Depois de o secretário-geral da ONU, António Guterres, advertir que os ataques do Exército de Israel aos capacetes azuis "podem constituir crimes de guerra", o Ocidente exigiu que as agressões contra a Unifil (Força Interina das Nações Unidas no Líbano) parem "de uma vez por todas". Em nota conjunta, Alemanha, França, Itália e Reino Unido destacaram o "papel essencial de estabilização" desempenhado pela Unifil e afirmaram que Israel deve garantir a segurança da missão. De acordo com o texto, os ataques são contrários ao direito humanitário internacional.
Por sua vez, o chefe das tropas de pacificação da ONU, Jean-Pierre Lacroix, garantiu que os capacetes azuis manterão suas posições no território libanês. "Foi tomada a decisão de que a Unifil permaneça atualmente em todas as suas posições apesar dos apelos das Forças de Defesa de Israel (IDF) para que abandonem as posições próximas à Linha Azul", disse. "Quero destacar que essa decisão segue de pé. Foi confirmada esta manhã pelo secretário-geral." Mais cedo, o primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sánchez, cujo país mantém soldados na Unifil, garantiu que "não haverá retirada" da ONU.
Às 4h30 de domingo (22h30 de sábado, em Brasília), dois tanques israelenses destruíram o portão de uma posição da Unifil e entraram no local, onde permaneceram por 45 minutos. Às 6h40, os capacetes azuis reportaram o disparo de artilharia, 100m ao norte do prédio da Unifil. Cinco soldados da ONU ficaram feridos e 15 sofreram efeitos da fumaça liberada no ataque — irritação na pele e reações gastrointestinais. A Unifil acusou o Exército israelense de disparar "repetida" e "deliberadamente".
O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, fez um pronunciamento em inglês, em que rejeitou as alegações de que o Exército judeu tenha atuado de forma intencional no ataque. "A acusação de que Israel deliberadamente atacou os funcionários da Unifil é completamente falsa", declarou. "É exatamente o oposto. Israel pediu repetidamente à Unifil que saísse do caminho do perigo. Pediu repetidamente que eles deixassem temporariamente a zona de combate, que fica bem ao lado da fronteira de Israel com o Líbano." O premiê reforçou que o movimento xiita Hezbollah utiliza "as instalações e posições da Unifil para realizar ataques".
"Sem piedade"
Netanyahu prometeu continuar "atacando sem piedade o Hezbollah" em todo o Líbano. No domingo (13/10), o grupo xiita usou um drone para bombardear uma base de treinamento da Brigada Golani (força de elite do Exército judeu), em Binyamina, no norte de Israel. O ataque deixou quatro soldados mortos e 60 feridos. Em Aito, no norte do Líbano, o Ministério da Saúde libanês anunciou que 21 pessoas morreram durante bombardeio israelense a um vilarejo de maioria cristã.
Pesquisadora do Centro de Pesquisas Internacionais do Instituto Sciences Po Paris, Marina Calculli explicou ao Correio que Israel deseja remover a Unifil, pois a vê não apenas como impedimento à invasão, mas como uma supervisão internacional das violações sistemáticas do direito internacional. "Foi a Unifil que documentou o uso recente, por parte de Israel, de fósforo branco. Isso é crucial em um momento no qual o governo israelense tem a intenção de reocupar e, eventualmente, colonizar o Líbano, usando métodos de guerra sem precedentes."
Para Calculli, Israel não trava batalha contra todo o Líbano. Ela disse que Netanyahu não se preocupa com os críticos porque tem os EUA na retaguarda, e todos os governos europeus estão prontos para tolerar violações cometidas pelos israelenses. "O que vemos é o desenrolar de um plano de Israel e EUA para mudar o regime no Líbano, na Síria, no Iraque e no Irã."
Gaza
As IDF confirmaram que bombardearam um "centro de comando e controle que fica em um complexo que abriga o Hospital Mártires de Al-Asa, na cidade de Deir Al Balah, no centro da Faixa de Gaza. A Defesa Civil de Gaza informou que o ataque deixou quatro mortos e vários feridos. Imagens de vídeo divulgadas pelas redes sociais mostram palestinos queimados vivos.
"Nenhum país que contribua para a Unifil deve retirar seu contingente, nem ceder ao pedido arrogante de Israel para limpar o espaço, como se isso fosse algo legítimo. Somente o Conselho de Segurança pode eventualmente mudar o mandato da Unifil. Nenhum Estado pode pedir a uma missão de paz da ONU que se retire de outro Estado que esteja invadindo. Mas temo que condenações vazias, sem sanções adequadas, não deterão o comportamento e os ataques de Israel à Unifil. Vimos em Gaza como a impunidade encorajou Israel a exterminar o povo de Gaza, mas também a matar sistematicamente o pessoal da UNRWA (agência da ONU que presta assistência aos refugiados palestinos)."
Marina Calculli, pesquisadora do Centro de Pesquisas Internacionais do Instituto Sciences Po Paris
Missão de estabilização na fronteira israelo-libanesa
A Força Interina das Nações Unidas no Líbano (Unifil, na sigla em inglês) atua no sul deste país desde 1978. Com cerca de 9.500 soldados, está posicionada entre o Rio Litani e a fronteira com Israel. O quartel-general se situa em Ras al Naqura, perto da divisa com Israel. Indonésia, Índia, Gana, Nepal, Itália, Malásia, Espanha, França, China e Irlanda são os dez países principais que fornecem contingentes à missão. A Unifil reivindica a aplicação da Resolução 1701 do Conselho de Segurança, que pôs fim à guerra entre Israel e Hezbollah em 2006. O texto estipula o fim das hostilidades em ambos os lados da fronteira e dispõe que apenas estejam destacadas no sul do Líbano as forças de manutenção da paz da ONU e o Exército libanês. O Conselho de Segurança da ONU criou a Unifil em 1978 e mobilizou à época 6 mil homens, depois de uma primeira invasão de uma parte do sul do Líbano por Israel, que afirmava proteger o norte de seu território dos combatentes da Organização para a Libertação da Palestina (OLP).
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