A Polícia Federal (PF) indiciou Jair Bolsonaro e outras 36 pessoas por suspeita de uma tentativa de golpe de Estado para manter o ex-presidente no poder após as eleições de 2022.
Entre os indiciados também estão o general Walter Braga Netto, que foi candidato a vice-presidente na chapa derrotada com Bolsonaro em 2022, e o general Augusto Heleno, que chefiou o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) durante o governo de Bolsonaro.
O relatório final com a conclusão da investigação foi encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF) e acusa os indiciados pelos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa.
A PF diz ter obtido provas que comprovam tais crimes ao longo da investigação que já dura quase dois anos, por meio da quebra de sigilos telemático, telefônico, bancário, fiscal, colaboração premiada, buscas e apreensões, entre outras medidas devidamente autorizadas pelo poder Judiciário.
As investigações apontaram que os investigados se estruturaram por meio de divisão de tarefas, o que permitiu a individualização das condutas e a constatação da existência dos seguintes grupos:
a) Núcleo de Desinformação e Ataques ao Sistema Eleitoral;
b) Núcleo Responsável por Incitar Militares à Aderirem ao Golpe de Estado;
c) Núcleo Jurídico;
d) Núcleo Operacional de Apoio às Ações Golpistas;
e) Núcleo de Inteligência Paralela;
f) Núcleo Operacional para Cumprimento de Medidas Coercitivas
Com a entrega do relatório, a PF encerrou as investigações do caso.
Em 8 de janeiro de 2023, apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) invadiram e vandalizaram as sedes dos Três Poderes em Brasília: Congresso Nacional, Palácio do Planalto e Supremo Tribunal Federal.
Vários daqueles que participavam do ataque carregavam cartazes e diziam palavras de ordem pedindo intervenção militar e ofendendo o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, que conduz vários inquéritos tendo como alvo apoiadores de Bolsonaro.
No 8 de janeiro, equipamentos e obras de arte dos prédios governamentais foram destruídos.
O ataque ocorreu apenas uma semana depois da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que derrotou Bolsonaro nas urnas na eleição mais estreita da história do país: 50,9%, a 49,1%.
Jair Bolsonaro não reconheceu imediatamente sua derrota, rompendo uma tradição política em que candidatos se manifestam publicamente logo após a divulgação do resultado da eleição.
Quando finalmente se pronunciou, 40 horas depois do resultado, ele Bolsonaro deu uma declaração ambígua, afirmando: "Os atuais movimentos populares são fruto de indignação e sentimento de injustiça de como se deu o processo eleitoral. As movimentações pacíficas sempre serão bem vindas, mas os nossos métodos não podem ser o da esquerda, que sempre prejudicaram a população".
Os atos do 8 de janeiro foram o cúmulo da movimentação de bolsonaristas nas redes sociais e em acampamentos espalhados pelo país, reunindo apoiadores do ex-presidente insatisfeitos pela não reeleição de Bolsonaro e mobilizados por notícias falsas que apontavam, entre outras coisas, falhas no sistema eleitoral nunca comprovadas.
Muitos tinham esperança em uma intervenção militar que pudesse impedir o governo Lula de ir à frente, por isso vários desses acampamentos foram montados próximos a quartéis.
Um relatório da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (DF) registrou que tentativas das forças do DF de desmontar os acampamentos foram impedidas pelas Forças Armadas.
Em relatório recente, a Polícia Federal destacou falhas "evidentes" na segurança do DF durante os ataques, como a omissão de policiais militares do DF em posição de comando, permitindo que a vandalização fosse à frente; e a ausência do então secretário de Segurança do DF, Anderson Torres, que havia viajado para o exterior na data.
Torres foi ministro de Justiça durante o governo Bolsonaro. Ele chegou a ficar preso preventivamente em 2023. Ele responde a vários processos, inclusive no STF, e é alvo de investigações.
Em nota divulgada logo após uma tentativa de remoção dos acampados em 28 de dezembro, as Forças Armadas afirmaram que a ordem para interromper a ação fora dada "no intuito de manter a ordem e a segurança de todos os envolvidos".
O acampamento em frente ao quartel-general (QG) do Exército em Brasília se tornou um dos maiores do país. Dali, partiu uma marcha de quase 8 km até a Praça dos Três Poderes no dia dos ataques de 8 de janeiro.
Cerca de 4 mil pessoas desembarcaram em Brasília nos dias anteriores ao 8 de janeiro, respondendo a convocações que circularam nas redes sociais.
Até 8 de novembro de 2024, de acordo com o STF, 265 pessoas já foram condenadas por crimes relacionados ao 8 de janeiro. Quatro pessoas foram absolvidas e outras ainda serão julgadas.
Houve 223 condenações pelos crimes mais graves, que envolveram a depredação do patrimônio.
Outras 476 pessoas firmaram acordos de não persecução penal, em que confessam crimes e se comprometem a:
A depredação das sedes dos Três Poderes levou à detenção de mais 2 mil pessoas nos dias 8 e 9 de janeiro, das quais cerca de 1,4 mil permaneceram presas nas primeiras semanas de 2023.
A PGR conduziu inquéritos, fazendo investigações em parceria com a Polícia Federal, e ofereceu denúncias contra manifestantes ao STF.
As denúncias, então, foram julgadas como procedentes ou não pelo STF — nos casos em que elas foram aceitas, os investigados passaram a ser réus em ações penais na Corte.
Pelo menos 1.524 denúncias da PGR foram aceitas pelo STF e transformadas em ações penais. Não se sabe ao certo o número total de ações penais e de julgamentos que ainda precisam ser finalizados pois há casos que tramitam em sigilo.
Familiares e defensores dos réus contestaram, ao longo do processo, o fato do julgamento estar ocorrendo na Corte, e não em instâncias inferiores.
A rigor, apenas pessoas com foro especial por prerrogativa de função são julgadas desde o início no STF.
Pessoas sem foro têm seus casos julgados inicialmente na primeira instância e, havendo recursos, as ações podem eventualmente chegar ao STF.
Uma vez que os réus pelo 8 de janeiro já começaram a ser julgados no STF, a Associação de Familiares e Vítimas de 08 de Janeiro (Asfav) argumenta que eles perderam a possibilidade de recorrer a outras instâncias.
Procurada pela BBC no ano passado, a assessoria de imprensa do STF não respondeu a essa crítica em particular, mas fato é que em 2020 a Corte julgou que pode abrir investigação quando ataques criminosos forem cometidos contra a própria Corte e seus membros.
Em inquéritos como o das chamadas Fake News, que corre no Supremo, há vários acusados sem foro, e algumas dessas investigações anteriores estão sendo usadas como base para as ações do 8 de janeiro.
Parlamentares de direita têm trabalhado ativamente para que avance no Congresso um projeto de lei que concederia anistia a crimes políticos e eleitorais no contexto das eleições de 2022 e dos ataques de 8 de janeiro de 2023.
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, criou no fim de outubro uma comissão especial para discutir o assunto.
A comissão deverá ter 34 membros. Caso uma proposta seja aprovada ali, seria depois encaminhada para votação no Plenário. Ainda não há cronograma definido para que o trabalho da comissão se inicie.
Embora o plano de uma comissão especial possa parecer uma vitória para apoiadores de Jair Bolsonaro, Lira também retirou a tramitação de um projeto de lei, de autoria do Major Vitor Hugo (PL-GO), da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
Isso frustrou deputados que apoiam a anistia, pois a votação na CCJ já seria um passo mais avançado para o projeto.
O plano de anistia virou um assunto central na mesa de negociações pelo apoio a candidaturas à presidência da Câmara — com o PL condicionando seu apoio ao avanço da ideia, e o PT, o contrário.
Também há um projeto do tipo no Senado, de autoria de Hamilton Mourão (Republicanos-RS), que foi vice-presidente de Jair Bolsonaro.
O projeto de lei está em consulta pública e, até 11 de novembro, tinha cerca de 555 mil votos favoráveis e 576 mil contrários.
Entretanto, parlamentares de oposição têm reclamado da demora na tramitação no Senado.
A Constituição prevê que o Congresso Nacional possa conceder anistias.
Outros projetos buscam também uma anistia a Jair Bolsonaro que pudesse reverter sua inelegilibidade, decidida pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no ano passado.
O ex-presidente não pode se candidatar a nenhum cargo eletivo até outubro de 2030
Fonte: correiobraziliense
Utilizamos cookies próprios e de terceiros para o correto funcionamento e visualização do site pelo utilizador, bem como para a recolha de estatísticas sobre a sua utilização.