22 de Novembro de 2024

'Não tomamos posição a favor ou contra empresa privada', diz Departamento de Estado dos EUA sobre X


Dias depois de o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva usar seu discurso na Assembleia Geral da ONU, em NY, para defender a soberania dos país ante "indivíduos, corporações ou plataformas digitais que se julgam acima da lei", em uma alusão velada ao bilionário Elon Musk, dono do X (Twitter), a porta-voz do Departamento de Estado dos Estados Unidos, Amanda Roberson, afirmou à BBC News Brasil que o governo americano não tomou e nem tomará posição a favor do empresário ou da rede social, que trava uma disputa com o Supremo Tribunal Federal (STF).

"Estamos acompanhando a situação. O X, como uma empresa privada com negócios em muitos países, tem que conduzir seus negócios independemente. Não é algo em que o governo americano se envolva", disse Roberson.

A BBC News Brasil questionou a porta-voz sobre uma nota divulgada pela Embaixada dos EUA em Brasília, em 30/8, pouco depois que o ministro Alexandre de Moraes determinou a derrubada do X no país, onde a rede deixou de ter um representante legal. Na nota, a embaixada afirmou que estava "monitorando a situação entre o Supremo Tribunal Federal e a plataforma X. (..) Por política interna, não comentamos decisões de tribunais ou disputas legais".

Além disso, a nota dizia: "Ressaltamos que a liberdade de expressão é um pilar fundamental em uma democracia saudável".

Segundo apurou a BBC News Brasil, integrantes do governo e da diplomacia brasileiros viram nesta frase um indireto comentário pró-Musk.

Questionada especificamente sobre isso, Roberson afirmou que "as pessoas vão interpretar as informações como quiserem. É certo que a liberdade de expressão é muito importante para a democracia. Não tomamos posição a favor ou contra uma empresa privada, não é nosso papel".

O próprio Musk acusou o Brasil de ferir a liberdade de expressão ao retirar do ar a plataforma e demandar a derrubada de posts e perfis considerados desinformação pelo STF. Veículos estrangeiros como a revista britânica The Economist endossaram ao menos parcialmente as críticas do bilionário.

Roberson afirmou que os dois países seguem trabalhando na agenda de cooperação para preservação da democracia e combate à desinformação, especialmente online.

Segundo o brasilianista Brian Winter, editor-chefe da revista Americas Quarterly, o fato de que Musk aterrissou no discurso do líder brasileiro na ONU é prova de que, para Lula, o bilionário "foi capaz de atingir a reputação internacional do Brasil".

Lula usou a queda de braço entre Musk e a Justiça Brasileira como um exemplo bem sucedido de resposta das instituições contra a direita radical transnacional.

E definiu a questão como uma defesa da soberania do Brasil, reafirmando as prerrogativas do país de regular o ambiente das redes sociais, o que ainda não foi feito por lei.

Nos últimos dias, Musk parece ter recuado na escalada de tensões em relação ao país ao cumprir ao menos parcialmente as decisões judiciais proferidas em relação ao X.

A rede quer retomar as operações no Brasil e informou judicialmente, nesta terça, 1/10, que cumprirá integralmente todas as determinações de Moraes e do STF.

Moraes determinou o desbloqueio de contas bancárias do X mas ainda não levantou a suspensão da rede em território nacional.

Quanto ao principal recado de Lula na ONU, sobre a necessidade de reformar instituições multilaterais para aumentar a representatividade dos países em desenvolvimento, os EUA estariam dispostos a apoiar parcialmente o pleito do país.

"Somos favoráveis à expansão do Conselho de Segurança e do ingresso de Brasil, Alemanha, Índia, além de dois países da África" como membros permanentes do colegiado, afirmou Roberson.

Atualmente, o Conselho de Segurança é composto por 15 membros, mas apenas cinco permanentes: EUA, China, Rússia, França e Reino Unido.

Conhecidos como P5, as potências também são os únicos países a contar com poder de veto sobre qualquer decisão aprovada pelo grupo.

A reforma do Conselho é uma demanda histórica do Brasil — e há enorme ceticismo sobre a possibilidade de que ela se concretize em algum momento.

Em reunião conjunta entre G-20 e a Assembleia Geral da ONU, Lula detalhou algumas das propostas do Brasil sobre o tema. Uma delas é o fim do poder de veto.

"O que nós estamos desejando é que haja uma nova geopolítica para que a gente possa ter a totalidade dos continentes representados na ONU, incluindo no Conselho de Segurança, acabando com o direito de veto e aumentando o poder de comando das Nações Unidas. Se isso acontecer, eu penso que a gente poderia evitar muitos conflitos de hoje", afirmou Lula — que citou Ucrânia e Gaza como exemplos da disfuncionalidade do Conselho.

Roberson deixa claro que os EUA não são nem a favor de expandir o poder de veto, nem de aboli-lo.

"Não somos a favor de expandir o poder de veto porque ele não ajuda o funcionamento do Conselho de Segurança", afirmou a porta-voz, reconhecendo a paralisia do órgão dado o antagonismo entre posições de EUA e China e Rússia.

"Também não somos a favor da abolição do poder de veto. Mas quando chegarem as propostas concretamente vamos avaliar em detalhes novamente. O que temos feito é convidado outros países a começar esse processo. Tem havido muitas palavras ditas na ONU, mas até agora nada por escrito", afirmou Roberson, sugerindo um processo formal de reforma, que também interessa ao Brasil.

No discurso ao G-20 na ONU, Lula chegou a cogitar a evocação do Artigo 109 da Carta da ONU, capaz de dar início a uma espécie de processo constituinte das Nações Unidas.

A porta-voz do Departamento de Estado dos EUA não soube informar se os americanos endossariam a medida, caso o governo brasileiro a leve adiante.

Roberson confirma que os planos da Casa Branca incluem uma visita de Biden ao Brasil, em novembro, para participar do encontro de líderes do G-20, no Rio de Janeiro.

A equipe de Lula, porém, convidou o americano também para um tour na Amazônia, algo parecido com a visita guiada feito com o líder francês Emmanuel Macron recentemente.

O passeio na Amazônia tem sido tratado pela diplomacia brasileira como uma das principais ferramentas de soft power do Brasil sob Lula.

"Não tenho como confirmar, mas certamente seria interessante", disse Roberson sobre a possível visita de Biden à Amazônia.

A BBC News Brasil apurou que a data em negociação entre as equipes para o evento seria 17 de novembro, depois da eleição americana e quando se espera que o resultado já seja conhecido. Biden encerra seu mandato em janeiro de 2025.

A se concretizar, a visita de Biden será a primeira de um presidente americano ao Brasil desde 2011, quando Barack Obama esteve no país.

Fonte: correiobraziliense

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