22 de Novembro de 2024

Hamas exige fim do conflito para libertar os 101 reféns restantes


O grupo terrorista palestino Hamas assegurou que a eliminação de seu líder, Yahya Sinwar, o tornará mais forte e descartou libertar os 101 reféns em seu poder até que Israel ponha fim à guerra na Faixa de Gaza. Sinwar foi morto na tarde de quarta-feira (16/10), durante uma operação de rotina do Exército israelense. Em vídeo, Khalil Al-Haya, vice-líder do Politburo (comitê político do Hamas), afirmou que Israel se arrependerá por ter matado Sinwar. "Os prisioneiros não retornarão, a menos que a agressão contra o nosso povo em Gaza pare", declarou.

Por sua vez, as Brigadas Ezedin al Qassam — braço armado do movimento — prometeram manter a luta até a "libertação da Palestina". Em nota, a Organização para a Libertação da Palestina (OLP) chorou a morte de Sinwar e exortou as facções palestinas a se unirem. "O comitê executivo da Organização para a Libertação da Palestina expressa suas condolências ao povo palestino e a todas as facções nacionais pelo martírio do grande líder nacional Yahya Sinwar, líder político do Hamas", afirmou.

Em nota enviada à reportagem, por meio do WhatsApp, Basem Naim, chefe do Departamento Político do Hamas, afirmou que Israel "acredita que matar os líderes (do grupo) significa o fim do movimento e da luta do povo palestino". "Eles podem acreditar no que quiserem. (...) Eles repetiram as mesmas declarações quando mataram o xeque Ahmed Yassin (2004); o Dr. Abdel Aziz Al-Rantisi (2004); e Salah Shehade, primeiro chefe das Brigadas Al-Qassam (2002). O Hamas, cada vez mais, tornou-se mais forte e popular, e essas lideranças se transformaram em ícones para futuras gerações", advertiu. "O Hamas é um movimento de libertação liderado pelo povo, que busca liberdade e dignidade, e isso não pode ser eliminado. Nós acreditamos que nosso destino seja um de duas coisas boas: a vitória ou o martírio."

Ao fim de uma visita à Alemanha, onde se reuniu com o chanceler Olaf Scholz (Alemanha); com o premiê Keir Starmer (Reino Unido); e com o homólogo Emmanuel Macron (França); o presidente dos EUA, Joe Biden, classificou a eliminação do terrorista como "uma oportunidade para buscar o caminho para a paz" no Oriente Médio. "Achamos que há uma possibilidade de trabalhar para um cessar-fogo no Líbano. E vai ser mais difícil em Gaza, mas concordamos que tem que haver um resultado, o que — o que acontece no dia seguinte", disse o democrata. 

O ex-presidente dos Estados Unidos e candidato do Partido Republicano à Casa Branca, Donald Trump, aplaudiu a eliminação de Sinwar e disse acreditar que o assassinato do terrorista aproxima a Faixa de Gaza da paz. "Penso que a torna (a paz) mais fácil. Estou contente de que Bibi (o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu) tenha decidido fazer o que tinha que fazer", declarou. 

Especialistas

Ramzy Mardini, pesquisador do Centro para Segurança Internacional e Cooperação da Universidade de Stanford, acha pouco provável que a eliminação de Sinwar tenha impacto para alterar as condições do Hamas para a libertação dos reféns. "A razão é muito simples: desconfiança e falta de um ator credível para executar um eventual acordo. A soltura dos sequestrados não colocará fim à guerra, sob a perspectiva de Israel. Se o Hamas libertar os reféns, Netanyahu aproveitará para traduzir a vitória política em mais munições, a fim de alimentar e prolongar a guerra. Isso porque ele não mais enfrentará pressões internas", explicou ao Correio, por e-mail. 

Ainda segundo Mardini, a morte de Sinwar dificilmente causará qualquer perturbação na frente militar do Hamas. Ele lembra que o grupo operava com uma estrutura fortemente descentralizada e aguardava a execução de seu líder há muito tempo. "Tenho certeza de que os procedimentos para a sucessão foram estabelecidos. Com uma longa história de líderes abruptamente mortos por Israel, a organização aprendeu a suportar e a operar, de forma a se antecipar a esses assassinatos. Poucas organizações armadas no mundo são tão resilientes à decapitação de sua liderança."

Apesar de reconhecer que Netanyahu tenha conquistado popularidade política a curto prazo, o especialista de Stanford alerta que, caso o premiê fracasse na libertação dos reféns, esses ganhos se evaporarão rapidamente. "Netanyahu está ficando sem desculpas. Foi um erro da parte dele alegar que a morte de Sinwar é o começo do fim. Pode ser apenas o começo do próximo capítulo da guerra." 

Cientista político iraniano-americano e especialista em Oriente Médio pela Universidade de Harvard, Majid Rafizadeh afirmou ao Correio que, assim como o asassinato de Ismail Haniyeh, a morte de Sinwar dificilmente abreviará a libertação dos reféns ou o fim da guerra. "Na verdade, tais assassinatos de alto perfil de líderes do Hamas podem provocar uma escalada ainda maior. Historicamente, o grupo respondeu a tais eventos com mais determinação e retaliação, em vez de oferecer concessões", observou. "Sinwar estava profundamente entrincheirado nas estratégias militares do Hamas, e sua morte pode encorajar o grupo a manter reféns por mais tempo como moeda de troca em negociações futuras."

Yahya Sinwar (foto), líder do Hamas e mentor do massacre de 7 de outubro de 2023, foi eliminado com um tiro na cabeça depois de um encontro surpresa com soldados israelenses no bairro de Tel Sultan, em Rafah, no sul da Faixa de Gaza, na tarde de quarta-feira. A informação foi divulgada por Chen Kugel, diretor do Instituto Nacional Forense de Israel, em entrevista ao jornal The New York Times. Kugel supervisionou a necropsia do corpo de Sinwar, em Tel Aviv.

Yahya Sinwar em foto de 30 de maio de 2019, na Cidade de Gaza
Yahya Sinwar em foto de 30 de maio de 2019, na Cidade de Gaza (foto: Mohammed Abed/AFP)

O especialista explicou que estilhaços de um míssil ou de projéteis disparados por um tanque atingiram o braço direito de Sinwar e provocaram uma hemorragia. O líder do Hamas tentou estancar o sangue usando um fio elétrico como torniquete improvisado. No entanto, o antebraço de Sinwar tinha sido esmagado e o fio não estava amarrado com força suficiente. A revelação de Kugel contraria a versão das Forças de Defesa de Israel (IDF), segundo a qual o extremista foi morto por um disparo de tanque. 

Ramzy Mardini, pesquisador do Centro para Segurança Internacional e Cooperação da Universidade de Stanford
Ramzy Mardini, pesquisador do Centro para Segurança Internacional e Cooperação da Universidade de Stanford (foto: Arquivo pessoal )

"A maneira como os momentos finais de Sinwar foram filmados por um drone e seu gesto desafiador até o fim, apesar de gravemente ferido, serão costurados na memória de todos os palestinos e de muitos no mundo árabe e muçulmano, em geral. Sinwar foi presenteado com um final parecido com um filme. Estou chocado que os israelenses tenham divulgado a filmagem, pois ela minou completamente sua própria narrativa e melhorou a imagem e a reputação de Sinwar entre os palestinos. Não foi a inteligência ou o planejamento israelense que levou à sua morte. Sinwar buscou o martírio de um guerreiro e conseguiu. Isso provavelmente fortalecerá a determinação e o recrutamento do Hamas."

Ramzy Mardini, pesquisador do Centro para Segurança Internacional e Cooperação da Universidade de Stanford

Majid Rafizadeh, cientista político iraniano-americano e especialista em Oriente Médio pela Universidade de Harvard
Majid Rafizadeh, cientista político iraniano-americano e especialista em Oriente Médio pela Universidade de Harvard (foto: Arquivo pessoal )

"A declaração do Hamas de que a morte de Sinwar fortaleceu o grupo visa manter a coesão interna e o moral do grupo. Ao declarar que somente libertará os reféns após a guerra, o Hamas reforçando o uso deles como ativos estratégicos, alavancando-os para prolongar o conflito e garantir concessões. Essa retórica também os posiciona como resilientes, apesar da perda de dois líderes importantes, Sinwar e Haniyeh. Na realidade, embora as perdas de liderança possam criar desafios temporários, a estrutura descentralizada e a determinação ideológica do Hamas significam que o grupo ainda pode funcionar, militar e politicamente, sem Sinwar e Haniyeh."

Majid Rafizadeh, cientista político iraniano-americano e especialista em Oriente Médio pela Universidade de Harvard 

Fonte: correiobraziliense

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