21 de Novembro de 2024

Dos palcos aos cofres públicos: o impacto financeiro de shows internacionais


Os fãs brasileiros são conhecidos por estarem entre os mais calorosos do mundo — o país sabe receber artistas internacionais com muito amor, pão de queijo e a famosa caipirinha. Bruno Mars que o diga: em 2024, o cantor passou mais de um mês no Brasil e encantou o público das 14 apresentações que fez. Um pouco antes, em maio, Madonna movimentou mais de um milhão de pessoas no show de encerramento da The Celebration Tour, na praia de Copacabana. 2024 também foi ano de Rock in Rio, que trouxe nomes como Katy Perry, Shawn Mendes, Akon e Cindy Lauper.

É por meio dos shows que os fãs conseguem uma oportunidade de apreciar seu artista favorito, da mesma maneira que os cantores têm a chance de se conectar com o público. Mas, além do entretenimento, quais outros benefícios os shows proporcionam ao país? Cada evento movimenta uma cadeia econômica, cultural e gastronômica no local que é sediado. O turismo também é beneficiado, visto que muitas pessoas se deslocam para assistir a um show.

Luciana Resende Borges, professora voluntária da Universidade de Brasília, no Centro de Excelência em Turismo, destaca que os espetáculos movimentam a hotelaria com o aumento das taxas de ocupação, atrativos turísticos, gastronomia e transporte. “Impulsionam a economia, inclusive a economia criativa como cultura, artesanato, produtores locais, empreendedores locais, moda, comunicação no sentido de produções audiovisuais e de conteúdo sobre o evento, enfim, uma cadeia mercadológica”.

Além do público local, há um aumento de visitantes estrangeiros que se deslocam com a finalidade de acompanhar um artista querido. “Observa-se também o movimento de turistas entre os estados brasileiros e de países vizinhos (latino-americanos) que vem para o Brasil com a intenção de assistirem shows internacionais, como atrações de países norte-americanos, europeus, por exemplo, estimulando o turismo no Brasil”, explica Luciana.

A especialista também observa que os espetáculos dão vozes aos artistas locais quando são inseridos como atratividade, seja abrindo um show principal ou em atividades/programações paralelas. “Globalizar as opções de shows no país causa impactos culturais positivos, proporciona experiências a população brasileira que muitas vezes não teria acesso aos shows internacionais se fossem fora do país”.

A realização de shows contribui significativamente com a economia nacional. Com o show de Madonna, que foi realizado de forma gratuita, o lucro para o Rio de Janeiro foi de mais de R$ 300 milhões. Segundo dados do próprio governo carioca, foram desembolsados cerca de R$ 20 milhões pelo estado e Prefeitura, além de R$ 40 milhões da iniciativa privada. O evento reuniu aproximadamente 1,6 milhão de pessoas em Copacabana, sendo que 150 mil eram turistas nacionais e internacionais. O setor hoteleiro também lucrou, obtendo 96% de ocupação.

“Os shows internacionais trazem visibilidade ao país porque estimulam a procura pela cidade que os sediam como destino turístico, o que pode causar investimentos públicos, políticas públicas, para o local sede que precisa ter estrutura, capacidade de carga e acolhimento, como chamamos no planejamento dos eventos. Estes fatores trazem benefícios diretos à sociedade, pois os investimentos para que o show aconteça de forma assertiva, ficam para usufruto da comunidade, trazendo uma imagem propositiva do país como receptivo às atividades culturais diversas”, explica Luciana Resende.

E não foi apenas Madonna que movimentou a economia carioca. Segundo dados da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano e Econômico (SMDUE), em novembro de 2023 a popstar Taylor Swift rendeu R$ 158 milhões aos cofres, com os shows da The Eras Tour. O Rio também recebeu a final da Libertadores no Maracanã e os shows das bandas Red Hot Chili Peppers e RBD que, juntos, incrementaram a economia em R$ 669,2 milhões, considerando as atividades de turismo e eventos. Em março, a banda Coldplay também se apresentou no Brasil, impactando em R$ 86,3 milhões.

Já o evento que mais gerou dinheiro ao governo carioca em 2024 foi o Rock in Rio que, em sete dias, gerou R$ 2,6 bilhões. A taxa de ocupação de hotéis atingiu 95%, e o movimento na rodoviária do Rio foi 40% maior que o normal, com 226 mil passageiros circulando. No Aeroporto Internacional do Galeão, 380 voos extras foram registrados, transportando 47 mil passageiros nos dias de evento. Também houve um aumento de público de 30% em relação a edição de 2022. Os dados foram concedidos pelo governo fluminense para a Agência Brasil.

Rock in Rio
Rock in Rio (foto: Reprodução/Instagram/@rockinrio)

O fim de 2024 foi marcado pela presença calorosa de Bruno Mars no Brasil. O fenômeno da música pop fez 14 shows, passando por cinco cidades brasileiras: Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Belo Horizonte e Brasília.

De acordo com a Secretaria de Turismo do DF, a bilheteria dos dois shows realizados na capital federal bateu 60 mil pessoas por dia, ou seja, 120 mil no total, movimentando R$ 200 milhões na economia. Já os hotéis, de acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH), tiveram 91% de ocupação no final de semana que ocorreram as apresentações.

Em São Paulo, o lucro foi de R$ 102,7 milhões, obtido apenas com turistas do interior paulista e de outros estados, apontam dados da São Paulo Turismo (SPTuris). A empresa de eventos e turismo da Prefeitura de SP considera que, dos 409 mil ingressos, 15% foram comprados por não residentes na capital – 61,4 mil pessoas, média de pouco mais de 10 mil por show. Não foram considerados os gastos dos moradores da cidade, locação de espaço e montagem.

Para chegar ao resultado, a SPTuris utilizou como referência o valor gasto pelos turistas em shows internacionais e festivais. Na simulação, cada visitante gastou R$ 1.672 com hospedagem, transportes, alimentação e compras na cidade.

Gustavo Pires, presidente da SPTuris, comemorou o retorno financeiro. “O entretenimento, como motor para a atração de turistas, apresenta bons resultados desde 2022. A cidade consegue reunir qualidades únicas: bons espaços, mercado consumidor e uma rede de apoio qualificada que vai da conexão aérea com todos os estados e dezenas de países às dez rodovias, de hotéis econômicos aos mais luxuosos, da eficiência do serviço de transportes às compras. Com isso, são criados milhares de empregos todos os anos e, em 2024, o acumulado já é positivo em mais de 17 mil vagas no setor”, explicou.

O Correio Braziliense entrou em contato com os governos do Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Curitiba para obter dados sobre os shows de Bruno Mars, mas não obteve respostas.

Os eventos também são oportunidades para vendedores que aproveitam a ocasião para trabalhar. Além de ganhos para instituições públicas e privadas, os vendedores ambulantes se beneficiam diretamente do movimento ocasionado pelos shows internacionais — comercializando desde alimentos a produtos personalizados nas portas dos estádios, teatros e casas de shows. “Teriam que ter vários shows ao longo do ano, não só internacionais como nacionais, pois é uma forma de complementar a renda”, afirma Ezequiel Rodrigues de Castro, vendedor ambulante de Brasília.

No entanto, nem sempre o cenário é positivo. A privatização dos espaços em que ocorrem as apresentações resulta em um afastamento dos comerciantes das áreas de maior movimento, como explica Cristiane Carvalho Mendes, vice-presidente do Sindicato dos Vendedores Ambulantes do Distrito Federal (Sindvamb-DF).

“Temos lucro quando há acessibilidade do governo para disponibilizar o espaço próximo à entrada dos eventos. Como a Arena BRB, o Nilson Nelson e o Centro de Convenções [Ulysses Guimarães] são áreas públicas que foram privatizadas, os ambulantes são colocados cada dia mais em um espaço longe dos eventos, e isso inviabiliza um pouco a comercialização do produto. O cliente já estaciona o carro longe, muitas vezes não fica em uma área de acesso. O que é interessante para o vendedor ambulante é que ele fique próximo às entradas, para que possa ter ganhos maiores”, expõe.

Para cada evento, a coordenadoria executiva da cidade realiza um chamamento público, o qual elege os ambulantes aptos a trabalharem na data definida. No DF, a Secretaria de Estado de Governo abriu 80 vagas para os vendedores que desejavam trabalhar na área externa dos shows de Bruno Mars, 40 para cada data de apresentação. Em cada dia, 25 ambulantes ocuparam uma área descampada, em frente ao estádio Mané Garrincha, e outros 15 estiveram no estacionamento do planetário de Brasília. Todos os vendedores deveriam obrigatoriamente atender em barracas.

“Mas esse número de chamamentos na área externa não é compatível com o público de um show. Isso diminui o lucro porque o vendedor ambulante não tem possibilidade de venda na melhor área para o público”, afirma Mendes. “Não é só colocar um palco, um banheiro químico e um show. Tem outras pessoas que estão envolvidas com recursos públicos que podem ser incluídas no orçamento”.

Ezequiel, por sua vez, concorda que a quantidade de ambulantes escolhida via chamamento público é pequena, porém acredita no consenso entre os vendedores e a coordenadoria executiva das cidades. “Fora do estádio, a coordenadoria dá poucas autorizações pela quantidade de ambientes externos, mas também não dá para colocar 100 ambulantes, pois daí ninguém vende quase nada. São duas vias: temos que ter consenso entre as partes”, explica.

Ao Correio, a Secretaria Executiva das Cidades do DF informou que “o quantitativo de vagas para ambulantes é definido em reunião com diversos órgãos do Governo do Distrito Federal, inclusive os de segurança pública, com o objetivo de garantir segurança, organização e comodidade da população”.

Equipe de Ezequiel preparando lanches para serem vendidos no show
Equipe de Ezequiel preparando lanches para serem vendidos no show (foto: Arquivo pessoal)

Uma das explicações para o interesse do público nos shows em 2024 foi o retorno dos eventos após a pandemia de covid-19, onde a população passou cerca de dois anos sem contato com eventos públicos. “Quando os eventos foram liberados pelos órgãos de saúde existia uma necessidade social de proximidade humana, de convívio cultural, o que desencadeou a alta procura pelas atividades de entretenimento, compartilhando experiências de contato entre as pessoas e de extravasamento de emoções contidas pelo tempo de distanciamento social”, explica a professora Luciana Resende Borges.

Apesar da grande animação inicial, a especialista acredita que a procura por shows vai continuar e que o público não perderá o interesse em assistir os artistas se apresentando. “O humano é um ser social, precisa estar inserido numa sociedade de contato. O virtual por si só não supre isso por inteiro, porque há uma tela (seja celular ou computador) entre os indivíduos, pode ajudar como uma alternativa a ser escolhida e não imposta. Tem relação com a querencia humana de viver o novo espaço, o cheiro, a escuta, enfim, as sensações, por mais que demande algum investimento financeiro de compra do ingresso”, ressalta Luciana.

Para o próximo ano, diversos nomes da música mundial já confirmaram eventos no Brasil. A agenda conta com Olivia Rodrigo, Shakira, Twenty One Pilots, Shawn Mendes, Oasis, Alanis Morissette e Justin Timberlake. Em 2025, também ocorrerão os festivais Lollapalooza e The Town, ambos em São Paulo. Katy Perry, que esteve no Brasil neste ano para o Rock in Rio, retornará ao Brasil para se apresentar no The Town, e também fará dois shows solo, um em Brasília e outro em Curitiba.

Donovan Ferreti, diretor executivo da Ticketmaster no Brasil, empresa responsável por vender os ingressos dos shows, comemorou o cenário cultural no país em 2024. “Estamos muito animados com a forma entusiasmada como os fãs abraçaram os eventos ao vivo em 2024. Foi um ano incrível, com alta demanda e recordes de vendas para shows de artistas como Bruno Mars e Caetano & Bethânia, além de festivais inesquecíveis como o Rock in Rio”, disse.

O diretor acredita que o calendário de 2025 será “igualmente emocionante”. “Olhando para 2025, esperamos um calendário igualmente emocionante, com os fãs brasileiros ansiosos pelos próximos eventos. Já estão disponíveis ingressos para os shows da Shakira no Rio de Janeiro e em São Paulo, em fevereiro; e o Lollapalooza Brasil, que acontecerá de 28 a 30 de março em São Paulo. Além disso, estamos nos preparando para o Oasis, que fará apresentações exclusivas em São Paulo nos dias 22 e 23 de novembro de 2025. E isso é só o começo — mais anúncios são esperados até o final do ano”, concluiu.

Após o grande show de Madonna no Rio de Janeiro, o prefeito Eduardo Paes pretende repetir a dose e realizar um novo espetáculo gratuito nas areias de Copacabana. Em 12 de outubro, Paes sugeriu alguns nomes: Beyoncé, Lady Gaga, Adele e a banda U2. Em seu perfil no X, o político pediu a ajuda dos internautas para decidir. “Estou decidindo aqui… Dá aí a sua opinião”, escreveu. a publicação contou com mais de 55 mil curtidas e 18 mil comentários.

Eduardo Paes sugeriu nomes para uma futura apresentação em Copacabana
Eduardo Paes sugeriu nomes para uma futura apresentação em Copacabana (foto: Reprodução/X/@eduardopaes)

Fonte: correiobraziliense

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