores", disse ela.

Mas mesmo assim, se Perry puder aumentar mais genericamente sua propensão à autorreflexão e fazer os ajustes necessários, talvez com a clareza franca que ela coloca em suas letras, ela pode ter seu retorno mais adiante.

Fonte: correiobraziliense

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