Depois de o gabinete do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu aprovar uma ofensiva no Irã, em retaliação ao bombardeio com 200 mísseis balísticos de terça-feira (1º/10), Israel voltou a disparar projéteis contra um bastião do movimento xiita Hezbollah, no sul de Beirute, e contra uma região central da capital do Líbano. Sete pessoas morreram no ataque ao Centro de Autoridade Sanitária, afiliado ao Hezbollah, em uma operação considerada "precisa" pelas Forças de Defesa de Israel (IDF). Mais cedo, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, avalizou um eventual contra-ataque israelense, mas afirmou não concordar que instalações nucleares sejam incluídas entre os alvos.
"A resposta é não", disse Biden a jornalistas quando questionado se apoiaria um ataque desse tipo. "Os sete (do G7) concordamos que eles têm o direito de responder, mas devem fazê-lo de maneira proporcional." O presidente do Irã, Masud Pezeshkian, ressaltou que "não busca uma guerra", mas ameaçou uma "resposta mais forte" a uma ação israelense. "Se Israel quiser reagir, lançaremos uma resposta mais forte."
O chefe do Estado-Maior iraniano, general Mohamad Baqeri, advertiu que seu país atacará "com maior intensidade" e atingirá "todas as infraestruturas" de Israel se houver retaliação. As IDF confirmaram que o bombardeio de terça-feira causou danos a bases militares. Teerã batizou a operação de "Promessa Honesta 2" e anunciou ter usado mísseis hipersônicos pela primeira vez.
Antes de uma reunião do Conselho de Segurança da ONU, Israel Katz, chanceler de Israel, declarou o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, "persona non grata" e o proibiu de visitar o país. "Qualquer pessoa que seja incapaz de condenar de forma inequívoca o ataque de ódio do Irã a Israel não merece pisar em solo israelense. Este secretário-geral é contra Israel e apoia terroristas, estupradores e assassinos", disse. No início da madrugada de hoje, as IDF interceptaram "um alvo aéreo suspeito" sobre a costa de Tel Aviv.
Depois de um longo e estressante dia, Makram Rabah, professor do Departamento de História e Arqueologia da Universidade Americana Libanesa, tomava um drinque em sua casa, no bairro de Mousytbah, na região oeste de Beirute. Pouco antes da zero hora de hoje (18h de ontem em Brasília), ele escutou quatro grandes explosões. "Foram três seguidas e, depois, outro estrondo. Os mísseis foram lançados de navios a partir do Mar Mediterrâneo. Três projéteis atingiram o bairro xiita de Dahiyeh e outro caiu em Bachoura, próximo ao centro de Beirute, a cinco minutos de minha casa", relatou ao Correio, por telefone. "Bachoura é uma área densamente povoada, onde o Hezbollah tem se escondido. Um prédio foi destruído."
Medo
Makram admitiu que está com medo. "Não apenas porque Israel quer nos matar, mas porque o Hezbollah se esconde entre nós. Isso é alarmante", desabafou. O jornal israelense Haaretz informou que, após os bombardeios, as Forças de Defesa de Israel (IDF) emitiram um alerta, em árabe, no qual ordenavam a moradores de cinco prédios de Beirute que abandonassem o local.
Segundo Rodrigo Amaral, professor de relações internacionais da PUC-SP, o discurso de Netanyahu e dos militares israelenses em relação a uma retaliação ao ataque iraniano tem sido bastante forte. "No entanto, existe uma perspectiva de moderação que vem dos EUA, o principal aliado de Israel, que não tem interesse em uma escalada de conflito regional", disse ao Correio. "Acredito que o ataque israelense deve ocorrer nos próximos dias e em escopo limitado. Não faz sentido chamar uma potência regional do tamanho do Irã para uma guerra. O Irã é uma das maiores forças militares do Oriente Médio."
Ainda de acordo com Amaral, existe o risco de escalada do conflito se a resposta israelense for desproporcional. "Caso o ataque de Israel atinja civis e o Exército iraniano de maneira brusca, podemos esperar uma resposta iraniana e começar a falar no perigo de uma guerra regional", observou. Ele lembrou que, desde 1979, nunca houve um confronto direto entre Israel e Irã.
Professor de relações internacionais da ESPM e especialista em segurança internacional, Gunther Rudzit explicou ao Correio que a lógica de Netanyahu mudou. "Ele pretende fazer com que Israel volte a ser a hegemonia na região, abandonando a ideia de 'convivência' de guerra indireta com o Irã", disse. O analista aposta que Israel focará os ataques em alvos militares. "Provavelmente, será um bombardeio com mísseis contra instalações de comando e controle, quanto de lançamento de mísseis, ou contra fábricas que as produzem."
Rudzit duvida que Israel alveje o programa nuclear iraniano. "Isso levaria a uma escalada por parte de Teerã. Também não creio que as refinarias sejam atacadas. Os preços do petróleo disparariam, o que prejudicaria muito os EUA, a China e o resto do mundo."
"Foram muitas explosões no ataque iraniano"
"Os bombardeios do Irã contra Israel começaram às 19h30 (hora local) de terça-feira. Moro em Jerusalém. Recebemos mensagens do Exército israelense, por meio do celular. O aparelho apitava e os textos pediam que entrássemos em um bunker ou um quarto seguro. Foi bem diferente da experiência que tivemos com o primeiro ataque do Irã, em 13 de abril, quando eles mandaram 500 drones e mísseis. Dessa vez, todo mundo agiu muito rápido. Pegamos as crianças e descemos as escadas até o bunker em meu prédio. As paredes são bem fortes para o caso de explosão. Ficamos em cerca de 30 pessoas ali dentro.
Escutamos muitas explosões. Eu fiquei muito preocupado, porque o primeiro ataque iraniano foi frustrado. O sistema de defesa é muito bom. Mas, mesmo assim, quando ocorrem as explosões, as ondas de choque fazem tudo estremecer. Tive que brincar com meus filhos e dizer que tudo aquilo passaria. Ficamos 10 minutos aqui dentro do bunker. O maior dos dramas é deixar as crianças calmas. É difícil para elas, porque não têm a mesma compreensão que a nossa. Os idosos, também, precisam de suporte físico."
Jacob Kutschenko, 37 anos, empresário paulistano, morador de Jerusalém
"Se Israel atacar o Irã, e Teerã não responder, tudo pode acabar ali. Se o Irã retaliar, aí será outra coisa. Na hipótese de isso ocorrer, o Líbano deixará de ser a principal fonte do conflito. Israel terá um conflito regional e internacional em suas mãos."
Makram Rabah, professor do Departamento de História e Arqueologia da Universidade Americana Libanesa (em Beirute)
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