21 de Novembro de 2024

5 assuntos para ficar de olho no encontro do G20 no Rio


A partir desta segunda-feira (18/10), chefes de Estado das maiores economias do mundo estarão reunidos no Rio de Janeiro para a cúpula do G20.

Esta é a primeira vez que o evento é realizado no Brasil, que está na presidência temporária do grupo desde o fim de 2023.

Fazem parte do grupo, além do Brasil: Estados Unidos, China, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália, Rússia, Índia, Canadá, Coreia do Sul, Arábia Saudita, México, Argentina, Turquia, Indonésia, Austrália e África do Sul.

Originalmente, são esses 19 países somados à União Europeia — daí o nome G20 (Grupo dos 20). Em 2023, também foi incorporada ao grupo a União Africana, que reúne os 55 países e territórios da África.

Além dos membros, a cúpula do Rio conta ainda com 19 convidados, entre eles Espanha, Portugal, Chile, Colômbia, Emirados Árabes e Angola.

O encontro, que termina na terça-feira (19/10), representa a conclusão dos trabalhos conduzidos pelo Brasil na liderança.

Nele, os chefes de Estado "aprovam os acordos negociados ao longo do ano, e apontam caminhos para lidar com os desafios globais", segundo a organização do evento.

Mas, além dos acordos, um encontro com as maiores potências do mundo também desperta a atenção pela configuração da geopolítica mundial — num mundo em que guerras violentas têm sido duradouras; em que Donald Trump está prestes a voltar ao poder nos EUA; e em que as mudanças climáticas têm deixado vítimas em tragédias ao redor do mundo.

Reunimos aqui cinco pontos para ficar de olho no encontro que acontece no Museu de Arte Moderna (MAM), no centro do Rio.

Neste um ano de presidência no G20, o Brasil apostou em temas com maior potencial de convergência entre os países, como o combate à fome e a desigualdade — deixando de lado pontos sensíveis aos diversos integrantes, como os conflitos na Ucrânia e no Oriente Médio.

Além do combate à fome, o Brasil estabeleceu mais duas prioridades: a transição energética e desenvolvimento sustentável; e a reforma da governança global, no sentido de contemplar a nova configuração de poder global em organizações com as Nações Unidas (ONU).

Diplomatas ouvidos pela BBC News Brasil apontam que a agenda que mais avançou foi a do combate à fome e à pobreza.

No primeiro dia da cúpula, o presidente Lula (PT) deverá lançar aquela que é considerada a principal entrega do país durante a presidência do G20: a Aliança Global Contra a Fome.

Trata-se de um mecanismo que pretende facilitar o acesso de países pobres ou em desenvolvimento a financiamento e a políticas públicas voltadas para a redução da fome e da pobreza.

"Não há país que considere que retirar 733 milhões de pessoas da situação de fome seja algo negativo", disse o embaixador e secretário de Assuntos Econômicos e Financeiros do Ministério das Relações Exteriores, Maurício Lyrio, principal negociador brasileiro no G20.

Para financiar esta pauta e outras que considera importante, o Brasil tem defendido a taxação dos super-ricos e das grandes fortunas no mundo.

A BBC apurou que o documento final da cúpula deve ter uma menção inédita a essa proposta, mas acompanhado de uma ressalva sobre uma discordância do governo da Argentina.

Em julho, os ministros de finanças do G20 aprovaram um documento defendendo a adoção de políticas de tributação progressiva, inclusive sobre os chamados “ultrarricos”.

Mas, segundo fontes, o presidente argentino, Javier Milei, tentou fazer mudanças nesse texto, que apontava para importância de discutir essa taxação.

"Possivelmente, ele não vai referendar essa proposta brasileira em particular para viabilizar o financiamento", prevê a cientista política e especialista em relações internacionais Ariane Roder, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Ainda assim, o governo brasileiro ainda considera uma vitória ter conseguido o apoio da quase totalidade do G20 à inclusão do tema no documento.

Vale lembrar que o G20 não tem caráter decisório — ou seja, não há garantias de que os países adotem, de fato, o que foi decidido durante a cúpula.

As outras duas prioridades estabelecidas pela presidência brasileira, a reforma da governança global e transição energética, também resultaram em declarações ministeriais antes da cúpula do Rio, mas a avaliação dos especialistas e de diplomatas estrangeiros ouvidos em caráter reservado é de que os resultados nestes campos serão mais limitados.

A Argentina chega ao encontro do G20 como um país que pode impedir o avanço de declarações consensuais — em que todos os países concordam.

Nos trabalhos de ministros que antecedem o início oficial da cúpula, os argentinos já se recusaram a assinar um documento sobre igualdade de gênero e empoderamento das mulheres, argumentando que isso entra numa "pauta de costumes".

Mesmo fora do G20, em outros encontros globais, a Argentina tem se apresentado numa postura de divergência.

Na Organização das Nações Unidas (ONU), nesta semana, o país foi o único a votar contra uma resolução sobre os direitos dos povos indígenas.

O governo Milei também retirou a sua já pequena delegação da 29ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP 29), que está sendo realizada em Baku, no Azerbaijão.

Milei chega ao Brasil após ser o primeiro líder a encontrar o recém-eleito presidente Donald Trump nos Estados Unidos. Os dois estiveram na cúpula do Comitê de Ação Política Conservadora (CPAC), na mansão de Mar-a-Lago, propriedade do presidente eleito.

Em declarações à imprensa argentina, Milei já disse que Trump o chamou de seu "presidente favorito": "Ele me disse que eu não ficaria mais sozinho", disse o argentino.

A expectativa é de que Milei seja um porta-voz do movimento da extrema-direita global e trará encaminhamentos que são consensuais entre ele e Trump, avalia Ariane Roder, da UFRJ.

"Há a possibilidade de discursos antimultilateralismo (ser contra o princípio de cooperação entre vários países para alcançar objetivos comuns), de cunho negacionista climático e evitando comprometimentos mais assertivos sobre a transição enérgica", prevê.

"Pode haver uma pressão para que Milei não se isole em relação às temáticas, já que Trump ainda não está na reunião, mas certamente ele não vai levar a cabo nenhum comprometimento", completa Roder.

Ou seja, nos três temas gerais defendidos pelo Brasil, o presidente argentino deve ser uma voz contrária.

A vinda de Milei também ocorre logo após a demissão da ministra das Relações Exteriores da Argentina, Diana Mondino, no fim de outubro, quando ela votou contra o embargo dos EUA a Cuba na ONU.

Diplomatas do Brasil enxergavam Mondino como uma "adulta na sala", com boa interlocução com o chanceler brasileiro, Mauro Vieira, e uma peça fundamental nas relações com a Argentina.

A cúpula também marcará a primeira vez de Milei e Lula juntos — os dois não mantêm conversas e o presidente brasileiro já disse que o argentino "deve desculpas" a ele. Não deve haver, porém, um encontro bilateral.

Milei já chamou Lula de "corrupto" e "idiota", mas chegou a agradecer o Brasil neste ano por assumir o controle da embaixada argentina em Caracas, após as eleições na Venezuela.

O atual presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, chega ao Brasil num momento em que está enfraquecido após as eleições americanas.

Biden será presidente da maior economia mundial até janeiro de 2025, quando entregará a chave da Casa Branca a Trump, que teve uma vitória contundente na disputa contra a vice-presidente, Kamala Harris.

Na avaliação da pesquisadora Ariane Roder, da UFRJ, o atual governo americano deve usar a cúpula do G20 para marcar suas posições em contraposição ao próximo governo Trump.

"Nada que Biden falar no Rio significará tomada de decisão nos Estados Unidos, mas ele falará para os democratas, marcando uma posição de que não existe consenso nos EUA em questões polêmicas", diz Roder.

"O G20 terá peso simbólico para a política interna dos EUA, mas a comunidade internacional já sabe muito bem o posicionamento de Trump", completa.

Antes do encontro no Rio, Biden fez uma visita a Manaus, no Amazonas, tornando-se o primeiro presidente americano em exercício a visitar a Floresta Amazônica. A visita amazônica é considerada um desfecho simbólico para um enredo de desacertos na pauta ambiental e climática entre Lula e Biden.

Com Trump de volta à Casa Branca, a expectativa é de que os Estados Unidos se tornem mais uma vez um "adversário" do chamado multilateralismo — ou seja, da ideia de que a governança global e a solução de assuntos internacionais decorram do funcionamento de fóruns como o G20 e órgãos como a ONU.

É nesse "vazio" que os EUA vão deixar nesses encontros que a China pode assumir um papel de mais protagonismo.

"Hoje, a gente não fala mais de um mundo hegemônico, a gente fala em vários polos de poder, sendo a China o principal representante disso", avalia a pesquisadora Ariane Roder.

Fontes consultadas pela BBC esperam que os chineses se posicionem cada vez mais como uma liderança na questão da transição energética e combate às mudanças climáticas.

A China é o país que mais contribui com emissões de gases do efeito estufa, mas tem feito esforços para reverter o quadro.

O país está aumentando rapidamente a capacidade de gerar energia eólica e solar e atingiu a maior redução da poluição do meio ambiente num período de sete anos. Também tem dado um grande espaço a veículos elétricos, menos poluentes.

Em artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo no domingo (17/11), o presidente chinês, Xi Jinping, escreveu que "é necessário impulsionar a cooperação internacional aprofundada em áreas como desenvolvimento verde e de baixo carbono, proteção ambiental".

Um dia após o fim do G20, na quarta-feira (20/11), Xi Jinping viaja a Brasília para ter um encontro bilateral com o presidente Lula. É o primeiro encontro dos dois no Brasil desde a volta de Lula ao Palácio do Planalto.

A China é o principal parceiro comercial brasileiro e tem ganhado espaço de influência na América Latina de uma maneira geral, tomando espaços antes ocupados pelos EUA.

Antes de vir ao Brasil, Xi visitou o Peru, onde inaugurou o que em alguns anos será maior porto comercial da América do Sul. O complexo portuário de Chancay, a 70 km de Lima, é liderado pela companhia marítima estatal chinesa Cosco Shipping Company e tem investimentos totais estimados cerca de R$ 19,7 bilhões.

Um dos imbróglios para prestar atenção nesta cúpula do G20 é saber como o comunicado divulgado ao fim do encontro vai abordar a guerra na Ucrânia e os conflitos no Oriente Médio (não só em Gaza, mas também no Líbano).

Na última cúpula do G20, em Nova Déli, na Índia, essa discussão já esteve presente na mesa de negociação. No fim, o comunicado criticou "invasões territoriais" e lamentou o impacto da guerra da Ucrânia na economia mundial.

O texto, porém, não citou resolução aprovada na ONU que condenava expressamente a invasão da Ucrânia e pedia a imediata retirada das tropas russas. Também há uma parte que ressaltou as divergências dentro do G20: "Houve diferentes pontos de vista e avaliações da situação".

O presidente americano, Joe Biden, chega ao Rio logo após a revelação de que ele autorizou a Ucrânia a usar mísseis americanos de longo alcance para atacar a Rússia.

Com a notícia, diplomatas agora esperam que a guerra na Ucrânia domine mais as discussões. Todos os olhares estarão voltados para a resposta de Sergei Lavrov, ministro das Relações Exteriores da Rússia, que estará no Rio de Janeiro em vez do presidente Putin.

O encontro no Rio também será o primeiro após o início da guerra em Gaza. Ou seja, há muitos interesses em jogo.

Enquanto países europeus e os EUA se colocam incisivamente contra a invasão russa na Ucrânia, o mesmo não pode ser dito sobre os ataques de Israel a Gaza e ao Líbano, um assunto que é mais grave para países como Arábia Saudita e Turquia.

Na última semana, o príncipe e líder saudita, Mohammed bin Salman, classificou como "genocídio" as ações de Israel contra o povo palestino. Já o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, tem sido um dos maiores críticos das ações israelenses no Oriente Médio.

Diante de tantos interesses em jogo, muito trabalho terá que ser feito para chegar à redação final do texto. Nos bastidores, fontes disseram à BBC que estão tentando encontrar termos que consigam contemplar os dois conflitos de uma forma que não seja "condenação".

O Brasil, como o presidente e mediador deste encontro, terá um papel fundamental para encontrar um consenso.

A cúpula do G20 ocorre num momento em que o Brasil tem sido manchete em jornais pelo mundo por casos de violência.

Primeiro, a morte de um delator e ex-membro do PCC (Primeiro Comando da Capital) em pleno Aeroporto de Guarulhos (SP), o maior terminal de passageiros e principal porta de entrada do Brasil.

Segundo, as explosões de bombas nas proximidades do Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília, cometidas por um homem que morreu no local.

Mas os casos não têm levantado maiores preocupações sobre a segurança do evento no Rio, segundo fontes consultadas pela BBC.

"Claro que, num mundo de tensão como é hoje, os riscos adicionais são incrementados. Mas o Brasil historicamente se coloca como um lugar amistoso, onde esses encontros podem acontecer", diz Ariane Roder, da UFRJ.

Apesar de casos frequentes de violência urbana, o Rio de Janeiro também é uma cidade acostumada a receber grandes eventos, como os Jogos Olímpicos de 2016.

Cerca de 25 mil agentes, entre eles 8 mil homens das Forças Armadas, vão participar do esquema especial de segurança na cidade.

Fonte: correiobraziliense

Participe do nosso grupo no whatsapp clicando nesse link

Participe do nosso canal no telegram clicando nesse link

Assine nossa newsletter
Publicidade - OTZAds
Whats

Utilizamos cookies próprios e de terceiros para o correto funcionamento e visualização do site pelo utilizador, bem como para a recolha de estatísticas sobre a sua utilização.