Em entrevista exclusiva ao Correio, Michael Lincoff, pesquisador da Cleveland Clinic, nos Estados Unidos, destacou a relevância da semaglutida no cenário cardiovascular.
À frente de uma série de pesquisas em curso, ele ressaltou que a análise avaliou indivíduos de distintas etnias, idades, gêneros e graus de sobrepeso ou obesidade, além de representação geográfica. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Como o senhor avalia a eficiência a longo prazo dessa medicação na melhoria dos resultados cardiovasculares em uma população diversificada?
O estudo que conduzimos foi representativo de uma população global. Tinha uma diversidade considerável em termos de etnias, idades, gêneros e graus de sobrepeso ou obesidade, além de representação geográfica. Acreditamos que isso é relevante. Os pacientes tinham doenças cardiovasculares preexistentes ou eram obesos. A eficácia em pacientes sem doenças cardiovasculares ainda precisa ser confirmada em outros ensaios, mas os resultados sugerem benefícios a longo prazo para aqueles que avaliamos, com um acompanhamento de até 40 meses, o que é bastante longo para ensaios clínicos desse tipo. Observamos benefícios contínuos em relação às complicações cardiovasculares, indicando que os efeitos positivos podem se manter ao longo do tempo.
Como esses mecanismos se comparam a outros medicamentos para perda de peso?
Não existem outras medicações para perda de peso tão eficazes quanto essa classe de medicamentos, os agonistas do receptor GLP-1. Os outros medicamentos utilizados anteriormente tiveram efeitos modestos e não mostraram impacto nos resultados cardiovasculares. O mecanismo é complexo; esses medicamentos têm efeitos em vários tecidos do corpo. Os efeitos positivos estão relacionados a múltiplos mecanismos, incluindo perda de peso, redução da inflamação e melhor controle glicêmico. No entanto, conseguimos medir apenas 30 a 40% dos efeitos; muitos deles ainda não são totalmente compreendidos e podem incluir efeitos diretos no tecido do coração e nos vasos sanguíneos.
Como os clínicos devem equilibrar os potenciais benefícios cardiovasculares com os riscos de efeitos adversos em pacientes com condições de saúde preexistentes?
Aprendemos que essa medicação é muito segura. O estudo foi o maior realizado por um longo período, e não vimos um aumento em eventos adversos graves. Embora alguns pacientes relatem intolerância gastrointestinal, isso pode ser gerenciado com titulação lenta da dose. Em termos de segurança, a margem é favorável. A questão mais relevante agora é a disponibilidade e o custo da medicação, que é alta e pode ser um desafio para os sistemas de saúde.
Como o senhor prevê o papel dessa medicação no contexto mais amplo do manejo da obesidade e da prevenção de doenças cardiovasculares nos próximos anos?
À medida que adquirimos mais experiência, veremos mais evidências sobre os efeitos em populações gerais. Esperamos dados sobre doenças isquêmicas do coração e insuficiência cardíaca, que são muito importantes. Também devemos aprender mais sobre os efeitos renais. Essa medicação pode impactar positivamente a aterosclerose, a insuficiência cardíaca e as doenças renais. Com novos remédios que afetem múltiplos receptores, podemos alcançar perdas de peso semelhantes às da cirurgia bariátrica, o que proporcionará uma variedade de opções para os pacientes, dependendo do seu nível de sobrepeso ou obesidade e comorbidades.
Qual a responsabilidade dos cardiologistas frente a essa nova janela de oportunidade?
Como cardiologistas, temos a responsabilidade de gerenciar essas condições. Anteriormente, dependíamos de endocrinologistas para lidar com os níveis de colesterol. Agora, consideramos o manejo do colesterol uma parte essencial do que fazemos. Assim, essa nova medicação se torna mais uma responsabilidade que devemos assumir na gestão dos fatores de risco cardiovasculares.
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