Antes mesmo de retornar à Casa Branca, o republicano Donald Trump começa a ter o caminho traçado para a impunidade. O presidente eleito responde a pelo menos seis casos na Justiça: fraude no valor de suas propriedades para pagar menos impostos; abuso sexual contra a escritora E. Jean Carroll; falsificação de documentos para ocultar propina à ex-atriz pornô Stormy Daniels; posse de documentos confidenciais da Casa Branca; tentativa de manipular as eleições de 2020, na Geórgia; e tentativa de permanecer no poder após a derrota para Joe Biden, com a incitação de seus simpatizantes a invadirem o Capitólio, em 6 de janeiro de 2021.
Nesta sexta-feira (8/11), a juíza do caso contra Trump por conspiração para reverter os resultados eleitorais de 2020 acatou o pedido do procurador especial, Jack Smith, e suspendeu todos os prazos do calendário prevista para os trâmites no tribunal. Smith alegou a necessidade de dar à acusação "tempo para analisar essa situação sem precedentes e determinar o rumo a seguir em conformidade com a política do Departamento de Justiça". A previsão é de que Smith apresente "o resultado das deliberações" até 2 de dezembro.
O ataque ao Capitólio também pode ficar impune. Os acusados pela invasão aguardam um indulto presidencial. Nas últimas 72 horas, advogados de vários deles entraram com recursos pedindo o adiamento da audiência, uma tentativa de atrasar a leitura da sentença, apesar de terem sido declarados culpados.
Segundo a agência France-Presse, Anna Lichnovski, uma das acusadas, contra quem os promotores pediram um ano de prisão, recorreu, sem sucesso, ao juiz para que adiasse a sentença, marcada para a sexta-feira "após a posse" de Trump, "a fim de permitir que ela solicite um indulto presidencial". Durante a campanha eleitoral, o republicano chegou a descrever o 6 de janeiro de 2021 como "o dia do amor" e do "transbordamento de afeto" por ele.
Perdão
O iraniano-americano Neama Rahmani, ex-procurador federal e advogado, disse ao Correio que, com o retorno à Casa Branca, os problemas de Trump e dos réus condenados por invadirem o Capitólio deixarão de existir. "Espero que Trump cumpra com a promessa e perdoe os acusados pelo ataque ao Congresso, ao menos aqueles que não se engajaram em atos de violência", afirmou.
Ele ressaltou que um presidente em exercício não pode ser processado. "O caso envolvendo a tentativa de manipulação das eleições de 2020, na Corte Distrital do Distrito de Colúmbia, será encerrado. O Departamento de Justiça também abandonará a apelação contra o arquivamento do caso envolvendo a posse ilegal de documentos confidenciais da Casa Branca na mansão de Mar-a-Lago, na Flórida", explicou Rahmani. Segundo ele, se por algum motivo, o procurador especial Jack Smith se recusar a encerrar os casos, Trump poderá ordenar que o procurador geral o demita.
Quanto ao caso envolvendo a fraude de documentos para ocultar o pagamento de suborno para a ex-atriz pornô Stormy Daniels, uma tentativa de silenciá-la sobre um relacionamento extraconjugal, Rahmani disse ter dúvidas de que o juiz Juan Merchan sentencie Trump à prisão. "A vitória do republicano nas eleições torna uma detenção logisticamente impossível. Certamente, Trump não cumprirá uma pena de prisão em momento algum", comentou.
Ex-procurador federal para o Distrito Sul de Nova York, Roland Riopelle aposta que Trump buscará a impunidade. "Os casos federais serão encerrados, enquanto os casos estaduais serão suspensos", admitiu ao Correio. "Quanto ao caso da invasão ao prédio do Congresso, acho que Trump perdoará os réus. Durante a campanha, ele anunciou que tomaria a medida. Eu acredito que ele, provavelmente, o fará." Por sua vez, Ronald Sievert — professor da Faculdade Bush de Governo e Serviço Público da Universidade Texas A&M — concorda com os colegas que os casos investigados por Jack Smith serão derrubados. Segundo ele, a acusação pelo pagamento de propina a Stormy Daniels tem "camadas de erro reversível". "O juiz chegará a uma sentença, o caso irá à apelação, e o presidente provavelmente ganhará o recurso. Os erros no julgamento são descarados e prejudicias", observou.
"Trump não precisará conceder o autoperdão. Ele instruirá o Departamento de Justiça a encerrar os casos contra ele. A respeito dos casos estaduais em Nova York (envolvendo Stormy Daniels) e na Geórgia, Trump não poderá se perdoar, pois a premissa envolveria casos federais. Na teoria, os casos permanecerão vivos. Na prática, serão suspensos. Nenhum juiz quer agir contra um presidente em exercício."
Roland Riopelle, ex-procurador federal para o Distrito Sul de Nova York
"Trump tentou levar o caso de suborno para uma Corte Federal ou anulá-lo, pois o juiz permitiu que atos oficiais fossem usados como evidências, incluindo seus tuítes enquanto presidente. A decisão da Suprema Corte sobre a imunidade presidencial foi muito ampla. Não só os ex-presidentes não podem ser processados por atos oficiais, mas a opinião maioritária sustenta que atos oficiais não podem nem sequer ser apresentados em julgamento."
Neama Rahmani, ex-procurador federal e advogado nos Estados Unidos
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