Ahmad Kahil, prefeito da cidade de Nabatiyeh (sul do Líbano), conselheiros municipais, médicos e socorristas estavam reunidos, em um gabinete de crise, no prédio da administração municipal. Caças israelenses lançaram mísseis sobre o local do encontro, matando 16 pessoas, incluindo Kahil, e ferindo 52. A governadora da província, Howaida Turk, acusou Israel de bombardear cidadãos em várias partes do Líbano, a Cruz Vermelha e a Defesa Civil. "O que ocorreu aqui foi inaceitável, um massacre", desabafou.
O premiê libanês, Najib Mikati, denunciou um ataque "deliberado" contra o "Conselho Municipal" de Nabatiyeh. O movimento xiita Hezbollah, apoiado pelo Irã, também reportou "combates violentos" com tropas israelenses perto do povoado libanês fronteiriço de Al Qawzah, com disparos "à queima-roupa".
Em outro incidente, a Força Interina das Nações Unidas no Líbano (Unifil) anunciou que um tanque de Israel abriu fogo contra uma de suas posições no vilarejo de Kfar Kila (sul), em um ataque "aparentemente deliberado" que danificou uma torre de vigilância e destruiu duas câmeras. As Forças de Defesa de Israel (IDF) insistiram que "locais de infraestrutura e as forças da Unifil não são um alvo". Por meio de nota enviada à agência France-Presse (AFP), as IDF afirmaram que "realizam operações contra a organização terrorista do Hezbollah" no sul do Líbano. "Cada acidente contrário às regras será examinado em detalhe."
As tensões com a ONU e a escalada da ofensiva contra o Hezbollah coincidem com os preparativos de uma retaliação ao bombardeio com 200 mísseis balísticos do Irã contra Israel, em 1º de outubro. A emissora ABC News, dos Estados Unidos, ao citar uma fonte israelense, informou que o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu aprovou uma lista de alvos a serem atingidos no Irã. Não ficou claro se a retaliação envolverá a destruição de locais militares.
Em comunicado à imprensa, Jeanine Hennis-Plasschaert, coordenadora especial das Nações Unidas para o Líbano, afirmou que o ataque a Nabatiyeh "segue outros incidentes nos quais civis e infraestrutura civil têm sido atingidos" em território libanês. "Violações do direito humanitário internacional são totalmente inaceitáveis. Os civis e a infraestrutura civil devem ser protegidos todas as vezes", declarou.
De acordo com Jeanine, com o aumento da intensidade das trocas de tiros, o sofrimento da população civil atingiu um patamar sem precedentes. "É hora de todos os atores imediatamente cessarem o fogo e abrirem as portas para soluções diplomáticas, capazes de realizar as necessidades dos cidadãos e de avançar na estabilidade regional." As IDF asseguraram que visaram "dezenas de alvos do Hezbollah" em Nabatiyeh, incluindo "infraestruturas terroristas, centros de comando do Hezbollah e instalações de armazenamento de armas".
Debandada
Professor de história aposentado da Universidade Libanesa Americana (em Beirute), Habib C. Malik afirmou ao Correio que o Hezbollah está abalado com a dimensão da ofensiva israelense, e que seus combatentes estão em debandada no sul do Líbano. "A organização perdeu dois terços de seus estoques de mísseis em quase cinco semanas de combates, graças aos ataques cuidadosamente calibrados por Israel, segundo o ministro da Defesa israelense, Yoav Galant. No entanto, o Hezbollah ainda não terminou como ameaça armada e pode disparar mísseis, causar ferimentos, mortes e destruição, além de caçar seus oponentes", disse. "É fato que a intimidação do grupo está desmoronando. Até mesmo membros da comunidade xiita sitiada, forçados a fugir de seus vilarejos destruídos, no sul do Líbano, têm feito críticas ousadas e vocais ao Hezbollah", acrescentou.
Richard Falk, professor de direito internacional da Universidade de Princeton e relator especial da ONU para a Palestina Ocupada entre 2008 e 2014, disse à reportagem que é difícil especular sobre as motivações do Hezbollah e sua evidente determinação em resistir ao massacre ameaçado por Israel no estilo daquele visto na Faixa de Gaza. "Isso pode estar ligado ao assassinato de seu líder de longa data, o xeque Hassan Nasrallah, ou a uma sensação de uma luta santa no espírito da jihad ou de uma resposta islâmica coletiva ao genocídio perpetrado pelos israelenses", avalia.
Desde o início da ofensiva israelense contra o Hezbollah, em 23 de setembro, quase 700 mil libaneses foram forçados a fugir de casa. Uma contagem da AFP, com base em dados oficiais, calcula em pelo menos 1.373 os mortos no Líbano em 24 dias. Ontem, Israel voltou a bombardear bastiões xiitas no sul de Beirute.
"Outras comunidades libanesas — os cristãos, os sunitas e os drusos — apelam cada vez mais pela implementação da resolução 1559 da ONU, a qual fala sobre o desarmamento de todas as milícias no Líbano, tornando o Exército libanês a única instituição armada no país, sob o controle do Estado. O Hezbollah está pedindo um cessar-fogo, um claro sinald e que eles estão em má forma militar e comunitariamente. Israel não lhes dará um cessar-fogo antes de degradá-los ainda mais. Caso contrário, o Hezbollah retornará, em pouco anos, para perpetrar os mesmos horrores, se não piores."
Habib C. Malik, professor de história aposentado da Universidade Libanesa Americana (em Beirute)
"Não é de surpreender que Israel tenha falhado em derrotar o Hezbollah, apesar de uma série ataques à sua área de atuação no Líbano. A única maneira de superar o compromisso de um povo vitimado que luta
pela liberdade é envolver-se em operações genocidas comparáveis à forma como que vários projetos colonialistas ocidentais lidaram com a resistência dos povos nativos."
Richard Falk, professor de direito internacional da Universidade de Princeton e relator especial da ONU para a Palestina Ocupada entre 2008 e 2014
Utilizamos cookies próprios e de terceiros para o correto funcionamento e visualização do site pelo utilizador, bem como para a recolha de estatísticas sobre a sua utilização.